Ato contra PL da Devastação e retrocessos no Estado marca Dia do Meio Ambiente
“A comemoração tem que vir com luta, porque o desafio está enorme com o Congresso que temos hoje. Um Congresso conservador, que vê o lucro acima da vida, pensa no curto prazo e ignora as próximas gerações.” A fala da servidora do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), Sílvia Sardenberg, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos do Espírito Santo (Sindipúblicos), reflete os profundos retrocessos nas políticas ambientais no Estado e no país. A denúncia foi feita durante ato realizado no Dia Mundial do Meio Ambiente, nesta quinta-feira (5), em frente à Assembleia Legislativa.
A mobilização contesta a aprovação no Senado do PL 2.159/2021, apelidado de “PL da Devastação”, diante do seu potencial destrutivo. Segundo os manifestantes, a medida vai desmontar o sistema de licenciamento ambiental e abrir espaço para grandes empreendimentos avançarem sem avaliação adequada de seus impactos socioambientais.

“O Senado Federal quer deixar a porteira aberta para grandes empresários implantarem qualquer empreendimento sem medir os impactos. O que está em jogo é a destruição do meio ambiente e das pessoas, porque são elas que mais sofrem com isso”, alertou Wanusa Santos, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Espírito Santo (Sindaema).
Sílvia Sardenberg ressaltou a semelhança entre o PL federal e a Lei Complementar nº 1.073/2023, aprovada no Espírito Santo, apelidada de “Lei da Destruição”. A norma estadual estabelece um novo modelo de licenciamento ambiental, criticado por enfraquecer a fiscalização e excluir a participação das comunidades impactadas. “É o mesmo projeto de apropriação da natureza para transformá-la em mercadoria. Retira-se a obrigatoriedade de escutar comunidades impactadas, de proteger o patrimônio material e imaterial”, enfatiza.
Ela exemplifica os riscos da flexibilização citando outros crimes e desastres ambientais: “barragens como as de Brumadinho Mariana [da Vale, Samarco e BHP] seriam construídas com esse tipo de licença, sem precisar de avaliação técnica. E veja o que aconteceu em Maceió com a Braskem: a empresa nunca passou por um processo de licenciamento ambiental completo, sempre foram licenças frágeis, sem análise técnica. Esses projetos, embora não tenham ocorrido no Espírito Santo, são similares aos que agora poderão acontecer em todo o Brasil se essa lei for aprovada”, alerta.
Para Silvia, os retrocessos caminham paralelamente nos níveis estadual e federal, como parte de um movimento maior. “É um grande projeto do capital para se apropriar do que resta da natureza. Seja a natureza protegida dentro de unidades de conservação, seja as populações que vivem e protegem esses espaços. E essas comunidades, que já são vulneráveis, serão ainda mais impactadas. A proposta elimina a obrigatoriedade de perguntar se aquela área que vai ser impactada abriga pessoas ou valores culturais que precisam ser protegidos”, avalia.
Ela também alertou para as consequências sociais da nova legislação. “Quem mais perde são as pessoas que já vivem em territórios vulneráveis, sem saneamento, sem acesso à água. Essas populações – quilombolas, comunidades ribeirinhas ou periferias urbanas – são sempre as mais afetadas quando o meio ambiente é destruído. E agora vão deixar de ser consideradas em qualquer processo de licenciamento”.
Os manifestantes também denunciaram o Programa Estadual de Desenvolvimento e Uso Sustentável das Unidades de Conservação (Peduc), idealizado pelo secretário de Meio Ambiente do Espírito Santo, Felipe Rigoni, que propõe a concessão de seis parques estaduais por 35 anos à iniciativa privada para fins turísticos.
Um dos representantes do movimento contra a privatização dos parques naturais capixabas, o biólogo Walter Có, destacou a luta contra políticas que facilitam a exploração comercial de áreas naturais protegidas. “Há um ataque no Brasil inteiro contra as unidades de conservação”, manifestou durante protesto realizado na abertura da Reunião Regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), quando o governador Renato Casagrande (PSB) foi confrontado por ambientalistas. Na ocasião, eles exigiram do chefe do executivo capixaba a revogação do programa.
Os parques Paulo César Vinha (PEPCV), na região metropolitana; Itaúnas, em Conceição da Barra, no norte do Estado; Cachoeira da Fumaça (PECF), em Alegre; Forno Grande (PEFG) e Mata das Flores (PEMF), em Castelo, no sul do Estado; e Pedra Azul (Pepaz), em Domingos Martins, na região serrana, estão incluídos no Peduc.
Apesar da ausência de estudos de impacto ambiental (EIA/Rima), os primeiros projetos para os parques de Itaúnas e Paulo César Vinha já foram apresentados pela consultoria Ernst & Young, contratada sem licitação por mais de R$ 8,6 milhões. As propostas incluem teleféricos, tirolesas, hospedagens, restaurantes e estacionamentos, o que pode comprometer seriamente a integridade ambiental dessas áreas protegidas.
Estado de Greve
No último mês, os servidores do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) aprovaram estado de greve diante da falta de avanços e lentidão em relação à pauta de reivindicações enviada ainda em março para a gestão de Renato Casagrande (PSB). As principais demandas incluem a reposição das perdas inflacionárias; regulamentação da progressão por titularidade; e aprovação da bonificação por desempenho.

Durante a assembleia, a Assiema apresentou ainda uma carta aberta ao governador. No documento, são denunciados o enfraquecimento institucional do Iema, os riscos de políticas de privatização na gestão ambiental e a desvalorização profissional dentro do instituto. A defasagem salarial acumulada desde 2013 já chega a quase 50%, o que tem contribuído para a alta evasão de servidores.
A carta reconhece avanços importantes conquistados pelo Iema nos últimos anos, como a implantação de sistemas digitais de licenciamento, a criação de plataformas geoespaciais para dados ambientais e a gestão eficaz das Unidades de Conservação (UCs). No entanto, os servidores alertam que esses avanços podem ser comprometidos caso o governo não invista na valorização dos profissionais.
“Contamos com o empenho do governador para consolidar um Iema robusto, moderno e capaz de enfrentar os desafios ambientais contemporâneos”, afirmam.
Ato em Brasília
Em Brasília, mulheres atingidas pelo crime da Samarco/Vale-BHP participaram da marcha contra o PL da Devastação e os efeitos devastadores na vida de comunidades tradicionais, periferias e diversos territórios pelo país, promovida por grandes empreendimentos como barragens, mineração, usinas e linhas de transmissão.

O ato integra a jornada de Lutas das Mulheres do MAB no Dia do Meio Ambiente, reuniu cerca de mil mulheres de 20 estados do país, que caminharam pela Esplanada dos Ministérios e também denunciaram o genocídio de Israel na Grito de Socorro por Gaza.