Terça, 14 Mai 2024

???As divergências não serão maiores do que nossas convergências???

???As divergências não serão maiores do que nossas convergências???

Rogério Medeiros e Renata Oliveira



“Uma utopia é uma realidade em potência”

Édouard Herriot



Gustavo De Biase deixou o Psol esta semana com uma missão: ajudar na coleta de 30 mil assinaturas em favor da criação da Rede, partido capitaneado pela presidenciável Marina Silva e pela companheira de Biase no Psol Heloísa Helena.



Candidato mais jovem do País à prefeitura de capital, Gustavo De Biase enfrentou as grandes lideranças na disputa eleitoral de 2012 em Vitória e saiu do processo com mais de sete mil votos.



É com esse capital que ele busca conquistar a atenção dos simpatizantes do movimento Nova Política. Quer também atrair a juventude, com a ideia de uma nova forma de enxergar a política no Estado e no Brasil.



Ele entende as dificuldades neste início de caminhada, mas acredita que o futuro para a Rede é promissor. Confira a entrevista de Gustavo De Biase.



Século Diário – Como é essa história de sair da esquerda para um partido que defenderá o meio ambiente, pelo menos, parece. Um tema mais amplo, que a esquerda nunca zelou...



Gustavo De Biase – Eu fui o candidato a prefeito mais jovem do país na eleição de outubro passado, fui candidato a prefeito de Vitória, o mais jovem nas capitais pelo Psol, e começamos dentro do partido uma discussão. No meu grupo –  o Psol é dividido em tendências, não tem o centralismo democrático – alguns militantes se aproximaram pelo pensamento capitaneado por Marina Silva e Heloísa Helena. São amigas, militaram juntas no PT, e esse debate já vinha ocorrendo há algum tempo. No final do ano passado, o movimento da Marina deu uma esfriada, ficou mais morno, mas agora voltou com mais força. Tive uma conversa com o grupo do Psol do qual eu fazia parte e parte desse grupo resolveu ir com a Heloísa Helena no encontro nacional que ocorreu em Brasília para o lançamento do partido. Entendi como era o projeto e enxergo que é uma alternativa, assim como o Psol, para a nossa realidade tão desgastada entre os partidos. Alguns setores do Psol enxergam a Rede como inimigo, do PT também, mas com interesses escusos, que são os de garantir sua disputa interna e que a Marina não atrapalhe determinado candidato a presidente, não enxergam a parte da Rede.





Aí entra o debate do meio ambiente, que é importantíssimo, que eu toquei na minha campanha, não de forma tão aprofundada como eu queria, falei da questão do financiamento. É uma aposta em um projeto ousado, mas um projeto sério. Marina poderia entrar em algum partido já existente, tanto que muitos convidaram. Mas ela, Heloísa Helena e outras pessoas de outros partidos entenderam que seria melhor montar esse partido, que ainda não é um partido, é um movimento, mas nós acreditamos que vai se efetivar como partido.



– E como estão os primeiros passos da Rede no Espírito Santo?



– Eu estava como presidente do Psol até há algumas semanas, quem estava tocando o projeto aqui no Estado era um grupo chamado "sonháticos", que dentro do movimento Nova Política, são jovens que trabalham essa questão ambiental. Temos também a figura do Guerino Balestrassi [presidente do Banco de Desenvolvimento do Estado e ex-prefeito de Colatina] e outras pessoas que fazem parte de um grupo chamado  Esquerda Democrática, alguns que vieram do PT, de outros partidos, um grupo de jovens do PSB, do Psol...e a nossa meta no Estado é conseguir 30 mil assinaturas. Conseguindo, esperamos poder colaborar com os 500 mil que é a meta nacional.



– Na sua saída do Psol para a Rede, levou alguns companheiros?



– Eu não fiz nenhum movimento de deslocar as pessoas porque não acho isso ético. Algumas pessoas estavam discutindo e concordaram em sair, mas por vontade própria, não convidei ninguém. E tem uma coisa que tem de ficar bem clara: o Psol é um partido pelo qual tenho muita gratidão e continuo acreditando nele. Pedi a desfiliação porque não tem como se identificar com dois movimentos.



