Domingo, 05 Mai 2024

Fiocruz divulga carta aberta sobre riscos da nova legislação dos agrotóxicos

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), instituição referência em pesquisas no setor da saúde, publicou uma carta aberta à sociedade brasileira alertando para os riscos causados pelas recentes modificações na legislação que regula o uso de agrotóxicos no País. O documento atribuiu as medidas "aos constantes ataques diretos do segmento do agronegócio às instituições e seus pesquisadores que atuam em cumprimento as suas atribuições de proteção à saúde e ao meio ambiente."
 
O principal alvo das críticas é a lei que permite a importação de agrotóxicos sem consulta aos ministérios da Saúde e do Meio Ambiente. A fundação pede que a mesma seja revogada imediatamente.
 
A principal contestação se refere à lei que permite o registro temporário de agrotóxicos em casos de emergência fitossanitária ou zoossanitária, sem avaliação prévia dos setores reguladores da saúde e do meio ambiente (Lei n° 12.873 /13 e o Decreto n° 8.133/13), para a qual a fundação também pede sua revogação. A Fiocruz se coloca contrária a Projetos de Lei como o nº 209/2013 do Senado, que pretende retirar definitivamente ou mesmo restringir a atuação das áreas de saúde e meio ambiente do processo de autorização para registro de agrotóxicos no Brasil.
 
Os diretores da fundação estacam que a legislação dos agrotóxicos é uma conquista da sociedade brasileira, amparada pela Constituição de 1988, e avalia que o Estado tem o dever de avaliar e controlar o uso desses químicos, por meio de órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
 
No decorrer da carta, a Fiocruz aponta que a principal razão para o decréscimo da força de regulamentação imposta pelo poder público é dos grandes produtores de agroquímicos e de commodities agrícolas.  “Este processo em curso de desregulação sobre os agrotóxicos que atinge especialmente o setor saúde e ambiental no Brasil, está associado aos constantes ataques diretos do segmento do agronegócio às instituições e seus pesquisadores que atuam em cumprimento as suas atribuições de proteção à saúde e ao meio ambiente”, destacam, reforçando que esses ataques já foram repudiados pela Fiocruz junto ao Instituto Nacional de Câncer e à Associação Brasileira de Saúde Coletiva, como registram.
 
A fundação também expõe o perigo ao qual estão expostos trabalhadores e moradores de áreas rurais, trabalhadores das campanhas de saúde pública e de empresas de desinsetização, populações indígenas, quilombolas e ribeirinhas, extremamente vulneráveis à ação dos grandes latifundiários. Os riscos, perigos e danos provocados à saúde pelas exposições agudas e crônicas dessas populações aos agrotóxicos são incontestáveis com base na literatura científica internacional. Para a diretoria, as novas legislações e os projetos de lei esprotegem a popuçação dos efeitos nocivos dos agrotóxicos, ao flexibilizarem a função regulatória do estado.
 
Cabe lembrar que, em outubro do ano passado, um Relatório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apontou índices elevados de agrotóxicos em seis alimentos no Espírito Santo: pepino, alface, arroz, tomate, uva e abacaxi. Os resultados foram revelados pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para) e são referentes aos anos de 2011 e 2012.
 
Em 2012, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), denunciou o vazamento de agrotóxicos em um córrego na comunidade de São João Bosco, em Jaguaré, no norte do Estado. A contaminação provocou a morte de peixes e aves, além de ter atingido a água e o solo da região. Jaguaré é considerada a capital nacional do café Conilon, mas já começa a ser chamada de “Capital do Conilon envenenado e do desrespeito aos Direitos Humanos”, já que são somados a esse caso os sobrevoos de aviões agrícolas sobre escolas, comunidades rurais, nascentes e áreas de preservação. Em 2011, por influência dos movimentos sociais, os municípios de Vila Valério e Nova Venécia, também no norte capixaba, proibiram a pulverização aérea de agrotóxicos.
 
Ao final da carta, a Fiocruz "se coloca à inteira disposição das autoridades do executivo, do legislativo, do judiciário, do Ministério Público e da sociedade civil para participar das discussões sobre o marco regulatório de agrotóxicos, na busca de alternativas sustentáveis, como a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica" e registra que formalizou um Grupo Trabalho sobre agrotóxicos entre seus pesquisadores, com o objetivo de tratar o tema de forma sistemática.
 
Uma das principais instituições de produção tecnológica, pesquisa, ensino técnico e pós-graduado em saúde do país, a Fiocruz integra o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e as ações de Vigilância a Saúde e mantém sob sua coordenação o Sistema Nacional de Informação Toxico-Farmacológica (Sinitox) que disponibiliza desde 1985 informações sobre os agravos relacionados aos agrotóxicos com base nas notificações coletadas junto aos centros de informação e assistência toxicológica distribuídos no país.
 
O Brasil é campeão global no uso de agrotóxicos desde 2008 e atualmente concentra cerca de 20% do uso mundial. A previsão é de que, em 2013, quase 1 milhão de toneladas de agrotóxicos sejam aplicadas no País, trazendo prejuízos não só aos trabalhadores diretos do setor, como também riscos à saúde dos que os consomem diariamente. Os resíduos dos químicos, geralmente venenosos, se acumulam no solo, na fauna e na flora, e muitas vezes chegam a contaminar lençóis freáticos.
 
Em 2010, o mesmo monitoramento desenvolvido pela Anvisa classificou com o maior grau de insatisfação quanto aos agrotóxicos a alface (cinco de seis amostras), a cenoura (três amostras de seis), a couve (uma amostra de seis), a laranja (idem), o mamão (idem), o morango (quatro de 10 amostras), o pepino (quatro amostras de seis) e o pimentão (seis amostras de seis). Na época, foi um total de 27 amostras insatisfatórias de um total de 102 analisadas. O Espírito Santo, que já foi campeão brasileiro, é o terceiro da federação que mais faz uso de agrotóxicos.

Veja mais notícias sobre Meio Ambiente.

Veja também:

 

Comentários:

Nenhum comentário feito ainda. Seja o primeiro a enviar um comentário
Visitante
Domingo, 05 Mai 2024

Ao aceitar, você acessará um serviço fornecido por terceiros externos a https://www.seculodiario.com.br/