Presidente do colegiado, Camila Valadão acionou o MPES e a Defensoria
A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa (CDDH/Ales) oficiou o Ministério Público do Estado (MPES) e a Defensoria Pública (DPES), cobrando providências diante da grave denúncia de violência transfóbica cometida contra uma adolescente trans de 13 anos no bairro Village do Sol, município de Guarapari, região metropolitana do Estado. A jovem foi vítima de agressões físicas, ofensas transfóbicas e teve o corpo incendiado. Ela está internada em estado grave, sem previsão de alta.
Nos ofícios enviados nesta semana, após receber formalmente a denúncia da Associação Diversidade, Resistência e Cultura (ADRC), entidade com atuação no município, a comissão pede informações detalhadas sobre o andamento das investigações; a adoção de medidas legais cabíveis; o reconhecimento da motivação transfóbica do crime; e a garantia de proteção integral à vítima e a seus familiares, conforme previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e na Constituição Federal.
O colegiado requer “prioridade absoluta” para o tratamento do caso, considerando a condição da vítima como criança e integrante de grupo historicamente vulnerabilizado, e que os órgãos competentes atuem para evitar a minimização ou relativização da violência, assegurando responsabilização rigorosa dos autores.
O Ministério Público também foi questionado sobre quais medidas já foram adotadas e quais providências adicionais serão tomadas para a apuração dos fatos, reforçando o compromisso do Estado com a erradicação da violência motivada por ódio e discriminação. No ofício encaminhado também à Defensoria Pública, a comissão reforça que sua atuação se dá no cumprimento da atribuição institucional de receber e encaminhar denúncias de violação de direitos humanos, cobrando providências dos órgãos competentes.
A presidente do colegiado, Camila Valadão (Psol), ressalta que “a violência sofrida pela adolescente, em tais circunstâncias, deve ser tratada com absoluta prioridade, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção especial de grupos vulneráveis, conforme determina a Constituição Federal e tratados internacionais ratificados pelo Brasil”.

A adolescente foi socorrida por um motorista de aplicativo e levada inicialmente ao Hospital Antônio Bezerra de Farias, em Vila Velha, sendo posteriormente transferida para o Hospital Infantil de Vitória, onde permanece internada em estado grave. As agressões ocorreram no último dia 10, quando a jovem foi abordada por indivíduos que passaram a proferir ofensas transfóbicas. Em seguida, ela teria sido colocada à força em um veículo, levada a uma rua escura no bairro Village do Sol, em Guarapari, onde foi violentamente espancada e teve fogo ateado contra o próprio corpo. Após o ataque, conseguiu pedir socorro.
O documento da comissão chama atenção ainda para o contexto estrutural de violência contra pessoas trans no Brasil. O texto menciona dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), que apontam o país como líder mundial em assassinatos de pessoas trans, e destaca que crimes motivados por identidade de gênero não podem ser relativizados ou invisibilizados.
Além da Associação Diversidade, acompanham o caso o Conselho Estadual LGBT, o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e o Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (Fonatrans).
Em nota pública, o Núcleo do Fonatrans Espírito Santo e o Fonatrans Nacional manifestaram “profunda indignação e revolta” diante do ataque. “É inadmissível que uma criança seja submetida a tamanha barbárie em nossas ruas. Transfobia é crime, equiparado ao racismo no Brasil, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal”, afirma o texto. A entidade cobra resposta imediata do Estado e destaca que a Polícia Civil e o Ministério Público precisam dar uma resposta breve, para que o crime não seja minimizado ou relativizado.
A presidente do Fonatrans, Jovanna Cardoso da Silva, conhecida como Jovanna Baby, afirma que a organização vai acionar o Estado para garantir que o caso tenha um tratamento “à altura da gravidade” e que sirva de exemplo. Segundo ela, há um padrão de negligência quando as vítimas são pessoas trans, negras ou periféricas.
Jovanna também critica o silêncio inicial das autoridades como preocupante. “Envergonha o Estado, uma vida ser tão maltratada dessa forma. Vamos cobrar providências, denunciar publicamente e, se não houver resposta, acionar a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] e o Ministério dos Direitos Humanos”, declara. A dirigente reforçou que a Polícia Civil precisa apresentar resultados concretos na investigação.
A PC informou, em nota, apenas que o caso foi registrado, inicialmente, na Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) e posteriormente tramitado para a Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Guarapari, onde segue sob investigação. “Por envolver menor de idade, o procedimento tramita sob sigilo, conforme previsto em lei”, finaliza.