– Sua desfiliação foi na terça-feira dessa semana...



– Sim. Foi um processo de amadurecimento e ainda acredito que, lá na frente, o Psol pode ser um aliado nosso. Eu continuo trabalhando em movimentos sociais. Antes de me filiar ao Psol, já militava por um mundo mais justo, nas questões de direitos humanos, dignidade, recuperação de dependentes químicos. O Psol aperfeiçoou a minha luta como uma ferramenta importante, continuo a minha luta mesmo depois do Psol.



– Voltando à questão ambiental, você está saindo de um partido de esquerda para um projeto bem específico de meio ambiente.



– A Rede tem como carro-chefe o meio ambiente, mas não será um partido de um tema só. Se não discutirmos uma questão primordial que é a reforma política, do financiamento, e aí também entra a questão ambiental, a forma fisiológica como os partidos se relacionam, não vamos ter como discutir outros temas lá na frente.



– O que você leva do Psol?



– Eu não levo grupo de gente, não. Tadeu [Tadeu Guerzet, presidente do Psol de Vitória] é meu amigo, ele ficou, vai continuar fazendo um bom trabalho. Eu vou ampliar meu entendimento sobre o meio ambiente, vou continuar fazendo o que sempre fazia, no movimento estudantil, embora esteja me formando, no movimento popular, movimento de morador de rua, do hip hop, direitos humanos, e acho que a Rede engloba todos esses movimentos da dignidade humana. Agora, a questão do meio ambiente vai ser o carro-chefe, como a Marina tem colocado, e aqui no Estado não vai faltar tema para a gente debater. Temos a questão das poluidoras, colocamos o tema e o Luciano [Luciano Rezende (PPS)], que ganhou, disse que ia tratar o tema com dureza e eu queria perguntar: com que dureza ele está tratando as poluidoras?



– Mas está começando agora...



– Sim, tem 60 dias, mas já tratou da questão da luz. Em vez de se preocupar com grafiteiro, tem que se preocupar com o pó preto. Vou continuar debatendo esse tema como carro-chefe.



– Com o surgimento do movimento, temos a entrada de lideranças políticas na Rede vindas de vários partidos e com linhas ideológicas bem diferentes, como estão dialogando?



– A Rede tem um programa e não é uma rede de arrastão, não estamos trazendo qualquer um. São pessoas que aceitaram incluir esse programa no seu debate político e já têm uma certa história de defesa da sustentabilidade nos locais onde atuou. Essa questão da divergência dentro do movimento, a Marina trata de forma muito tranquila. Não estamos aqui para trabalhar um consenso de forma autoritária como acontece em muitos partidos. A Heloísa fala uma coisa, o Domingos Dutra [deputado federal pelo PT] fala outra, e vamos trabalhando o que chamamos de consenso progressivo. Tenho certeza que as divergências não serão maiores do que nossas convergências. Tenho aprendido a lidar com pessoas que pensam diferente, mas isso em nada tem alterado a minha essência e aquilo que eu acredito. O que debati dentro do Psol vou levar para dentro da Rede. A minha postura tem sido a mesma, agora só vou trabalhar com mais intensidade, por isso saí do Psol, na coleta de assinaturas.



A Rede já nasce com um esboço de projeto para 2014, que é a candidatura de Marina Silva à presidência da República, uma liderança que obteve 20 milhões de votos em 2010, tem uma imagem muito bem cotada com a população e venceu a disputa em Vitória. Como o movimento no Estado tem visto essa possível candidatura?



– A candidatura de Marina Silva em 2010 foi uma surpresa. Ela entrou como uma terceira via, não tinha tempo de TV, e conseguiu 20 milhões de votos, mostrando que existe uma parcela da população que se multiplicou desde 2006, quando Heloísa Helena teve sete milhões. É uma alternativa que dialoga de forma que as pessoas entendam o que estão falando. O que a gente espera no Estado é que esse movimento de Vitória, Marina ganhou aqui, se espalhe pelo Estado, mas não se espalhe não só do lado eleitoral, e sim pensando na transformação do pensamento do jovem, que se encontra no diferencial desse projeto.



– Há essa ideia de que a candidatura de Marina Silva cresceu no desgaste dessa polarização entre PT e PSDB...



