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‘Caos pode se instalar a qualquer momento na perícia’

Categoria aponta “arbitrariedades” e chefias ameaçam entregar cargos

A insatisfação generalizada na Polícia Científica do Espírito Santo pode culminar no colapso dos serviços no Estado, alerta o presidente do Sindicato dos Peritos Oficiais do Espírito Santo (Sindiperitos), Tadeu Nicoletti. As chefias anunciaram, em carta aberta assinada por todos os diretores, disposição em entregar seus cargos, caso o governo não atenda às reivindicações por valorização salarial e pelo estatuto da categoria.

O dirigente sindical aponta que a crise representa “um prenúncio de um caos que pode se instalar a qualquer momento na perícia”. Segundo ele, a tendência é que todos os diretores entreguem os cargos, o que pode comprometer seriamente o funcionamento da Polícia Científica. “Vai ficar sem ter como funcionar, por falta de chefias”, alertou.

O sindicato convocou uma assembleia geral para a próxima segunda-feira (2), às 14h, nas galerias da Assembleia Legislativa. O encontro retomará as mobilizações permanentes em protesto contra o que classificam como “tratamento indigno” e “descumprimento de promessas” por parte da gestão Renato Casagrande (PSB). A pauta inclui a instauração de uma assembleia geral permanente, com encontros regulares todas as segundas, terças, quintas e sextas-feiras, começando já no dia seguinte (3), às 8h, em frente ao Departamento Médico Legal (DML).

A convocação reflete o acirramento de uma crise institucional na Polícia Científica capixaba, reforça o perito oficial criminal e presidente do Sindiperitos. Ele explica que a decisão pelas assembleias permanentes ocorre após a falta de avanços nas negociações pelo tabela salarial e o estatuto, e pela não concretização da promessa de valorização da categoria feita por Casagrande desde a campanha eleitoral de 2022.

Tadeu reforça que o estatuto da categoria aguarda aprovação há três anos, e o compromisso assumido pelo governador de implementar a média salarial nacional da perícia não foi cumprido. Ainda antes das eleições, ele recorda que Casagrande reafirmou o compromisso. “Agora, o governador quer mandar um projeto para a Assembleia Legislativa sem ter discutido o estatuto com o sindicato ou com a categoria. A Seger [Secretaria de Estado de Gestão e Recursos Humanos] não mostrou esse projeto para ninguém”, criticou.

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Lucas S.Costa/Ales

Para Tadeu, a condução do processo tem sido marcada por falta de transparência e autoritarismo. “É tudo a sete chaves, anti-democrático, arbitrário. Não temos uma mesa de negociação com a Seger. Mandam as coisas à revelia, sem mostrar para ninguém, descumprindo a lei, que impõe que a negociação de estatuto tem que ser feita com a categoria envolvida”, completou.

A insatisfação culminou com a carta aberta encaminhada a Casagrande nessa quarta-feira (28), assinada pelos peritos oficiais que ocupam cargos de gestão na Polícia Científica. No documento, os peritos reiteram o apoio à gestão estadual, mas expressam “profunda frustração” com a falta de valorização da categoria, especialmente na área salarial, que atualmente está na penúltima posição no ranking nacional, como enfatizam. O salário inicial na Perícia do Espírito Santo, afirma o sindicato, é de R$ 8 mil, enquanto o final é de R$ 15 mil. Este último, aponta, é menor do que a média nacional, que é R$ 17 mil.

“Essa discrepância tem impactos diretos na motivação dos profissionais, na atratividade da carreira e na manutenção da excelência técnica que caracteriza a Polícia Científica. A ausência de avanços salariais contribui para a perda de produtividade pericial, a evasão de talentos para concursos melhor remunerados, e dificuldades na gestão interna do órgão”, aponta a carta.

