Perícia se opõe à proposta do governo e Polícia Civil aponta “corporativismo”

O Projeto de Lei Complementar (PLC) 26/2025, de autoria da gestão de Renato Casagrande (PSB), aprovado nessa quarta-feira (8) na Assembleia Legislativa e sancionado no Diário Oficial desta quinta-feira (9), é questionado pelo Sindicato dos Peritos Oficiais do Espírito Santo (Sindiperitos). A categoria aponta transferência de atribuições da Perícia para a Polícia Civil.
A proposta trata do requisito para ingresso na carreira de Oficial Investigador de Polícia (OIP) por meio de concurso público, e aponta atribuições do cargo. O Sindiperitos critica, porém, que algumas delas são da Perícia, como “investigações policiais com o fim de coletar provas para a elucidação de infrações penais e respectivas autorias”; realização de “Procedimentos de Identificação Criminal na forma da lei e dos regulamentos”; e “arrecadação de objetos de prova, instrumentos e produtos de crime”.
Outras atribuições que o sindicato enumera são “realizar a coleta de impressão palmar, digital e plantar, para fins cíveis e criminais, e de dados biométricos e antropométricos; realizar exame com apresentação de laudo investigativo em aparelhos eletrônicos após determinação do delegado de Polícia, com a aplicação de algoritmo hash ou similar, para a preservação da integridade, autenticidade e confiabilidade dos elementos informáticos; e confeccionar laudo investigativo, no caso de provas digitais provenientes de diálogos ou conversas, sem adulteração da prova”.
O presidente do Sindiperitos, Tadeu Nicoletti, afirma que essas atribuições ficam na Polícia Civil quando a Perícia ainda se encontra nessa corporação, não fora. “É algo que coloca em risco a resolução e crimes, pode promover anulação de provas que não tenham sido levantadas pela Perícia e coloca em risco a cadeia de custódia”, diz. Essa cadeia, explica o dirigente sindical, trata dos vestígios do crime desde a identificação até a manutenção e guarda, gerenciada pelos peritos “para que não haja contaminação da prova e anulação do processo”, sendo, portanto, “uma cadeia de proteção da prova”.

A Perícia se desvinculou da Polícia Civil em 2022, com a criação da Polícia Técnica e Científica. A iniciativa foi chancelada pela Assembleia Legislativa, com a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 04/2020. A categoria dos peritos oficiais, há mais de três anos, reivindicava autonomia.
Para Tadeu, a gestão de Renato Casagrande (PSB) trata a Perícia como se não fosse autônoma. A aprovação da proposta do Executivo vem se somar a outras insatisfações da categoria com a administração estadual. Os trabalhadores se queixam que a Perícia do Espírito Santo é a mais mal remunerada do Brasil e reivindicam o envio da proposta de estatuto para avaliação da categoria.
Em julho, a Casa Civil e a Secretaria Estadual de Gestão e Recursos Humanos (Seger) propuseram aos peritos um índice de 8% de reajuste salarial, considerado “medíocre” pelos trabalhadores. O índice, na análise de Tadeu, “continua afundando a Perícia no último salário do país”, e “está em desacordo com o compromisso que o governador assumiu”. Para ao menos se aproximar da média nacional, os peritos chegaram a apresentar uma proposta de aumentar o salário gradativamente, em quatro vezes de R$ 1,6 mil, sendo uma vez a cada seis meses, mas não houve êxito.
Nessa quarta-feira (8) o Sindiperitos se reuniu com o Núcleo de Controle da Atividade Externa Policial do Ministério Público do Espírito Santo (MPES) e pediu intervenção para garantia do diálogo com a gestão estadual. Além disso, defendeu uma ação civil pública (ACP) para pleitear uma política salarial que valorize a Perícia.
O diretor de Relações Institucionais do Sindicato dos Policiais Civis do Espírito Santo (Sindipol/ES), Humberto Mileip, contesta e afirma que não houve mudanças na redação, somente correção ortográfica. Para ele, a defesa de que somente os peritos podem fazer laudos é “corporativismo”, pois “não há conflito de atribuições”.

Humberto considera que a lei orgânica da Polícia Civil diz que “laudo investigativo é feito por um oficial investigativo, diferente de um laudo pericial”. O laudo investigativo, explica, faz por exemplo uma análise de dados, carecendo de um laudo dessa pesquisa com detalhamentos do que se construiu.
Sobre a mudança aprovada no projeto, ele relata que quando foi construída a lei de criação do oficial investigador de Polícia no Espírito Santo, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) recomendou que, para ingresso na carreira, fosse exigido somente bacharelado. A categoria concordou, afirma, por achar bacharelado uma formação “mais completa”. Contudo, com o concurso da Polícia Civil lançado este mês, a gestão estadual temeu pela possibilidade de pedidos de suspensão do certame, já que a lei nacional prevê a necessidade de curso superior, não excluindo, portanto, licenciatura e tecnólogo.