– Dessa falsa polarização que está institucionalmente ultrapassada  e é isso que a gente traz de diferente. A Rede avança nesse ponto. Primeiro porque o nome é Rede, não é uma sigla, tenta quebrar com esse conceito. O próprio estatuto interno da Rede coloca o não à reeleição para o Executivo, limite de reeleição para o legislativo, teto de doação, coisas que ainda vão ser melhoradas até o partido se oficializar. Então vem resgatar esse sentimento que estava adormecido após tantos escândalos. A juventude que vem se mostrando indignada e que passa por uma mudança de comportamento global, com os protestos na Europa, a “Primavera Árabe” [onda revolucionária de manifestações e protestos que vem ocorrendo no Oriente Médio e no Norte da África desde 2010], aqui no Brasil, com os movimentos estudantis, essa juventude está procurando um projeto em que ela se encaixe e a Rede vem suprir essa demanda, que é a indignação.



- Nós vivemos no Estado há uma década um sistema de coalizão, que ultrapassa esse conceito e chega à ausência de disputa, com a união dos partidos em torno de um único projeto. Como a Rede se encaixaria nesse processo?



– Eu não tenho como responder essa pergunta com todos os elementos porque a Rede ainda não é um partido. Mas, baseado nas premissas que colocamos no programa, buscamos uma renovação política e aí é obviamente um não a essa unanimidade. Temos uma Assembleia Legislativa, com 30 deputados, cada um com sua história, mas que tem deixado a desejar, no aspecto geral, na fiscalização do Executivo. Teve embate de vereadores criticando a Assembleia, sendo que o papel dos vereadores é fiscalizar o seu Executivo, e o papel dos deputados é fazer com que a Assembleia Legislativa não se torne uma extensão do Palácio Anchieta, que é o que tem acontecido. Por mim e pelo movimento que hoje represento, vamos buscar uma renovação política neste Estado. Até porque, quem lidera o movimento nacionalmente é Marina Silva e Heloísa Helena. O movimento não tem dono, não vamos trabalhar com cacique, nem com decisão vertical, mas vamos buscar renovação.



– Mas a música aqui não toca como você está pensando...



– Mas a música ainda está sendo composta. As notas estão sendo colocadas. Começou bem. Estive em Brasília, com Marina e Heloísa, estive no dia em que o estatuto foi finalizado, das 15 horas até às 2 horas. A Marina não saiu em nenhum momento, não se colocou como uma figura política de 20 milhões de votos. Aqui no Estado estamos trazendo isso. Vou trabalhar mantendo minha postura. Recebi várias propostas quando acabou a eleição e não aceitei o convite de nenhum partido porque eu queria justamente dar continuidade ao que eu acreditava. Vamos trabalhar para que a música seja suave aos ouvidos da população do Espírito Santo, que está sofrendo com essa unanimidade e que não atende à demanda da forma que ela precisa. Não será uma oposição cega que critica tudo e todos, mas também não vai ser uma situação vendida que elege Renan Calheiros [presidente do Senado, do PMDB de Alagoas] e Theodorico Ferraço [DEM]. Vamos quebrar esse paradigma que já está ultrapassado.



–Há uma perspectiva para 2014. Se a Rede virar um partido, vai precisar de um palanque majoritário e de chapas proporcionais. Como está vendo isso?



– Temos uma orientação nacional, são dois passos. O primeiro e mais importante é a coleta de assinaturas. Estou dia a dia nesse movimento e posso dizer que é de verdade. Estamos empenhando quase 100% das forças para conseguir alcançar a meta. Alcançada a meta, temos que ter gente filiada e conversas para lançamento de candidaturas. Provavelmente teremos uma chapa de deputado federal, deputado estadual, uma candidatura ao Senado e, dependendo da conjuntura nacional e da necessidade do palanque da Marina, teremos uma candidatura ao governo do Estado. Pode ser também que não tenha. Mas não dá para falar de algo que ainda não é concreto. Mas vamos trabalhar por uma nova prática política, sem a política de gabinete. Isso tem que ser mais transparente e essa é a proposta da Rede, para que a população não fique refém de um acordo do qual ela não fez parte.



