Sexta, 26 Abril 2024

'Temos um conhecimento extraordinário e uma distribuição de renda absurda'

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Sociólogo e sindicalista com experiência de trabalho em diversos países e continentes, Franco Patrignani lança nesta quinta-feira (29) o livro Democracia Necessária - Uma agenda para a mudança, publicado pela Editora Cândida, trazendo uma série de reflexões sobre a política contemporânea. O lançamento será por meio de um bate-papo online do autor com convidados a partir das 18h30, no canal da editora no YouTube.

O livro poderá ser adquirido com desconto até o dia do lançamento na loja virtual da Editora Cândida. Sem o compromisso de ser uma obra acadêmica, a publicação busca elementos da sociologia, antropologia cultural, filosofia e história para traçar ideias que possam contribuir para pensar a transformação social.

Atuando no sindicalismo desde os 22 anos, Franco assumiu ao longo de décadas várias tarefas em entidades dos trabalhadores a nível local, nacional e internacional, tanto na Itália como em países da América Latina, Ásia e África. Há 12 anos fixou residência em Vitória, onde acaba de se aposentar.

"No Brasil aprendemos que a palavra chave é intercâmbio e reciprocidade. Não adianta insistir numa cultura em que os que vêm de países ricos ensinam aos de países pobres. Essa música toca diferente entre os sindicalistas formadores e educadores brasileiros. Nos ensinam muitas coisas", diz o italiano, que utiliza em suas atividades formativas métodos do pedagogo pernambucano Paulo Freire.

Entre as reflexões que traz na obra, Franco aponta o constante clamor por mudança em nossas sociedades. "Mas pergunto: o que significa mudança? Mudar para quê? Mudar como?", questiona. São questões importantes para pensar a transformação social. Construir essa agenda que o subtítulo do livro propõe é um desafio grande, mas urgente.

Diagnosticando doenças sociais

Dialogando com a linguagem médica, o sociólogo aponta como ponto de partida a identificação do que considera como "patologias" ou "doenças" sociais. Esse diagnóstico coletivo é fundamental para a transformação dessa realidade.

Uma dessas doenças que ele identifica é a desigualdade. É importante sinalizar a desigualdade como um problema a ser combatido, já que alguns a enxergam como normal, natural ou inerente à sociedade em que vivemos. "Duas palavras que se usam quase como sinônimos é diversidade e diferença. Não é uma elaboração minha, mas do intelectual italiano Enzo Rulani, de que as diversidades devem ser reconhecidas e valorizadas, e as diferenças devem ser compensadas. Essa simples frase é um programa político extraordinariamente explícito", aponta Franco.

Outra doença que considera grave é a ignorância, que classifica em dois tipos. A ignorância crassa, de pessoas que se orgulham em afirmar sua ignorância e em atacar quem tem um mínimo de raciocínio diferente, e a ignorância induzida, daqueles que não recebem condições de acesso a certos conhecimentos. "Quando a escola pública não forma ou forma o mínimo indispensável, continua a produzir uma classe subordinada, de pessoas que fazem de conta que sabem escrever o mínimo necessário, mas que vão sair de lá e continuar sendo pessoas subordinadas. E essa ignorância é perigosa, porque muitas vezes se presta a apoiar qualquer aventura política", explica o escritor, que complementa com uma máxima: "quem estuda tem direito a mandar".

Embora a obra não busque se referir tanto a casos específicos, fica quase impossível não fazer analogias com o Brasil e o mundo contemporâneo e seus atores políticos.

Para o autor, uma terceira doença social é a indiferença, para a qual cita também um exemplo visual sobre nossa indiferença seletiva. Sobre o morador em situação de rua ou um dependente químico, que é notado quando se aproxima de nós e logo checamos nossas carteiras. Mas se essa mesma pessoa está mais distante, estirado em algum canto, passa a ser totalmente ignorada ou no máximo se torna apenas um elemento da paisagem cotidiana.

"Tem uma imagem linda contada por um amigo que diz que hoje estamos andando num trilho muito estreito, que do lado tem a montanha do conhecimento e do outro o abismo da indiferença. É uma imagem muito forte, explicita como temos um conhecimento extraordinário e uma distribuição de renda absurda".

Caminhos para a transformação

Definidas as doenças, Franco Patrignani indica a necessidade de pensar quais seriam os melhores remédios para tratá-las. Ele aponta que a principal ferramenta é a Política, com P maiúsculo, em seu sentido mais amplo de cuidado, mediação de conflitos e atendimento das expectativas da cidadania. "Do confronto das diferentes exigências e da disponibilidade de encontrar pontos comuns é que se pode avançar", diz o autor numa perspectiva dialética. "O conflito faz parte da nossa vida, mas tem formas para ser superado. A negociação é uma delas e a política existe exatamente para que se evite o caminho de usar as armas para resolvê-los".

Nesse sentido, ele aponta três forças fundamentais que se movem. O Estado, como reino dos direitos, deveres e da força para que sejam respeitados; o mercado, como reino da competição; e a sociedade civil, que ele entende como sendo de natureza extremamente plural.

"A sociedade civil é lugar de encontro e confronto constante entre diferentes tendências", aponta. Porém, a análise dessa tríade, reconhece, não pode ser como entes estáticos, pelo contrário, são extremamente dinâmicos. Os Estados nacionais, como é o caso da Itália, cada vez mais respondem a outros entes como as decisões da União Europeia. Outros entes internacionais, como empresas transnacionais e órgãos multilaterais como FMI e Banco Mundial, também exercem fortes poderes, que governam sem ter sido eleitos. A financeirização da economia global também induz o mercado e consumidores a escolhas desejadas pelos grandes conglomerados, aponta.

Assim, a sociedade civil acaba tendo que enfrentar uma luta de Davi contra dois gigantes, ou um Golias de duas cabeças, uma do Estado e outra do mercado, sendo que este condiciona a atuação do outro. "Enquanto Estado e mercado são estruturas que se criaram em resposta a exigências de determinado período histórico, a sociedade civil é uma forma primordial de se juntar pessoas que se reconhecem e se apoiam para se defender e se ajudar. Portanto, uma agenda de mudança precisa levar em conta o forte papel que pode ser desempenhado pela sociedade civil.

Essas são algumas das ideias aprofundadas por Franco Patrignani em Democracia Necessária, obra que será debatida na quinta-feira com diversos colaboradores que contribuíram de diversas maneiras para sua produção: Fabio Porta, Micaela Bracco, Jorge Solano, Silvia Portela, Gianni Biasizzo, Alfredo Andrade, Patricia Galleto e Cristian Senn.

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