Sexta, 26 Abril 2024

EntrevistaSérgio Vidigal

EntrevistaSérgio Vidigal

 

Renata Oliveira e Rogério Medeiros



Nunca foi um bom amigo quem por pouco quebrou a amizade
Provérbio popular
 


O município da Serra é o cenário da disputa mais interessante deste ano. No embate estão o prefeito Sérgio Vidigal (PDT) e o deputado federal Audifax Barcelos (PSB), que foi seu sucessor e antecessor. Nesta alternância, que já dura 16 anos no município, há elementos emocionais muito fortes, que dividiram o eleitorado municipal. 
 
Vidigal fez de Audifax seu sucessor, que depois de quatro anos não disputou a reeleição e passou a encampar o discurso de que fora traído por Vidigal, que venceu a eleição em 2008 e agora vai enfrentar sua cria em uma eleição disputadíssima e em dois turnos. 
 
Nesta entrevista, Vidigal coloca sua versão do tema, fala das dificuldades que enfrentou nos três mandatos que governou a Serra e dos desafios para 2013. Ele admite que não há diferença nos projetos apresentados por ele e por Audifax, mas defende que tem mais experiência no enfrentamento de crises do que seu principal adversário. 
 
 
Século Diário – O município da Serra vive um momento interessante em que disputam a prefeitura criatura e criador. Como o senhor se acha nesta disputa?
 
Sérgio Vidigal – Para mim é uma experiência nova. Na Serra, desde que estou na política, não soube de uma disputa desse tipo. É um embate complicado porque em 2004 construímos juntos uma eleição na cidade, um projeto do PDT, esse fato agora é novo e o que nos preocupa muito é que o argumento do candidato (Audifax) é o de se fazer de vítima e a história não é bem essa. Lá atrás ficou sinalizado isso e foi consolidado por uma pesquisa divulgada em março de 2008, quando foi colocado o nome dele e o meu para a população, e o meu tinha mais densidade. Tem também a questão partidária, porque em um dado momento ficou instável a situação dentro do partido, o meu sucessor não participava das reuniões e fez um movimento de desfiliação. Eu conversando com ele - ele sempre negou isso -, Audifax falou que a principio não tinha interesse, inclusive, que eu deveria disputar. Quando eu voltei de Brasília, me surpreendi porque o discurso tinha mudado. Em março teve a pesquisa do Futura, em que 64% da população entre mim e ele apontou que queria o meu retorno. Na convenção, ele participou, depois da convenção é que ele teve essa mudança de comportamento.
 
– E como fica a disputa deste ano, com esse clima?
 
–  Agora com a disputa instalada, o que me preocupa muito é que é uma disputa que tem um sentimento muito grande, e no último debate isso ficou muito claro, que é um sentimento de ódio, de revanchismo, vingança, e eu fico preocupado porque isso não é bom para a Serra. Ao longo desses 16 anos a Serra foi construída com união. Eu tenho dito que só o amor constrói e o momento é muito temeroso. Eu temo, por exemplo, porque ele tem dito que está tudo errado, e hoje temos cerca de 30 a 40 obras em andamento. Temo que se por ventura ele for eleito, não dê continuidade às obras, que são muito importantes.

 
– E como o senhor percebe os efeitos dessa disputa no eleitorado? 
 
– Na cabeça do eleitor ficou aquela imagem, a princípio, de que ele foi realmente traído, e eu acho muito estranho porque geralmente o pai não trai o filho. Geralmente o traidor é aquele que foi beneficiado e depois desconhece quem o beneficiou. Na política da Serra, eu não fui beneficiado por Audifax. Eu o beneficiei com todo o capital político que eu construí na cidade. O Audifax entrou na minha equipe em maio de 1997, foi meu secretário de Administração, depois passou para Finança. Eu tinha três nomes que poderia lançar como meu candidato a prefeito na Serra: o Isael, Manato, que já era deputado federal, mas eu particularmente trabalhava a candidatura do Audifax. Peguei o Audifax e coloquei na Secretaria de Educação para dar visibilidade a ele e a gente trabalhou exatamente a construção de novas forças políticas para a Serra. Tanto que as forças políticas novas na Serra, todas elas foram da minha administração. O PT, por exemplo, passou 16 anos na minha administração. O PR ficou 12 na gestão da Serra, até por conta da minha relação com o senador Magno Malta. Começo lá atrás, não era nem PR, era PL. Enfim, esse é o argumento que é utilizado com o eleitor e também muita boataria, muita mentira. O próprio desempenho da receita nestes últimos quatro anos, que é totalmente diferente dos últimos 12 anos. 
 
