Quarta, 01 Mai 2024

O pseudo fim da unanimidade na disputa eleitoral do Estado

O pseudo fim da unanimidade na disputa eleitoral do Estado
Nerter Samora e Renata Oliveira
 
Mesmo com a possibilidade de haver dois palanques na disputa ao governo do Estado este ano, o poder continua concentrado no mesmo grupo. Papo de Repórter analisa a movimentação desse grupo e a disputa interna.
 
 
Nerter – Desde que o ex-governador Paulo Hartung enviou uma carta ao PMDB capixaba disponibilizando seu nome para a disputa ao governo do Estado, muito tem se falado em quebra da unanimidade. Mas essa discussão tem de ser feita com mais cautela. O cenário eleitoral que existe hoje é artificial de várias formas, inclusive, nesta história de disputa entre o governador Renato Casagrande e o ex-governador Paulo Hartung. Não estou dizendo que não haverá disputa, como aconteceu nas eleições passadas, vai haver, mas não estamos tratando aqui de um enfrentamento entre grupos políticos. 
 
Renata – É verdade. Acho que vamos ter uma disputa, sim, e talvez mais dura do que a de 2002, de Hartung contra Max Mauro (PTB). Casagrande e Hartung têm movimentado suas peças, têm feito uma análise de cenário e jogado com as armas que têm para tentar sair na frente na disputa eleitoral, mas tudo indica que essa disputa não vai ser nada fácil. Aliás, vamos lembrar um pouco daquele pleito de 2002. A briga mesmo ficou entre Hartung e Max, mas a gente tinha a figura de Paulo Ruy Carnelli, pelo PSDB, que se apresentava como Paulo, confundindo o eleitor. A entrada dele naquele pleito o rendeu o apelido de laranja. Guarda alguma semelhança como as conversas que circulam nos bastidores. 
 
Nerter – Pois é. Essa propaganda do PSDB deixou essa sensação nos meios políticos. O jogo parece ser de dois contra um. Como Casagrande foi eleito no palanque de Hartung, com o discurso de continuidade, e incorporou em sua equipe grande parte dos aliados do seu antecessor, vai ficar um pouco estranho se ele partir para cima do Casagrande. Aliás, ele nem pode, porque apesar de os índices do governo atual serem ruins nos indicativos sociais, ficam positivos se comparados aos oito anos de Hartung. Ele deve saber muito bem disso. Então, esse trabalho de dar porrada vai ficar com Guerino Balestrassi, o que deve agradar bastante o tucano. Balestrassi tem birra com Casagrande desde a sucessão na Prefeitura de Colatina, quando o candidato dele, Tadeu Marino, perdeu a convenção para Paulo Foletto. Ele saiu do PSB e apoiou o hoje prefeito Leonardo Deptulski, do PT.
 
Renata – Balestrassi saiu com um capital eleitoral muito forte naquele momento, mas preferiu se unir a Paulo Hartung. Foi para o PMDB e depois entrou na cota hartunguete no governo de Casagrande, que engoliu o ex-correligionário a seco para comandar o Banco de Desenvolvimento do Estado (Bandes). Quando houve as mexidas nas peças como preparação para este cenário atual, Balestrassi saiu batendo a porta e se colocando como oposição. Ele não tem nenhuma penetração eleitoral na Grande Vitória, seu reduto é Colatina, mas disputaria o governo com a missão de atingir o fígado de Casagrande. Isso fez com que o governador recorresse a um expediente que lhe garantiu o título de candidato palaciano em 2010, que foi fechar com os caciques nacionais para mexer nas peças do tabuleiro estadual. Vai se beneficiar da movimentação entre Eduardo Campos (PSB) e Aécio Neves (PSDB) para esvaziar essa estratégia.
 
Nerter – Isso nos leva de volta ao tema central desse Papo de Repórter. Não há que pensar aqui em um enfrentamento de grupos, veja como todas essas peças circulam em torno do mesmo projeto político. É diferente, porém, do que aconteceu em 2006 e em 2010. Na disputa pela reeleição de Hartung, o bem avaliado Sérgio Vidigal (PDT) tirou, em convenção, um Max Filho do pé de Hartung e protagonizou uma candidatura ao governo do Estado insossa, propícia para garantir a recondução do governador sem qualquer arranhão em sua imagem. Em 2010, na eleição de Renato Casagrande, com o apoio de Hartung, o tucano Luiz Paulo Vellozo Lucas entendeu que não tinha como atacar um projeto do qual fez parte também, por isso, não ofereceu resistência ao palanque palaciano. 
 