A previsão de envio de um projeto de lei para a Assembleia Legislativa para regulamentar a tebela e estatuto da Polícia Científica, sem discussão prévia, agravou ainda mais esse cenário, enfatiza Tadeu. “Estamos acompanhando via e-Docs a movimentação do projeto. A matéria está em sigilo, mas saiu da Seger para a Secretaria de Governo, e já vai para a Casa Civil para enviar para a Assembleia. Quando descobrimos, todo mundo ficou em polvorosa, porque é um projeto sem discussão, sem transparência”, ressalta.

Ele classificou a atuação da Seger como “um descaso” e destacou que, enquanto em outros estados a perícia recebe um tratamento condizente com sua importância, no Espírito Santo os peritos são “jogados às traças e tratados como escória”. Além disso, reforçou que a perícia é um órgão imprescindível para a resolução de crimes e para a diminuição da impunidade no Estado Democrático de Direito.

“Nunca vimos um tratamento tão ruim com uma perícia no país. É uma decepção grande, o não cumprimento da palavra empenhada na frente de várias pessoas, inclusive parlamentares”, pontua. Até o momento, informao sindicato, não houve qualquer resposta oficial do governo à carta aberta.

Comissão ‘atropelada’

Apesar da comissão criada para acompanhar de perto a situação da perícia, integrada por dez deputados, sob coordenação da deputada Iriny Lopes (PT), Tadeu observa que a atuação do governo atropela até mesmo o monitoramento do colegiado. “Até eles estão sendo desrespeitados pela Seger, que se comprometeu em apresentar o projeto para a comissão também antes de enviar para a Assembleia. E ignorou a necessidade de discutir com eles, junto com o sindicato e o governo”, pontuou.

A iniciativa de criação da comissão para discutir o estatuto e a tabela de subsídios da Polícia Científica do Espírito Santo (PCIES) partiu do presidente da Casa de Leis, Marcelo Santos (União), durante a votação do projeto de lei que cria o cargo de oficial de investigado de polícia (OIP), aprovado em outubro de 2024. O colegiado é composto pelo presidente da Casa, membros da Comissão de Segurança, os deputados José Esmeraldo (PDT), Camila Valadão (Psol) e Iriny Lopes (PT), que têm atuado em defesa da categoria, segundo o Nicoletti, e representantes do sindicato.

A Polícia Científica no Estado foi criada por meio da Emenda Constitucional nº 117/2022, e sua estruturação foi feita através da Lei Complementar Estadual nº 1062/23. Contudo, é preciso que o estatuto e a tabela de subsídios sejam consolidados.

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Ales

Projeto de lei

Em janeiro último, a deputada estadual Iriny Lopes (PT) apresentou um projeto de lei com o estatuto e a tabela de subsídios da Polícia Científica do Espírito Santo (PCIES), com base na proposta de estatuto elaborada por um Grupo de Trabalho (GT) composto por representantes da categoria, da Secretaria Estadual de Gestão e Recursos Humanos (Seger) e pelo perito oficial geral, Carlos Alberto Dal-Cin. O GT foi criado após mobilização dos peritos, mas a discussão sobre os documentos não avançou, pois a gestão estadual não os encaminhou à Casa de Leis.

A expectativa da categoria era de que o PLC fosse votado logo após o recesso parlamentar. Os peritos também acreditavam que a iniciativa de Iriny Lopes poderia forçar a discussão sobre a valorização da categoria, assim como aconteceu quando, junto com o deputado Fabrício Gandini (PSD), em 2022, a parlamentar apresentou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para criação da Polícia Científica, após o silêncio do Governo do Estado mesmo diante de várias mobilizações da categoria.

A Assembleia chegou a aprovar o PLC 42/2024, que alterou o prazo para a transição administrativa, de material, de pessoal e financeira entre a Polícia Civil do Estado do Espírito Santo (PCES) e a Polícia Científica para 31 de dezembro de 2024, o que gerou a expectativa de que o estatuto e a tabela de subsídios fossem enviados para a Assembleia Legislativa até o fim de 2024. Contudo, 2025 começou e a regulamentação não foi concretizada, aumentando o desgaste entre a Perícia e a gestão de Renato Casagrande.

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