– Em que segmentos da sociedade vocês têm buscado apoio para esse movimento?



– Como a Rede não é um partido, é um movimento, estamos buscando apoio na sociedade civil. As pessoas estão empenhadas em trabalhar isso, nos movimentos culturais, jovens que trabalham com a cultura de periferia, movimentos comunitários, líderes comunitários, e até pessoas que nunca participaram de movimento nenhum e que estão indignadas também. É um movimento em que elas têm voz.



– E a receptividade ao projeto?



– Eu participei de alguns atos de coleta e senti uma receptividade muito grande com o projeto, com a Marina, com uma renovação. Então, tanto aquele que como eu que sempre militou no movimento social e aquele que nunca militou tem recebido muito positivamente, porque se cansou dos escândalos, do mensalão, de coalizão máxima para garantir a governabilidade, de colocar um Marcos Feliciano [pastor evangélico e deputado federal pela PSC] na Comissão de Direitos Humanos. O povo está cansado e temos que tomar cuidado para que esse cansaço não se torne um desgosto total pela política. O extremo desse lado favorece quem está no poder. Temos que canalizar essa indignação de forma positiva para disputar os espaços institucionais.



– Essa unanimidade política no Espírito Santo não se restringe apenas à questão institucional, para garantir a governabilidade. Está em todos os espaços políticos. Como a Rede pretende se inserir nos espaços?



– O nosso foco hoje, além da coleta de assinaturas, é a busca de lideranças que não sejam carimbadas da política. Como vai entrar a ocupação dos espaços de poder, ainda não podemos saber exatamente...



– Mas na discussão, no debate político?



– A discussão política hoje não é técnica é ética. Não dá para dividir palanque com pessoas que não tenham postura ética. Alcançados esses pontos, vamos buscar os espaços políticos nos meios capixabas. Por cima da ética, e não de um acordo. A partir do momento em que discutirmos a colocação no palanque por um cargo ou uma posição, vamos nos tornar um partido como outro qualquer. E não é assim que a Rede vai caminhar.



– Quando chegar outubro, quando o partido estará formalizado, não acha que as restrições impostas pelas ideias inovadoras da Rede possam afastar os interessados em se filiar?



–  É um pouco de utopia. Mas se a gente perder a capacidade de acreditar na utopia, eu paro com a política institucional, porque não faz mais sentido. Eu acredito que é possível, sim, romper com um sistema que enriquece a poucos e empobrece a maioria. Mas se afastar algumas pessoas é até bom, porque você já vê que não estavam com boa intenção. Quem quer construir uma sociedade melhor não vai se afastar vai sentar, vai conversar. Não é um filtro para inibir. Não queremos que seja um novo PSD.



Está preparado para enfrentar os discursos conservadores que poderão existir na Rede?



– Sim. O contraditório existe em qualquer partido.



O Guerino Balestrassi é um nome mais conservador, embora tenha essa identificação com a sustentabilidade. Ele também terá um discurso a defender dentro do partido. Pode ser um nome muito propício para o palanque majoritário.



–  Guerino tem um trabalho na Bacia do Rio Doce. Teve um trabalho muito bom na prefeitura de Colatina e é uma liderança muito importante. Ainda é cedo para discutirmos nomes para 2014 e fazer hipóteses. Ele seria um nome que colocaria mais um, para evitar a unanimidade.



– E qual o projeto de Gustavo De Biase para 2014?



– Ainda é cedo para dizer, mas tudo se encaminha para que eu seja candidato a deputado estadual. Pode ser que na hora mude o cargo, pode ser que eu não seja candidato também. A política é muito incerta, mas eu tenho certeza que a Assembleia precisa de uma renovação e a renovação não é necessariamente o meu nome, mas um projeto diferente que tem de entrar lá. Se for eu, ficarei muito feliz e aceitarei o desafio, como muitos que já assumi. Não pense que foi fácil ser candidato a prefeito de Vitória com 24 anos, contra tubarões, presidente de partido com 23 anos. A gente vai caminhando, vai aprendendo. Se eu não fizesse isso, estaria indo contra aquilo que acredito.







 

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Quarta, 15 Mai 2024

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