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Conselheiros alertam para avanço de invasões na APA de Setiba

Desmatamentos e exploração econômica ameaçam área de proteção em Guarapari

Conselheiros do Parque Estadual Paulo César Vinha, em Guarapari, na região metropolitana, denunciam o avanço acelerado de invasões na Área de Proteção Ambiental (APA) de Setiba, em um trecho embargado pela Justiça Federal há mais de três décadas. De acordo com os relatos, a devastação da vegetação nativa e a multiplicação de barracos se intensificaram neste mês de agosto na zona de proteção ambiental.

As denúncias foram protocoladas nessa quinta-feira (21) aos órgãos ambientais. Uma delas foi feita pelo conselheiro Lúcio Lopes, alertando para a ocupação irregular. “A cada dia aumenta a destruição da mata nativa e surgem barracos”, afirmou no documento. “Solicitamos intervenção urgente dos órgãos ambientais”, cobrou.

Segundo ele, há movimentação intensa de pessoas entrando na área para marcar lotes, levantar construções improvisadas e até instalar energia elétrica. “Daqui a pouco tem até carro entrando”, acrescenta. “Cadê o parque, os agentes para corrigir isso? Nós estamos denunciando dentro do conselho, mas o antigo gestor [Georges Mitrogiannis Costa] foi substituído [por Juliana Dias Salgueiro] e não temos canal de conversa com a atual administração. A sensação é de abandono”, protestou.

Outro conselheiro, Thiago Rodrigues, também encaminhou denúncia relatando “grandes invasões dentro da APA de Setiba e do Parque Paulo César Vinha, com construções e retirada de areia do local”. As invasões se concentram na área sul da APA, próxima à entrada de Setiba, em um terreno que permanece embargado desde a década de 1980, explicam os conselheiros. “Esse espaço já foi alvo de loteamento irregular, que foi interrompido por decisão judicial. O Ministério Público Federal [MPF]pediu a desapropriação, mas ao invés disso, a área tem sido cada vez mais invadida. Estão derrubando árvores e destruindo a vegetação nativa”, reforça Lúcio.

Arquivo Pessoal

‘Em vias de extinção’

O terreno mencionado corresponde ao chamado Loteamento Recreio de Setiba, localizado ao lado do Parque Estadual Paulo César Vinha. O local foi embargado ainda na década de 1980, após ser alvo de desmatamento para abertura de ruas que comprometeram o ecossistema alagado típico da região.
Em 1986, o então Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), equivalente ao atual Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), notificou a empresa Conterra Construções e Terraplanagens para interromper as obras. Apesar disso, a empresa obteve liminar favorável e retomou os trabalhos, que foram novamente barrados após recurso do MPF e do IBDF.

Dois anos depois, em 1988, a Conterra e a JJ Empreendimentos e Participações voltaram a abrir clareiras no terreno, o que levou a um novo embargo, desta vez por órgão estadual. O MPF ajuizou uma ação civil pública contra as empresas, exigindo a paralisação definitiva do desmatamento e a recuperação da área.
Em 1990, foi criado o Parque Estadual Paulo César Vinha, com cerca de 1,5 mil hectares de restingas, lagoas, dunas e áreas de Mata Atlântica. A unidade de conservação tem como objetivo proteger os ecossistemas costeiros e suas espécies ameaçadas. Ao redor do parque, a APA de Setiba funciona como zona de amortecimento, ajudando a reduzir os impactos das atividades humanas no entorno.

Após uma longa batalha judicial, em 2000 foi proferida sentença determinando a interrupção do loteamento, a restauração dos danos ambientais e o pagamento de indenização. Apesar de recursos, a decisão transitou em julgado, obrigando os responsáveis a cumprir as medidas. Mesmo com a decisão definitiva, as invasões não cessaram.

Em 2024, o MPF pediu à Justiça Federal que intimasse 28 donos de imóveis construídos irregularmente no Recreio de Setiba para desocupar e recuperar a área. O órgão argumentou que a preservação é essencial, pois trata-se de uma Zona de Proteção Especial Natural (ZPEN) inserida dentro da APA de Setiba, considerada um ecossistema de transição entre o litoral e a Mata Atlântica — ambos sob forte pressão e risco de extinção.

Além disso, o MPF requereu que as empresas responsáveis pelo loteamento pagassem R$ 1 milhão em indenização por danos ambientais. O valor poderia ser revertido em forma de doação do terreno para uso como zona de amortecimento do Parque Estadual Paulo César Vinha, de modo a criar uma barreira natural contra impactos negativos na unidade de conservação. Para o órgão, a recuperação da área é urgente. “A desocupação é necessária para que haja a recuperação do ecossistema, que está em vias de extinção”, apontou em manifestação judicial.

A situação se arrasta há quase 40 anos, mas, segundo os conselheiros, nunca houve uma resposta firme e duradoura do poder público. Para eles, a omissão facilita a ação de grileiros e loteadores clandestinos. Especialistas já apontaram que a ocupação irregular compromete diretamente o equilíbrio ambiental, afetando cursos d’água, fragmentos florestais e espécies da fauna e flora típicas da região.

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