Fábio Giori denuncia que cartazes de protesto foram barrados na visita em Linhares
O Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Espírito Santo (Sindaema) entregou uma carta com reivindicações ao ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macêdo, durante reunião que antecedeu a visita do presidente Lula a Linhares, no norte do Estado, nessa sexta-feira (11). A carta lista demandas específicas do setor no Espírito Santo, como o uso dos recursos da reparação para fortalecer empresas públicas como a Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan) e os Serviços Autônomos de Água e Esgoto (Saaes), além de posicionar-se contra o modelo e a forma como o governo federal tem conduzido, por meio do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), o processo de privatização do saneamento no Brasil.
O encontro com o ministro aconteceu nos bastidores da agenda presidencial que oficializou o início do Programa de Transferência de Renda (PTR),previsto no novo acordo de reparação pelo crime socioambiental da Samarco/Vale-BHP. O Sindaema também participou da recepção ao presidente Lula, mas denunciou que foi impedido de entrar no ato com cartazes que contestavam a privatização e cobravam investimentos públicos no setor.
“Estou aqui participando da caravana do presidente Lula. Nós estamos sendo impedidos de entrar com nossos cartazes para poder participar, porque eu acho que nosso manifesto político ofende as pessoas, talvez ofenda o governo, a organização do governo. Mas é lamentável. Militante de movimento sindical que ajudou a eleger o presidente Lula, e que vai lutar pela reeleição, ser impedido de levar ao conhecimento do presidente as nossas bandeiras”, protestou Fábio Giori, diretor do sindicato, em vídeo publicado nas redes sociais.

Segundo o dirigente, a equipe de segurança obrigou os representantes do sindicato a mostrar previamente o conteúdo de cada cartaz e, mesmo após isso, proibiu a entrada com as mensagens. Entre os cartazes barrados, estavam frases como: “Governador, pare a privatização dos SAAEs”; “Presidente Lula, reparação é privatizar o saneamento?”; “Trabalhadores do saneamento: heróis do crime de Mariana”; “Reparação é: saneamento público, universal, de qualidade e com tarifa justa. Diga não à privatização”.
A crítica faz referência à destinação de recursos do acordo de repactuação do crime da Samarco/Vale-BHP para projetos que envolvem concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs), em detrimento do fortalecimento das empresas públicas de saneamento. “Privatizar o saneamento, usar o dinheiro da repactuação para privatizar o saneamento, não é crime?”, questionou o dirigente do Sindaema.
A presidente do sindicato, Wanusa Santos, reforçou a conexão entre saneamento, meio ambiente e justiça social: “O que tem a ver saneamento com o clima e com o Rio Doce? Tudo a ver! A primeira parcela de desembolso dos valores recebidos pelo Governo do Espírito Santo é para pagar o estudo de modelagem do BNDES para privatizar os sistemas autônomos de água e esgoto dos municípios”, afirmou.
“Nós defendemos os Serviços Autônomos de Água e Esgoto. Nós defendemos a companhia estadual de saneamento como agentes do Estado, como agentes promotores dos serviços de saneamento do Espírito Santo. Presidente Lula, os trabalhadores do saneamento dizem não à privatização. E nós estamos unidos nessa luta, nessa batalha, junto com a população, porque o saneamento é vida, a água não é mercadoria”.
No documento entregue ao ministro, o Sindaema afirma que o BNDES se converteu numa “agência de modelagem e financiadora das privatizações”, afastando o acesso à água da lógica do direito humano e submetendo-o à lógica do lucro. O texto critica ainda a Cláusula 6 do Anexo 9 do acordo judicial de reparação, que prioriza a alocação de recursos para contratos de concessão e PPPs. “É um absurdo o BNDES financiar hoje um oligopólio privado do setor de saneamento. Nós precisamos e contamos com a assistência do presidente Lula para que esse processo possa ser revertido”, defende Fábio.
Para o sindicato, essa diretriz viola os princípios da reparação integral, beneficiando interesses privados em detrimento do fortalecimento das companhias públicas como a Cesan e os SAAEs. “Entende-se que essas medidas são contrárias aos objetivos da reparação e atendem única e exclusivamente aos interesses das empresas privadas do saneamento”, aponta a entidade.
O Sindaema reivindica que os recursos da repactuação sejam utilizados para reestruturar e fortalecer os serviços públicos municipais e estaduais de saneamento, com prioridade às áreas periféricas e rurais, historicamente negligenciadas. Além disso, cobra o fim das restrições ao acesso a recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), BNDES e bancos públicos por parte de operadores públicos de saneamento.
O sindicato também entregou uma carta aberta nacional ao presidente Lula, subscrita por mais de 150 entidades de diversas regiões do Brasil. O documento lembra que, nos governos anteriores do petista, o BNDES financiou companhias estaduais de saneamento como a própria Cesan, Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) e Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). O documento ainda ressalta que os avanços chegaram a ser reconhecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) como exemplo internacional de cumprimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Contudo, apontam as entidades, essa trajetória mudou drasticamente após o impeachment de 2016 e não foi revertida até agora. “É extremamente preocupante que, quase vencido o terceiro ano do ‘Governo de União e Reconstrução’, o BNDES prossiga com a mesma trajetória do governo derrotado nas urnas, dedicando-se a apoiar prioritariamente as privatizações”.
A carta exige a revisão da política de financiamento do BNDES, o fim das restrições do Conselho Monetário Nacional (CMN) ao crédito de entes públicos, e a criação de um programa nacional de recuperação e fortalecimento dos operadores públicos. Também reivindica a retomada dos instrumentos de controle social, como o Conselho das Cidades, e a aprovação de duas Propostas de Emenda Constitucional: a PEC 6/2018, que reconhece o acesso à água como direito fundamental, e a PEC 2/2016, que inclui o saneamento básico entre os direitos sociais da Constituição.
As entidades que subscrevem a carta nacional afirmam que “lutaram pela eleição de Lula e continuam acreditando no papel estratégico do Estado na redução das desigualdades”. No entanto, cobram coerência com os compromissos de campanha. “Não é possível que, em nome do controle do endividamento público, se impeça o povo de ter acesso à água potável e ao esgotamento sanitário com modicidade tarifária”, conclui o texto.