Sexta, 29 Março 2024

Restauração florestal gera cerca de 200 empregos diretos a cada mil hectares

Restauração florestal gera cerca de 200 empregos diretos a cada mil hectares

O potencial de geração de emprego e renda com a restauração florestal é imenso no Espírito Santo. Com 40% de seu território – aproximadamente 2,1 milhões de hectares – ocupado com pastagens e monocultivos de eucaliptos, há um vasto campo de pesquisa e planejamento para movimentar a economia de comunidades e municípios inteiros, a partir da recomposição da vegetação nativa.



Reflorestamento de verdade, é preciso ressaltar, e não plantio de uma única espécie arbórea em largas extensões de terra. Reflorestamento de fato que, após estabelecido, gera ainda mais riqueza, com a disponibilização de serviços ecossistêmicos essenciais, como produção de água, regulação do clima, fertilidade do solo e ar puro.



São 200 empregos diretos para cada mil hectares em restauração com intervenção humana, aponta o estudo nacional “Restauração de Paisagens e Ecossistemas”, produzido pela Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) e o Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS), reunindo 45 pesquisadores de 25 instituições.



Lançado no final de agosto, o estudo está alinhado com a Organização das Nações Unidas (ONU), que declarou o período entre 2021 e 2030 como a Década sobre Restauração de Ecossistemas. E apresenta dados e propostas para demonstrar o benefício mútuo entre produção agrícola, conservação e restauração, em meio a uma conjuntura crítica para a agenda ambiental brasileira e capixaba.



No Espírito Santo, o amplo território propício para restauração florestal ainda não foi alvo de uma política pública que de fato encare a grandeza desse desafio. O principal programa de Estado nesse sentido, o Reflorestar, caminha timidamente, sem arranhar a arcaica estrutura político-econômica que blinda os grandes latifundiários do norte e noroeste do estado, com suas grandes pastagens extensivas e improdutivas e os desertos verdes de eucaliptais, condenando todo o território acima do Rio Doce a sofrer, de forma crescente, as agruras típicas do semiárido brasileiro.



Desde o lançamento do Programa Reflorestar, em 2013, foram recuperados 17 mil hectares, informa o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes). A próxima meta, com o edital lançado em maio deste ano, é atingir mais três mil hectares.



Segundo dados do Atlas da Mata Atlântica do Espírito Santo, lançado em abril de 2018, “a eucaliptocultura foi a atividade que mais cresceu, passando de 5,8% (2007/2008) para 6,8% (2012/2015), o que representa um aumento efetivo de 45.341,9 há em sua área plantada”, o que corresponde a mais de 276 mil hectares de desertos verdes.



Usos do solo



A mata nativa, por sua vez, cresceu, no período de 15,3% para 15,9% do território estadual, o equivalente a “um aumento efetivo de 27.179,5 hectares, totalizando uma área de 733.113 há”, prossegue o Atlas.



Na categoria “Mata Nativa em Estágio Inicial de Regeneração, o comportamento foi oposto, sendo observada redução de 0,2% da área do Estado com essa cobertura, passando de 6,4% para 6,2%, o que equivale a uma redução efetiva de 8.855,2 ha”.



Já a “Pastagem caiu 2,5%, o que equivale a uma área de 116.245,9 ha. Contudo, mesmo com a redução verificada, a Pastagem continua sendo a principal forma de uso do solo no estado do Espírito Santo, pois está presente em 39,2% do seu território”.



“O Café, principal cultura agrícola, apresentou expansão de sua área cultivada entre os períodos avaliados, passando de 8,6% (2007/2008) para 9,4% (2012/2015), ocupando a segunda maior área plantada no Estado”, o equivalente a 433 mil hectares.



Ciência e política



O coordenador do relatório do BPBES e IIS, Renato Crouzeilles, professor do Programa de Pós-Graduação em Ecologia da UFRJ e do Centro de Ciências da Conservação e Sustentabilidade do Rio na PUC-Rio, salienta que ciência e política andam juntas e se beneficiam. “O planejamento inteligente e o manejo integrado da paisagem levam a uma situação de ganha-ganha, onde ganha o meio ambiente, ganha a produção agrícola e ganha a sociedade”, explica.