– Esse é um dos pontos criticados de sua administração pelo adversário, como é isso?
 
–  O primeiro mandato nosso foi difícil porque o município estava desorganizado. Não porque o município era inviável, porque eu não consegui nenhum recurso externo para realizar uma mudança, nós organizamos o município. No segundo mandato conseguimos um crescimento real de receita, que foi em nível estadual e que também impactou o município, porque o índice de ICMS foi aumentando. Na administração do Audifax foi ainda melhor porque a economia nacional esteve muito forte e o índice de ICMS estava mais alto. Chegamos a ter em 2008 quase 17% do índice de participação do ICMS do Estado, quando chegou em outubro veio o impacto da crise mundial e nós chegamos em 2009 com uma experiência nova na cidade. Tínhamos um aumento real de receita, mas tivemos um índice de participação no ICMS, depois tivemos queda de receita e depois estagnamos a receita. A nossa receita de 2004, atualizada, foi de R$ 360 milhões. A receita de 2008, atualizada, foi de R$ 748 milhões. No novo mandato a receita dobrou. Em 2009, essa receita foi de R$ 640 milhões; em 2010, R$ 730, e em 2011, R$ 778 milhões. Em 2012, não vamos chegar a R$ 800 milhões. Então, você vai ver uma receita estagnada. Não conseguimos nem a correção e evidentemente tem correção salarial e aumento de oferta de serviço. Tínhamos 50 mil alunos em 2008 e temos 64 mil atualmente.Tínhamos 2.700 profissionais na saúde e temos hoje 3.100 profissionais. Estou falando só desses dois setores que hoje consomem 50% dos investimentos da Serra. Então, tivemos que fazer uma redução dos investimentos. E realmente foi um momento de muita dificuldade. E 2010 foi pior, porque em 2009 não sentimos ainda os efeitos daquela receita, mas depois de julho, aquela marolinha que o Lula falou, para a gente teve um impacto muito maior. Porque para o Estado não houve redução, mas nós tivemos redução. Tivemos quatro pontos de redução de ICMS, que é praticamente a receita de Cariacica. Esse foi o exercício que tivemos que fazer. E a redução aconteceu por conta da crise do setor de siderurgia. 
 
– Há uma leitura que se faz no município da Serra que dificulta ainda mais o embate: a percepção de que o projeto de Vidigal e o projeto de Audifax são, na verdade, o mesmo projeto. Como o senhor vê isso?
 
– Qual é o projeto de Audifax? É o meu projeto.  Nós fizemos um projeto para a Serra para 20 anos, eu só pude fazer oito, tinha que fazer um substituto e naquele momento qualquer um seria o substituto, o cenário mostrava isso. Então, o projeto era o mesmo. 
 
– Mas continua sendo o mesmo...
 
– Eu tenho visto ele falar nos debates e tem se apropriado, inclusive, de projetos meus. Mas eu não vi nada de diferente. Acredito que se a população da Serra quer mudança, não é com Audifax que vai ter. Aí seria com o Professor Renato (Psol). A mudança está ali, não sei se para melhor, mas a mudança está ali. 
 
– O senhor tem uma vantagem em relação aos demais candidatos da Grande Vitória, porque ao contrario dos demais, já sabe quem será seu adversário no segundo turno. Como vai ser esse enfrentamento, que será um repeteco do primeiro turno, e contra um adversário que na verdade é um reflexo de sua administração?
 
– Esse é o maior desafio. Até porque eu tive o cuidado e respeito à Serra de não levar essa disputa para o âmbito pessoal. Em nenhum momento alguém me ouviu falar nada sobre isso. O que ocorre é essa indústria da boataria de que ele foi o coitadinho, até porque ele veio do meu projeto e não eu do projeto dele.
 
– Mas na época foi uma temeridade a escolha de Audifax, porque ele era um técnico, o que ele é realmente. E aí todo mundo achou que o prefeito fez uma escolha temerária porque ele era desconhecido. 
 