Renata – Mas, desta vez, é diferente. Não há o menor interesse de Hartung em quebrar o projeto em curso no Estado, mas ele quer o comando da classe política e do Palácio Anchieta de volta. Aliás, as críticas que emanam de seus emissários são justamente em relação à saúde financeira do Estado. Hartung não cria gastos permanentes, seja com pessoal, seja com custeio. Os concursos e aparelhamentos de Casagrande causam arrepios em seu antecessor. A máquina de Hartung é enxuta, não cria despesas. Além disso, o afrouxamento do controle da classe política estabelecido no governo atual vem permitindo o surgimento de disputas que fogem ao controle do grupo, com o surgimento de um ou outro nome novo no cenário. Algo inadmissível para a política elitista que domina o Estado.
 
Nerter – Ou seja, o que veremos na eleição deste ano é uma briga por poder que vai se estabelecer dentro de um grupo. Isso não significa o fim da unanimidade, não significa o fortalecimento dos partidos ou o surgimento de uma oposição forte e estruturada. Basta ver como essa oposição se desenvolve na Assembleia. São dois deputados ligados a Hartung, que fazem apontamentos pouco eficientes, disparando às cegas contra o Palácio Anchieta. Quando acabar a eleição, volta tudo à normalidade, quer dizer, a unanimidade será restabelecida. Os derrotados vão para um canto curar as feridas e os vitoriosos vão reunir todos à sua volta, como sempre aconteceu. 
 
Renata – Se Casagrande vencer, talvez seja diferente. Não haverá como nem por que manter os aliados de Hartung em seu novo governo. Poderá fazer uma faxina na Casa. Como deputados e prefeitos dialogam com a caneta, os aliados de Hartung vão pregar no deserto. Se Paulo vencer, dificilmente o PSB terá forças para erguer um grupo de oposição. Não nos esqueçamos que mesmo tendo o governador do Estado, o PSB continua sendo um partido de médio porte no Estado. 
 
Nerter – Bom, esta semana Casagrande conseguiu fazer um gol na corrida eleitoral. Embora eles neguem de todas as maneiras o viés eleitoral da medida, não dá para dissociar  a suspensão do pedágio do processo eleitoral, que está às portas. Claro que isso terá reflexo, mas é apenas um foco de incêndio a ser apagado. Ainda haverá muitos outros. E, evidentemente, Hartung tem uma arma que Casagrande nem com todo dinheiro do mundo conseguiu conquistar, não é? 
 
Renata – Ahhhh! A mídia corporativa. Engraçado que o método é manjado, mas pelo jeito continua dando certo. Vem a pesquisa – e eu nunca vi na vida pesquisa de disputa estadual feita em quatro, cinco municípios –, cria o cenário de que Hartung está arrebentando a boca do balão, e depois vêm os coleguinhas de parte da imprensa e dizem que Hartung é o máximo, que o cara é o cara. Cria-se esse cenário artificial e pronto. Não estou dizendo que é pra falar bem do Casagrande, não. Tem muita coisa que precisa ser dita sobre o governo. Mas que há uma discrepância no tratamento, isso é evidente. 
 
Nerter – E isso convence, não é? Há cerca de duas semanas, a Assembleia era a maioria Casagrande. Os prefeitos eram a maioria fechados com Casagrande. Daqui a duas semanas, talvez, o governador pode estar sozinho no palanque.  Hartung está há quatro anos na planície, deixou uma série de dívidas administrativas, não formou um só soldado em seu governo, e vai sair na frente no processo eleitoral. 
 
Renata – Assim é a eleição na unanimidade. Aqui não cabe aquela máxima: “esqueceram de combinar com o povo”. Eles decidem tudo no gabinete, não tem nada a ver com o eleitor. 

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Quinta, 02 Mai 2024

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