Comunidade integra Rede de Percepção de Odor e critica omissão do governo e da prefeitura

“Não basta cobrar a ArcelorMittal. O poder público precisa assumir sua responsabilidade. O Iema [Instituto Estadual de Meio Ambiente] e as secretarias de Meio Ambiente são responsáveis por exigir que a empresa cumpra suas obrigações. Não só a comunidade fazendo denúncia. Enquanto isso não acontece, seguimos adoecendo e convivendo com o mau cheiro todos os dias”. A afirmação é de Maria Aparecida Ferreira, conselheira da Área de Proteção Ambiental (APA) de Praia Mole, na Serra, e integrante da Rede de Percepção de Odor, iniciativa desenvolvida com comunidades do entorno para monitorar de forma contínua os impactos causados pela poluição do ar emitida pela siderúrgica.
Apesar do aumento de denúncias de moradores ao Iema relacionadas a episódios de mau cheiro na Serra, especialmente nos bairros próximos à unidade da Arcelor, Maria Aparecida aponta que a resposta do poder público permanece insuficiente. Ela critica a omissão das gestões de Renato Casagrande (PSB), no governo estadual, e Weverson Meireles (PDT), na prefeitura, diante dos impactos ambientais provocados, e cobra medidas concretas para proteger a saúde da população dos bairros vizinhos.
Para a conselheira, a situação afeta diretamente a saúde das pessoas, especialmente aquelas com problemas respiratórios. “Quem tem bronquite ou alguma doença pulmonar, sofre muito aqui. Meu marido precisa usar nebulizador com frequência e, às vezes, nem isso resolve. Quando chove pó, entra na casa, no pulmão, nas crianças…e não há estrutura do poder público para atender a população de forma adequada”, relata.
Maria Aparecida também ressalta que, embora a ArcelorMittal realize pequenos projetos comunitários, essas iniciativas não substituem medidas efetivas de proteção à saúde e ao meio ambiente. Ela defende a criação de um centro de nebulização em parceria com a unidade básica de saúde do bairro, capaz de atender rapidamente pessoas em crise respiratória, e medidas físicas para reduzir a exposição direta da população ao pó e aos gases liberados pela empresa.
A conselheira alerta ainda para outros problemas ambientais que afetam a região, como o descarte irregular de lixo, invasão e destruição de áreas de mata nativa, e poluição hídrica. Segundo ela, a fiscalização do Iema e das secretarias de Meio Ambiente é irregular, com técnicos substituídos com frequência, o que compromete o acompanhamento efetivo das condicionantes ambientais impostas à Arcelor. Maria Aparecida afirma que pretende reforçar o pedido à Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa.
“Precisamos que o poder público exerça sua função de fiscalizar, colocar limites, exigir cumprimento das condicionantes, e garantir que a população tenha segurança e qualidade de vida. Até agora, toda responsabilidade acabou recaindo sobre a comunidade, que já está adoecida e cansada de denunciar”, cobra.
A Rede de Percepção de Odor é uma iniciativa de monitoramento contínuo envolvendo moradores e a sociedade civil organizada. O objetivo é identificar impactos ambientais em tempo real, registrar ocorrências de mau cheiro, e criar canais de diálogo abertos com a sociedade e o poder público. Segundo a conselheira, essa rede tem fornecido informações importantes, mas sem ação governamental efetiva, as denúncias acabam sem resultado prático. “O Iema reúne a comunidade, apresenta os relatórios, mas no fim nada muda na realidade do bairro”, enfatiza.
A conselheira também cobra transparência sobre as condicionantes ambientais da Arcelor: materiais, procedimentos e medidas que poderiam ser aplicados na comunidade para reduzir riscos. “Há terrenos em nosso bairro que poderiam receber pisos ou barreiras com materiais que a empresa já fornece, mas não há interesse do poder público em aplicar essas medidas”, exemplifica.
Maria Aparecida tem coordenado, ainda, uma formação de agentes ambientais comunitários, prevista para ser concluída neste segundo semestre. “A comunidade quer participar, mas não dá para enfrentar tudo sozinha. A empresa tem condicionantes a cumprir, mas nós não temos acesso, quem tem é o Estado, que deveria usar isso para melhorar nossa qualidade de vida”, reitera.