– Sim. Eu escolhi o Audifax porque eu queria mostrar que a eleição dele se devia única e exclusivamente à gestão da Serra, porque se eu apoiasse um candidato detentor de mandato, ele poderia dizer que vinha de seu próprio capital. Além disso, ele participou de nossa gestão e eu achava que ele era a continuidade da gestão com o novo e não uma continuidade com algo antigo. Porque eu poderia muito bem apoiar (João Miguel) Feu Rosa, que era deputado federal. Eu poderia ter ampliado meu leque de aliados. 
 
– O senhor acha que há carência de novas lideranças e novos projetos políticos para se debater?
 
– Acho que as novas lideranças também nasceram desse projeto. Por exemplo, o PT. Givaldo Vieira (vice-governador do Estado) foi nosso secretário, Lourência Riani foi nossa secretária. O Vandinho Leite (PR) também.. O PR sempre participou da gestão, então, o que tem de lideranças na Serra hoje são desse projeto. E neste momento houve uma união para me isolar desse projeto. O próprio Renato Casagrande, quando perdeu a eleição para o governo do Estado, foi secretário na Serra. 
 
– Ele foi seu secretário de Meio Ambiente...
 
– Sim. E lá ele restabeleceu o PSB Estadual, porque com visibilidade ele pôde reorganizar o PSB e o único lugar que o PSB ficou como referência foi na Serra, com a vice-prefeitura. E o PSB está há quatro mandatos como vice na Serra. Então é um projeto que o PSB se apropriou dele, o PT se apropriou também. Houve um momento em que o PT lançou chapa de vereador em 2000 e Givaldo não conseguiu fazer legenda, e nós trouxemos Givaldo para o governo para ele ser secretário e em 98 apoiamos Márcia Lamas para federal, porque nós queríamos garantir que o PT elegesse um deputado federal, para que as forças políticas nossas, PSB, PT e PDT, pudessem sobreviver, quando foi a eleição de João Coser (prefeito de Vitória) para a Câmara.  Em 2004, nós fizemos uma grande aliança. 
 
– Vocês jogaram a candidatura do José Esmeraldo para corner...

 
– Sim, mas ele topou e ele poderia ser o nosso candidato porque tinha quase a mesma densidade do Coser. E o vice meu da Serra não seria PSB, seria PT e o vice de Max Filho (PSDB) seria PT também. A única coisa que não conseguimos fazer acordo foi Cariacica, porque eu tinha um compromisso do Magno de acompanhar o PR e o PR lançou na época Aparecida Denadai (PDT), mas no segundo turno voltamos e apoiamos a candidatura de Helder Salomão (PT).
 
– Para quem acompanha a história política da Serra é importante destacar que o momento de sua primeira eleição trouxe um rompimento com o modelo político que lá havia com João Batista da Motta, Feu Rosa e outros. A partir dessa primeira eleição começou a surgir essa nova classe política no município que existe até hoje...

 
– A partir desse projeto político. 
 
– E aí o prefeito apostou em Audifax, que era um nome dentro desse novo modelo. 
 
–Elegemos (Carlos) Manato deputado federal, Sueli (Vidigal) deputada estadual, depois entra Audifax prefeito. Essa estratégia minha era eleger o prefeito para desestabilizar os concorrentes e foi o que nós fizemos. Para estadual, Sueli disputou contra Gilson Gomes, Luiz Carlos Moreira e Edson Vargas. E Manato na federal disputou com Feu Rosa, teve mais votos que o Feu Rosa, assim como a Sueli foi a mais votada. Isso mostrou que o governo da Serra dava a força política na cidade e facilitou a pavimentação do caminho para a disputa a prefeito. Tanto que eu podia pegar qualquer uma dessas lideranças e apoiar para prefeito, mas sentimos que havia ambiente para novas lideranças, construindo uma nova liderança que era o Audifax. Foi um trabalho que para quem tem um ponto de vista político mais amplo não foi inteligente, porque eu só fortaleci o meu partido. Você vê que Lula para chegar e se manter teve que ampliar o leque. O próprio Paulo Hartung (PMDB) ampliou o leque. Nós trabalhamos tanto para dentro do PDT que chegamos a fazer três deputados federais. Querendo fortalecer o partido, então em um determinado momento eu não me coloquei como uma figura política e sim uma figura partidária. 
 
