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Deputado que ofendeu STF é ameaça de ruptura democrática, afirmam lideranças

Coronel Quintino, presidente local do PSL, partido de Daniel Silveira (RJ), repudiou falas contra o STF, mas se esquivou de comentar prisão

Deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) foi preso nessa terça-feira. Foto: Agência Câmara

A manutenção da prisão e a cassação do mandato do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), preso pela Polícia Federal por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), nessa terça-feira (16), foram defendidas por advogados e líderes políticos no Espírito Santo, que apontam para uma ameaça de ruptura à democracia, que não pode ser tolerada, como disse o advogado e professor no Estado, Caleb Salomão.

Daniel Silveira, que se apresenta no Twitter como “policial militar, conservador, bacharelando em Direito, deputado federal, totalmente parcial e ideológico”, foi preso por divulgar um vídeo em que ofende ministros do STF, defende o fechamento da corte e faz apologia ao Ato Institucional (AI) 5, o mais duro da ditadura militar, que restringiu várias liberdades individuais. Ao ser levado para a prisão, ele disse: “Ministro, quero que você saiba que está entrando numa queda de braço que você não pode vencer”.

O deputado tem outros processos e, durante a campanha eleitoral de 2018, em um comício ao lado do hoje governador afastado Wilson Witzel (PSC-RJ) e do deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL-RJ), quebrou uma placa com o nome da vereadora Marielle Franco (Psol), assassinada meses antes, juntamente com seu motorista, Anderson Gomes.

Para o deputado federal Helder Salomão (PT), o deputado praticou crime contra a Constituição e contra a democracia, por isso ele deve ter o mandato cassado. “Precisamos reagir”, enfatizou, acrescentando que “eles estão testando para sentir as reações. O sonho dos golpistas e fascistas é o fechamento do regime democrático”.

O presidente do PSL no Espírito Santo, partido do deputado preso, Alexandre Quintino, coronel da Polícia Militar, assumiu posicionamento crítico a Daniel Silveira e ressaltou: “As falas proferidas pelo deputado são de um teor que repudiamos, carregadas de ofensas e incitações à violência, configurando um tom também de ameaça aos membros do STF”. No entanto, se esquivou de comentar sobre a prisão: “A questão da prisão, entretanto, não é da alçada partidária”. Nesta quarta-feira (17), o presidente nacional da legenda, Luciano Bivar, comunicou que expulsará Daniel Silveira.

O senador Fabiano Contarato (Rede) afirmou que “a reiteração criminosa, somada à gravidade das ameaças, autoriza a prisão preventiva e, por conseguinte, torna os crimes inafiançáveis, segundo a lei processual. Assim, a prisão é medida salutar e obediente aos requisitos constitucionais para a prisão de parlamentares, pois verifico presente o flagrante inafiançável”.

Para ele, caso ocorra a revogação da prisão, pela Câmara dos Deputados, “poderá catapultar o deputado de delinquente a herói, instigando crimes dessa natureza, em prejuízo da institucionalidade do Legislativo e do Judiciário. Mais ainda: poderá projetá-lo eleitoralmente no pântano bolsonarista”.

Já o advogado Caleb Salomão aponta que a prisão do deputado “é constitucionalmente sustentável, porque foi determinada a partir de um inquérito que tem o deputado como investigado. O STF entendeu que ele repetiu condutas já censuradas noutros casos. Evidentemente, o mandato parlamentar confere ao detido algumas prerrogativas, sendo a mais importante delas a submissão da decisão à apreciação dos pares”.

Arquivo Pessoal

Ele considera que “a decisão é corajosa e, sobretudo, necessária: a Constituição não assegura um direito à delinquência, como alguns defendem. O ataque às instituições ameaça a democracia e não pode ser tolerado. Quem tolera excessivamente o intolerante alimenta o tirano”.

Caleb Salomão destaca: “Não me parece crível que se trate de um ato isolado de um parlamentar claramente medíocre e detentor de um cabedal de ignorância e violência, como o demonstra sua história na Polícia Militar do Rio de Janeiro. Trata-se de um sujeito pós-constitucional: embora viva na constitucionalidade, não compreende suas regras e nem a elas se submete. Sendo assim, vejo a publicação do vídeo como um ato de um movimento já ensaiado e assumido pelas hostes bolsonaristas: o embate com as instituições pode levar à ruptura democrática, sonho de muitos deles”.

