Terça, 07 Mai 2024

Foco no campo poderia minimizar impactos das enchentes

Nas imagens dos deslizamentos de terras provocados pelas fortes chuvas que acometeram o Estado nas últimas semanas, é possível notar uma predominância do fenômeno em áreas ocupadas por pastos. A maioria delas sofreu um devastador processo de desmatamento que não conservou o mínimo de floresta necessário e recomendado por lei. Não só por representarem remanescentes de um bioma, mas por manterem a segurança do local, já que a grande aglomeração de árvores não permite que montes de terra deslizem pelas encostas e atinjam a população que vive nas proximidades.
 
O coordenador estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Valmir Noventa, define que os desastres que acometeram 54 dos 78 municípios capixabas são consequência do mau uso do solo, além da falta de políticas públicas destinadas especialmente ao campo e ao meio ambiente. Para ele, as soluções dos problemas da cidade, desde a questão das enchentes até a produção de alimentos, estáão no campo.
 
As Áreas de Preservação Permanentes (APPs) estabelecidas no Código Florestal como áreas de remanescentes florestais que devem permanecer protegidas em locais como encostas, topos de morros e margens de rios não têm seu perímetro respeitado, o que contribui para que água não seja retida no solo e se acumule em outros locais. Valmir também lembra que os aterros irregulares e as construções realizadas dentro desse perímetro representam um perigo para a população. Ele alerta que as leis ambientais devem ser respeitadas também na cidade, e não somente no campo. Muitas cidades foram formadas às margens dos rios, sem o devido cuidado necessário para proteger a população na época das cheias.
 
Além disso, Valmir aponta que outros perigos são o uso excessivo de máquinas pesadas nas lavouras e a monocultura extensiva, que contribuem para a desertificação e aceleram a erosão do solo, como o uso de agroquímicos e as restrições na variedade de cultivo. O militante reitera que os esforços e verba que estão sendo gastos com a recuperação do efeito devastador das enchentes poderiam ser muito melhor aproveitados e custariam até menos se fossem empregados em ações focadas na prevenção dos desastres, com a preservação ambiental e o estímulo à agricultura familiar, modalidade de cultivo em que os alimentos são produzidos em consonância com a preservação ambiental.

Nas cidades, além dos aterros e construções em áreas de APPs que margeiam os rios, Valmir aponta que a impermeabilização do solo, com a aplicação de asfalto nas vias, feita de maneira irregular,  sem o escoamento necessário para as águas,  é um ponto negativo que contribui para o acúmulo de água nas grandes aglomerações nos centros urbanos. Mas ele lembra que, se as famílias mais humildes estão vivendo em áreas de risco, é porque lhes foi negada a possibilidade de viver em um lugar melhor e, a algumas, não foi concedido o direito de viver dignamente no campo.



A opinião de Valmir é compartilhada pelo geógrafo Aloísio Souza da Silva, que também milita pelo MPA e Via campesina. Em artigo publicado no site do movimento, ele ressalta que a compactação dos solos e a retirada da vegetação de encosta no campo não provocam uma infiltração satisfatória da água das chuvas nos subsolo, provocando as enxurradas e o deslocamento de sedimentos para os corpos hídricos, o que causa assoreamento. Aloísio reitera que, dessa forma, os níveis dos rios se elevam muito mais rápido do que em seu estado natural.

Segundo ele, a alta concentração demográfica nos grandes centros urbanos é consequência de um modelo econômico desenvolvimentista, que concentra as pessoas em pequenas porções terra, e concentra a terra nas mãos de poucos. “Somente com um alívio dos contingentes urbanos e maior dispersão da população no território, é possível apontar soluções mais duradouras. Se tivéssemos amplas comunidades camponesas efetivas, desenvolvendo práticas de agroecologia, comércio popular, com acesso a políticas estruturantes do espaço agrário brasileiro, boa parte destes impactos das fortes chuvas seriam inexistentes”.

Muitas das famílias que hoje vivem em regiões que alagam nos grandes centros urbanos, sobretudo na Grande Vitória, migraram do interior atraídos pelas falsas promessas de empregos e melhorias de vida das grandes empresas poluidoras, sobretudo a Vale (na época Companhia Vale do Rio Doce - CVRD) e ArcelorMittal (antiga Companhia Siderúrgica de Tubarão - CST).

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