– Mas hoje o senhor vê uma diferença nesse projeto político?
 
– A diferença é que no primeiro mandato de prefeito, em 1997, foi um mandato de crise. Este terceiro mandato também foi um mandato de crise. Então, a diferença desses momentos é a minha experiência de conviver com crise. Isso é muito importante para a Serra, porque o ano que vem será muito difícil...

 
– Por causa das perdas...
 
– A perda do Fundap (Fundo das Atividades Portuárias) representa quase 10% da receita da Serra e junto com o Fundap vamos perder índice também. É um cenário de muita dificuldade. Então, acredito que minha experiência e meu conhecimento de conviver com dificuldades ajudarão a Serra a sair mais rápido da crise, porque o Audifax foi eleito em um momento de bonança. Ele foi, no nosso modo de dizer, um gastador de herança. A gente vai ter que governar com muita austeridade. Tanto que eu já me antecipei e preparei a reforma da Agenda 21, criando a 2012-2032, que é esse novo cenário que estamos vivendo. 
 
– Então, o diferencial não é no projeto e sim nas circunstâncias...

 
– E no enfrentamento da crise, porque ela não acabou. 
 
– E o prefeito consegue explicar isso para o eleitorado?

 
– É complicado... em um debate com ele eu disse, “olha, eu não sei como o candidato está fazendo esse monte de coisas, porque o cenário é outro”. Ele é economista e eu sou médico e os números não enganam qualquer um que consegue enxergar cenário econômico. Até Vitória vai governar com mais dificuldade, porque vai perder receita e índice, porque as empresas fundapeanas contribuem muito para o nosso índice. A partir do momento em que ela para de importar, você perde valor agregado.
 
– Porque ela não paga, mas o valor serve para o índice...
 
– E outra diferença é que eu vou governar com amor. Essa questão das obras. Todas as obras que o Audifax deixou eu terminei, estão todas funcionando, até porque ele não deixou obra para eu inaugurar, ele antecipou. As obras que ele não inaugurou foram obras que paralisaram porque a empresa quebrou, foram três ou quatro. 
 
– Quando ele entrou, começou a inaugurar obras, dando a impressão de que recebeu uma administração organizada, que era só dar continuidade. 
 
– Ele mostra o cardápio de obras inauguradas, mas ele inaugurou obras com 10 dias de governo. Ele inaugurou dois Cemeis (Centros Municipais de Educação Infantil) e uma escola com 30 dias de governo. Como eu tinha intenção de ser candidato a governador, queria mostrar que o projeto do PDT era de planejamento. Eu precisava também que ele incorporasse força política. Então deixamos uma série de obras para ser inaugurada no governo dele, que também serviria para que desse a visibilidade para mim. E houve um volume muito grande de investimentos e de obras, que foram realmente iniciadas em nossa gestão. 
 
– Prefeito, como o senhor vai fazer para colocar Magno Malta e Paulo Hartung no seu palanque?
 
– Mas é por isso que eu sou preparado para governar a Serra, tenho capacidade de unir. O Magno disse que só não quer estar junto, Hartung também. E o próprio Ricardo (Ferraço)...
 
– O Ricardo Ferraço (PMDB) sempre lhe foi muito próximo.
 
– Sim, mas eu também fui muito peitudo de abraçar a campanha dele no primeiro momento. Foi uma coisa de amizade, mesmo, não tinha nenhuma motivação além da amizade, tanto que o Magno puxou a minha orelha no início. Essa relação sempre foi boa. A única relação que eu nunca tive, nem de amizade, nem de inimizade, foi com Paulo Hartung. Nunca tivemos uma relação tão próxima, mas com Magno e com Ricardo sempre foi próxima, até porque fomos deputados estaduais juntos, no governo Vitor Buaiz.
 
– Como o senhor se sentiria diante de uma vitória ou de uma derrota em relação a Audifax?

 
–  Se eu vencer diria que a Justiça foi feita, porque o que eu sofri nesses quatro anos foi muita coisa, muita denúncia, muita acusação. Esse processo desgastante para mim em 2010, que me baqueou muito, acho que será uma vitória da Justiça. Mas se isso não acontecer, vou entender que é a vontade de Deus e não vou fazer absolutamente nada para dividir a Serra, porque o que eu tenho pela Serra é amor.

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