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Obras de despoluição de córregos na Serra entram na reta final

Previsão é de que 1,4 mil imóveis deixem de descartar esgoto no Laripe e Irema

Aegea

As obras de despoluição dos córregos Laripe e Irema, na Serra, entraram na fase final e podem ser concluídas antes do prazo oficial, previsto para fevereiro de 2026. A informação foi repassada durante reunião realizada nessa terça-feira (4) entre representantes da Ambiental Serra (concessionária da Aegea Saneamento no município) e a comissão de acompanhamento, formada pela comunidade de Manguinhos, como relata o presidente da Associação de Moradores do Balneário de Manguinhos (Amman), Guilherme Lira.

Com a antecipação da entrega, ele destaca a expectativa de que parte dos resultados já seja percebida no verão, período de maior uso das praias. Os moradores também planejam ampliar a mobilização para cobrar que o programa seja replicado em outros corpos hídricos poluídos do município.

O investimento total da intervenção é de R$ 8,4 milhões, conforme dados da Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan), fiscalizadora do contrato dentro da Parceria Público-Privada (PPP) firmada com a Ambiental Serra. O objetivo é eliminar os últimos pontos de lançamento irregular de esgoto doméstico que ainda contaminam os dois mananciais, responsáveis por afetar diretamente a balneabilidade das praias do bairro e da região de Jacaraípe.

Segundo Guilherme, a vistoria desta semana constatou o avanço na implantação da rede auxiliar paralela ao longo das margens dos córregos. Essa estrutura assumirá a função dupla de atuar tanto como drenagem quanto como canalização de esgoto para imóveis ainda não conectados à rede principal – cujos resíduos eram despejados diretamente na calha dos rios ou na rede de drenagem pluvial, que não foi projetada para conduzir efluentes sanitários.

“A maioria das casas que não tinha rede de esgoto está em vielas, becos, lugares onde a rede principal não chega. Por isso foi preciso criar uma rede nova, específica para ligar essas residências que jogavam o rejeito diretamente no córrego”, explicou.

Ele observa que a deterioração dos córregos é um problema histórico do município, herança da falta de planejamento durante o crescimento urbano de bairros como Feu Rosa, Vila Nova de Colares e o setor Nova Zelândia, de Cidade Continental, às margens dos mananciais. “Essas áreas se formaram a partir de ocupações irregulares, onde o poder público não chegava, e as pessoas despejavam esgoto diretamente no córrego. Isso foi se acumulando por décadas”, observa.

Segundo a Prefeitura da Serra, a previsão é que cerca de 1,4 mil imóveis deixem de descartar esgoto diretamente no Laripe e no Irema após o fim das obras. Desse total, aproximadamente 700 moradias serão conectadas diretamente à nova rede auxiliar. Todo o material coletado será direcionado para a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Feu Rosa.

A Cesan estima que, com o sistema em operação plena, 1 bilhão de litros de esgoto por mês deixarão de ser lançados nos córregos e passarão a ser coletados e tratados, reduzindo “drasticamente” a carga poluidora despejada nos corpos hídricos da região. A iniciativa deve beneficiar moradores de bairros como Vila Nova de Colares, Feu Rosa, Ourimar, Nova Zelândia, Castelândia e Portal de Jacaraípe, além de melhorar a qualidade das águas nas praias de Manguinhos e da Baleia.

“Isso é resultado de mais de uma década de luta comunitária”, afirmou o representante da Amman. Ele lembra que a organização articulou presidentes de associações de todos os bairros afetados e reuniu moradores com engenheiros civis e sanitaristas para elaborar diagnósticos que fundamentaram a reivindicação. As demandas foram levadas ao governador Renato Casagrande (PSB), que autorizou o aporte financeiro.

Antes disso, algumas ações ocorreram, mas de maneira pontual. Em 2020, por exemplo, houve trabalhos de limpeza e retirada de vegetação, mas sem intervenções estruturais de despoluição. “Foi paliativo. Limpava, tirava sujeira, mas o esgoto continuava entrando do mesmo jeito”, recorda.

Os moradores querem transformar o projeto em referência para toda a Serra. A intenção é cobrar do município e do governo estadual um cronograma de longo prazo para despoluir todos os córregos, respeitando as diferenças de cada localidade. “É um projeto piloto. A ideia é replicar nos outros córregos. Para isso, planejamos fazer uma avaliação do que deu certo e do que deu errado e propor um plano de 20 anos, com prazo e orçamento. Não adianta um plano só teórico”, disse, em referência ao Plano Municipal de Saneamento, ainda em elaboração.

Para ele, a experiência mostrou que a participação comunitária foi decisiva. “Deu certo porque a comunidade acompanhou. Agora queremos usar essa experiência na cidade inteira”, reitera. Guilherme explica que a Amman pretende reorganizar a mobilização feita no início do processo, reunindo presidentes de todas as associações de moradores da cidade para pressionar a prefeitura, a Cesan, a Ambiental Serra e o governo estadual pela continuidade das ações. “O problema envolve toda a cidade. Chegou a hora de escalar essa luta para o nível municipal”, afirmou.

Ele reforça ainda que a prefeitura precisará manter fiscalização contínua mesmo após a entrega da obra, para evitar que novos lançamentos irregulares surjam. “Se outras casas forem se instalando e jogarem esgoto no rio, o problema retorna. Então a fiscalização tem que ser periódica, olhando as margens”, defendeu.

Nilton Cardoso

‘Número maquiados’

Outras lideranças comunitárias do município também têm denunciado a degradação dos corpos hídricos em diferentes pontos da Serra. Morador de Costa Bela, Nilton Cardoso, um dos coordenadores do movimento Todos por Jacaraípe, descreve que a Lagoa Juara apresenta água esverdeada e mau cheiro. No Rio Jacaraípe, ele observa que a presença de lama fétida evidencia o lançamento contínuo de esgoto. Situações semelhantes foram constatadas na Praia da Baleia, além de Maguinhos, locais onde, segundo ele, é possível identificar pontos de despejo de água escura e contaminada diretamente no mar.

Enquanto os dados oficiais indicam cobertura de esgoto superior a 90%, os moradores contestam essa informação. “Esses números são maquiados, não refletem a realidade. Muitas vezes existe uma rede seca, sem ligação à estação de tratamento, ou a estação não cumpre os padrões exigidos pela norma. Se houvesse realmente 90% de cobertura, lagoas e córregos não estariam nessa situação”, rebate Cardoso.

Para Luciana Pacheco, presidente do Movimento Comunitário da Grande Jacaraípe, a conta é injusta para a população. “Pagamos tarifas altíssimas, quase 100% de taxa de esgoto, mas esse esgoto não é tratado devidamente. Enquanto isso, nossos córregos continuam poluídos e as comunidades sofrem com ruas alagadas a cada chuva, resultado de uma rede fluvial comprometida”, critica.

Dados do Painel Saneamento Brasil (Sinisa 2023) mostram que 113,8 mil dos 545,8 mil habitantes da Serra – cerca de 21,6% da população – não têm acesso a esgoto. O índice de esgoto tratado em relação à água consumida é de apenas 45,1%, totalizando 17.736,47 mil m³ de esgoto tratado. No ano do estudo, a falta de saneamento também se refletiu na saúde, com 242 internações e cinco óbitos por doenças de veiculação hídrica, além de despesas de R$ 169,4 mil, como aponta o Departamento de Informação e Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus).



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