Na visão de Crouzeilles, sensibilização e engajamento são essenciais para uma sociedade consciente, com ações em todas as esferas de influência. “Para isso, governos, estados, pesquisadores, praticantes e coletivos de restauração devem disseminar conhecimento baseado em ciência para toda a sociedade, desde a população rural até a urbana. Independentemente das políticas públicas ambientais exercidas pelo governo, todos devem continuar fazendo a sua parte para que haja ganho ambiental e socioeconômico no país”, completa.



E quando se fala em sensibilização e engajamento nas áreas rurais, no Espírito Santo, os principais atores que despontam são movimentos sociais do campo, como o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que fazem da Agroecologia – e consequentemente da restauração florestal e diversidade agrícola – uma de suas principais bandeiras.



“As comunidades camponesas estão isoladas na região de tabuleiro do norte e noroeste”, conta Douglas Alvaristo, militante do MPA. “São grandes propriedades com um recorte bem característica de cana, capim e eucalipto. Enquanto as unidades de produção camponesa já possuem uma composição vegetal mais diversificada, com componente nativo”, descreve.



“A gente tem a consciência de que a agroecologia cumpre um papel fundamental como método de produção conservacionista. Mas não só. Entende a importância do ambiente nativo não antropizado, para conservação ambiental, refúgio e alimentos pra fauna, polinização”, disserta.



“O instrumento que a gente tinha e batalhou muito por ele é o Reflorestar. Apesar de não considera o ideal, ainda tem muito que otimizar, mas é um instrumento muito robusto, um dos primeiros do Brasil. Como recuperá-lo?”, indaga o camponês. “A intenção do [governador Renato] Casagrande é retomar”, ressalta, sugerindo.



SAFs



O professor Eduardo Mendonça, do Departamento de Agronomia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) em Alegre, endossa a proposta camponesa e dos institutos nacionais autores do relatório.



Trabalhando na implantação de Sistemas Agroflorestais (SAFs) para produção de alimento e serviços ambientais, o pesquisador afirma que a restauração é o caminho. “Temos que restaurar as áreas degradadas utilizando os conhecimentos científica que temos de clima, solo e planta”.



De norte a sul do estado, “é assustador a quantidade de terra degradada”, testemunha. “Muitas áreas sob agricultura não seguem a orientação técnica quanto a erosão, adubação, tratos culturas e uso de agrotóxicos, acarretando erosão, degradação ambiental e contaminação dos alimentos e do agricultor”, observa.



“Quanto às pastagens, o dominante é encontramos pastagens conduzidas sem nenhum cuidado com o ambiente. Pastagens sem adubação básica do pasto, sem controle da quantidade de cabeças por área”, descreve.



EPIA-RIMA para eucaliptais



Também no sentido da restauração ambiental do território capixaba, tramita na Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales), o Projeto de Lei (PL) 646/2019, do deputado Sérgio Majeski (PSB), que torna obrigatório o Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) na obtenção do licenciamento para exploração da planta em áreas acima de 100 hectares e atividades agropastoris que alcancem mais de mil hectares.



A medida reinsere os incisos XIV e XVII no art. n°75 da Lei n° 4.701/1992, alterada pela Lei n°10.423/2015, que dispensou tais exigências. Segundo o deputado, essa mudança contribuiu para o aumento desordenado e nocivo do cultivo dessa espécie.



“A flexibilização da norma favoreceu a expansão dos grandes latifúndios, responsáveis pela intensa degradação ambiental registrada nos municípios capixabas. A monocultura do eucalipto é prejudicial ao meio ambiente. Além disso, 95% dos pequenos produtores têm menos de cinco hectares de terra, o que é totalmente injusto”, argumenta o parlamentar.



A matéria foi lida na sessão ordinária do dia 13 de agosto e encaminhada para as Comissões de Justiça, Meio Ambiente e Finanças. Caso aprovada, a norma entrará em vigor na data de sua publicação.



 

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