Açucena critica rejeição à proposta para coibir violência de gênero na Câmara de Cariacica
“Como vereadora, e única mulher eleita nesta legislatura, apresentei uma emenda para incluir a violência política de gênero como uma das condutas que atentam contra o decoro parlamentar, pois zelar por um ambiente onde todas sejamos respeitadas e no qual não haja ataques à nossa atuação parlamentar, é dever da Câmara em seu conjunto”. A posição, da vereadora Açucena (PT), contesta a rejeição de uma emenda de sua autoria que buscava incluir a violência política de gênero no Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara.

A emenda previa que condutas configuradas como violência política de gênero fossem reconhecidas como incompatíveis com o mandato, passíveis de punições que poderiam chegar até à cassação do cargo. No entanto, foi barrada nessa sexta-feira (26) pelas comissões de Justiça e de Finanças, responsáveis pela análise prévia das proposições legislativas, impedindo que o tema fosse apreciado em plenário.
Para a parlamentar, a decisão representa uma perda para o município, por retirar da Casa um mecanismo que poderia fortalecer o enfrentamento a práticas de intimidação contra mulheres em espaços de poder.
Ela enfatizou que a violência política não se restringe a ataques individuais, mas compromete a própria democracia. “Se hoje temos apenas uma vereadora na Câmara, esperamos que no futuro próximo sejam muitas outras. É preciso ter a garantia de que o parlamento é um espaço seguro para as mulheres”, defende.
A iniciativa buscava alinhar o regimento interno da Câmara a legislações já existentes em outras esferas. No Espírito Santo, a Lei Estadual nº 11.672, sancionada em 22 de julho de 2022, define a violência política de gênero como ações, condutas ou agressões físicas, verbais, psicológicas e sexuais praticadas para reduzir, suspender, impedir ou restringir as funções de uma mulher eleita. A norma também prevê que esse tipo de violência pode atingir familiares da vítima e ocorrer de forma direta ou indireta.
A nível federal, a Lei nº 14.192/2021 estabelece que qualquer ação, conduta ou omissão destinada a impedir ou restringir os direitos políticos das mulheres configura violência política, sujeita à responsabilização criminal. O texto busca proteger as mulheres especialmente em espaços de decisão, como parlamentos municipais, assembleias legislativas e o Congresso Nacional.
A atuação de Açucena vem sendo marcada por denúncias de hostilidade desde o início do mandato. No último mês de julho, o vereador Sérgio Camilo (União Brasil) protocolou, na Corregedoria da Casa, um processo disciplinar pedindo a cassação do mandato da vereadora. O pedido foi encaminhado para a Procuradoria pelo presidente da Casa, Lelo Couto (MDB), para análise jurídica. Além da cassação, Sérgio Camilo requer o afastamento imediato da vereadora de suas funções e a convocação do suplente, Alexandre Lemos, que somou 2.360 votos na disputa de 2024.

Em novo episódio, o mesmo vereador voltou a atacar a parlamentar, proferindo frases como “cale a boca”, “você é uma desqualificada” e “não suporto ouvir as falácias da vereadora da bandeira vermelha”, em tom agressivo. As atitudes foram classificadas como misóginas e motivaram Açucena a protocolar um pedido de cassação contra o colega, apoiado pelas direções estadual e municipal do PT, que ainda aguarda análise formal.
Mulher, negra, jovem, candomblecista e integrante da oposição à atual gestão municipal, Açucena foi eleita em 2020 com mais de 2,6 mil votos e construiu seu mandato com base em pautas ligadas a demandas sociais e populares. Na avaliação da vereadora, esses elementos de sua identidade e atuação, ligada às mulheres, à juventude, à população negra e às religiões de matriz africana, motivam o que aponta como perseguição sofrida na Casa de Leis. “O que vivemos em Cariacica reflete o que acontece em muitas cidades brasileiras: mulheres que chegam ao parlamento passam a enfrentar resistências que tentam restringir seu exercício pleno do mandato”, disse.
Para a vereadora, ao rejeitar a emenda, a Câmara de Cariacica “perdeu a oportunidade de fazer história ao configurar a violência política de gênero como uma prática inaceitável dentro de nosso Parlamento. Há um aumento no número de casos de violências praticadas contra as mulheres parlamentares em diversos lugares do Brasil e aqui na nossa cidade vivenciamos esse cenário”, destacou.