Nesse contexto, comenta, “é defensável – e deve ser apoiada pela sociedade – a decisão do ministro Alexandre de Moraes: ao combater a insanidade e a ignorância democrática que o vídeo promove, ele combate algo muito maior do que a indigência moral e intelectual de um inexpressivo deputado”.

O também advogado André Moreira ressalta que o país marcha para uma solução não democrática e não institucional. “Há muita discussão se um deputado pode ser preso preventivamente e o STF tem adotado essa postura só quando é atingido. Há uma licenciosidade enorme com a ação desse sujeito quando inclusive ele não era deputado, durante o processo eleitoral”, ressalta.

André recorda a submissão do STF no episódio do impeachment da ex-presidente Dilma “A traição quanto à sua função constitucional levou à construção dessas figuras. E agora as saídas são todas contestáveis, vai ter sempre alguém contestando. O STF deveria ter paralisado, no processo eleitoral, as manifestações antidemocráticas. Permitiu que essas pessoas chegassem ao poder sem tomar nenhuma medida – STF, Ministério Público, o judiciário, às vezes até parabenizando, como a gente viu ministros, procuradores da República, procuradores estaduais, fazendo manifestação pró-candidatos antidemocráticos. Agora eles chegaram ao poder”, aponta André Moreira.

Ele entende que a “a solução é terrível, porque prender um deputado preventivamente abre um precedente para prender um deputado da oposição preventivamente”, mas ressalva que “permitir que um deputado trame de forma aberta – e agora o presidente da República trama diretamente contra a democracia-, e diga que se não for eleito em 2022 seus súditos, seus comparsas, vão agir contra para mantê-lo no poder, isso é um cenário que se chegou só pela omissão e pela ação ilegal do STF reiterada criando interpretações da lei fora dos limites legais”.

Leonardo Sá

André lembra da violação de direitos fundamentais em nome da moralidade e do combate à corrupção e enfatiza que não é função do Judiciário fazer isso, pois quem define o combate à corrupção são outros órgãos. A função do Judiciário é a garantia de direitos fundamentais, sempre foi, principalmente na esfera criminal.

“Eles abandonaram essa garantia, criaram interpretações da Constituição que limitavam os direitos fundamentais e vamos falar da possibilidade da prisão em segundo instância: a prisão em segunda instância foi uma interpretação do STF que permitiu a prisão do Lula, sem trânsito em julgado, uma grave violação do artigo quinto, que fala que a prisão só pode ocorrer com o trânsito em julgado, e agora estão tendo que lidar com essa e outra tantas irregularidades”.

O advogado defende o respeito à Constituição, especialmente pelos órgãos encarregados de fazer a defesa, que precisam cumprir o seu papel no tempo e não extemporaneamente. “Agora as saídas são muito menos institucionais do que quando eles analisando questões políticas conjunturais decidiram por permitir a prisão do Lula, o impeachment da Dilma. Então, acho que nós precisamos reconstruir a democracia no país. Ela não está só abalada não, a ameaça é concreta”, comenta.

No contexto de uma eventual ruptura democrática, André Moreira aponta a ameaça dos decretos do presidente da República, que aumentam o número de armas em poder da população: “Eles servem a duas finalidades, uma delas amar os apoiadores de Bolsonaro para uma tentativa de um golpe, como aconteceu na Bolívia. Não é uma coisa que a gente está fazendo conjectura, aconteceu na Bolívia com Evo Morales, no final do mandato dele. Destituíram um governo de fato por dois anos e estão querendo repetir essa receita aqui”.

Diante disso, disse, com a democracia fragilizada, é difícil falar em liberdade, em garantia do deputado. “Não se deveria ter chegado a uma prisão do deputado nessas condições, por ele estar ofendendo ou se manifestando contra o STF. Já fizeram isso enquanto opositores, durante o processo eleitoral e o STF, o TSE e o Ministério Público ficaram calados. Agora, todas as soluções são complexas porque vão acabar fragilizando ainda mais a Constituição, que já está fragilizada. Infelizmente, é uma solução necessária”.

Quem é

Daniel Silveira, 38 anos, tomou posse na Câmara em 2019, em seu primeiro mandato, dividindo a legislatura com curso de Direito em universidade particular do Rio de Janeiro. Além de policial militar, o deputado também é professor de Muay Thay. Foi eleito nas eleições de 2018 com 31,7 mil votos.

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