Registros de populares mostram destruição de áreas às margens do Rio Santa Maria
Pescadores e moradores da região de Vila Cajueiro, em Cariacica, denunciam o avanço de aterros sobre áreas de manguezal às margens do Rio Santa Maria, próximo ao Contorno da BR-101. Segundo relatos, empresas privadas estariam despejando terra e entulho em Áreas de Preservação Permanente (APP), provocando a destruição de ecossistemas e afetando diretamente a subsistência de famílias que vivem da pesca artesanal.
Imagens de satélite mostram o avanço dos aterros sobre o manguezal. À esquerda, a área antes das intervenções; à direita, a ampliação das movimentações de terra e supressão de vegetação próxima ao Rio Santa Maria.

“Estão aterrando todas as margens do Rio Santa Maria, acabando com o mangue, com os guaiamuns, com tudo”, relatou o pescador Alexandre Rosa de Jesus, coordenador do projeto Mangue Limpo ES, que realiza mutirões de limpeza ambiental na região. Ele conta que há mais de quatro anos realiza ações voluntárias de retirada de lixo nos manguezais, mas que o cenário de degradação tem se agravado nos últimos meses.
“Enquanto lutamos para salvar o mangue, as próprias empresas de grande porte e os órgãos públicos dão permissão para aterrar”, desabafou. Em um dos vídeos gravados pelo grupo, Alexandre aparece de joelhos fazendo um apelo: “Pelo amor de Deus, não façam isso. Aqui é o berçário dos caranguejos, das espécies que garantem o sustento das famílias”, completa.
De acordo com um morador que fez registros em vídeo e pediu para não ser identificado por medo de sofrer represálias, entre as empresas que atuam na região estariam a RG LOG, Timbro (uma das principais exportadoras de açúcar do Brasil), SPE Areia Branca e Base Engenharia Ambiental. Todas teriam como ponto de referência a antiga fazendinha Porto das Pedras, área onde antes predominavam guaiamuns, caranguejos e vegetação típica de mangue.
Ele identificou ainda uma manilha despejando esgoto diretamente em um córrego que é afluente do Rio Santa Maria, nas proximidades das áreas onde ocorrem os aterros. A estrutura, segundo o autor do vídeo, partiria de uma das empresas instaladas na região, mas não foi possível determinar qual delas é a responsável. “Além de aterrar o mangue, estão poluindo o rio com esgoto. Isso é um crime duplo contra o meio ambiente”, afirmou.
Os pescadores também relatam que já tentaram acionar órgãos ambientais, mas sem retorno efetivo. “Nós somos pequenos, não temos voz. Tentaram nos calar a na última denúncia. As empresas continuam aterrando e ninguém fiscaliza”, afirmou Alexandre. No próximo domingo (26), o grupo vai promover mais uma edição do Mutirão de Limpeza do Mangue, com saída da ponte do trem, em Flecha 1. A ação deve reunir voluntários, pescadores e ambientalistas, com o objetivo de recolher resíduos e chamar atenção para a destruição ambiental que avança na região. O movimento pede apoio do Iema (Instituto Estadual de Meio Ambiente), do Ibama, da Prefeitura de Cariacica e do Ministério Público Estadual para que seja feita uma vistoria urgente nas áreas onde os aterros e despejos estão sendo realizados.
As áreas sob suspeita ficam próximas à margem da BR-101, entre Vila Cajueiro e o Rio Santa Maria da Vitória. O morador que fez as denúncias afirma que parte dos empreendimentos teria recebido autorização municipal por se enquadrar como atividade de baixo risco ambiental — o que, para ele, não justificaria a intervenção em área de manguezal.
“Quando é empresa de logística, a prefeitura autoriza. Mas não tem como autorizar aterro em área de mangue. É crime ambiental”, disse. O grupo cobra transparência sobre as licenças concedidas e questiona o papel dos órgãos ambientais. “Se um pescador tira um caranguejo em período proibido, é multado. Mas quem aterra o mangue inteiro não sofre punição nenhuma”, criticou.
O manguezal de Vila Cajueiro integra o sistema estuarino do Rio Santa Maria, considerado um dos principais berçários naturais do Espírito Santo. O ecossistema abriga espécies como caranguejo-uçá, guaiamum e siri, fundamentais tanto para o equilíbrio ambiental quanto para a economia das comunidades ribeirinhas. Para os pescadores, o avanço dos empreendimentos logísticos representa uma ameaça direta à sobrevivência dessas famílias. “Nunca vi progresso destruindo o que é vivo. O mangue é o nosso sustento”, enfatizou Alexandre.
A Prefeitura de Cariacica foi procurada para se manifestar sobre os aterros e a existência de licenças ambientais das empresas citadas, mas não respondeu até o fechamento desta matéria.