Sexta, 29 Março 2024

No Dia da Consciência Negra, Hartung anuncia a construção de mais um presídio 

No Dia da Consciência Negra, lembrado neste 20 de novembro, o governador Paulo Hartung, contrariando os movimentos sociais e de Direitos Humanos, anunciou a construção de mais um presídio no Estado. Com uma superpopulação carcerária com mais de 22 mil presos, o Espírito Santo, assim como os demais estados, encarcera em sua maioria negros, sendo esse recorte racial quase 80% do total dos detentos. Essa é também mais uma obra anunciada no "apagar das luzes" da atual gestão, ampliando os gastos para o novo governador eleito, Renato Casagrande (PSB). 


De acordo com informações do próprio site do governo do Estado, a nova unidade prisional será construída no Complexo do Xuri, em Vila Velha, e contará com 800 vagas. Será destinada a detentos condenados ao regime fechado.


“O governo Paulo Hartung nunca negou que a sua política voltada à juventude negra é a cadeia ou caixão. Criminalizar e prender. Matar ou deixar matar. Isso fica mais nítido com esse anúncio feito justamente no dia 20 de novembro”, afirmou o coordenador do Círculo Palmarino, entidade do movimento negro capixaba, Lula Rocha. 



Ao saber do evento de lançamento do edital para construção de uma nova unidade prisional, militantes que participavam de uma programação no Museu do Negro (Mucane), no Centro de Vitória, se dirigiram para um protesto na calçada do Palácio Anchieta, onde, a partir das 16h30, transcorria uma coletiva de imprensa para anunciar a obra. Os portões foram trancados após a entrada de convidados e jornalistas. 


Encarceramento negro 



Dados do  Departamento Penitenciário Nacional (Depen), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública de julho deste ano, indicaram que os detentos capixabas são, em sua maioria, jovens: 30% de 18 a 24 anos; 25% de 25 a 29 anos e 15% de 30 a 34 anos. E a maior parte, negros, um percentual de 78%. 


“Esses dados indicam que há um sistema de segregação no País e no Espírito Santo. Esses presos, em sua maioria, são pobres e moradores de periferias, com mais dificuldade de acesso à Justiça por suas condições econômicas, dependendo da Defensoria Pública, que tem seu quadro defasado”, ressaltou o militante do Movimento Nacional de Direitos Humanos e membro do Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra (CDDH), Gilmar Ferreira,



Ele completa: “O governador faz o que os empreiteiros querem: construir presídios!  Ele fecha o seu terceiro mandato consolidando uma política que marcou suas gestões: construir presídios e fechar escolas. É triste que no dia da Consciência Negra, no exato momento em que a juventude negra está na rua pedindo mais políticas públicas, lutando para continuarem vivos, o governador e seus aliados dão mais um sinal que dispersa essa população e faz aumentar a categoria dos matáveis. A opção do governador é  pelo encarceramento em massa”, concluiu. 


A notícia da construção de um novo presídio deixou perplexa também a presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH), Deborah Sabará. “Não fomos convidados para este evento nem comunicados sobre essa decisão, que recebemos com perplexidade no dia em que estão em discussão as questões raciais no Brasil. Sabemos que a maioria da população carcerária é negra. Nós não queríamos mais unidades prisionais neste modelo; queríamos um outro de unidade, de uma forma diferente. Uma grande escola penitenciária com cursos técnicos, queríamos que algo fosse construído nesse sentido”, lamentou Sabará. 


Atualmente, o Espírito Santo tem 22, 1 mil detentos nos regimes fechado, semiaberto e presos provisórios (que ainda não foram sentenciados), de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os presos estão dispostos em 35 unidades prisionais superlotadas, com um déficit aproximado de 8,2 mil vagas. 


Relatório da Defensoria



Em julho deste ano, a Defensoria Pública do Espírito Santo (Depes) divulgou um relatório com dados sobre o sistema prisional capixaba que surpreendeu pela consistência dos dados e também pelas flagrantes violações de direitos patrocinadas pelo próprio governo do Estado. Elaborado pela equipe do Núcleo de Execução Penal da Defensoria Pública (Nepe) com base em inspeções realizadas nos últimos cinco anos (2013 a 2018), as “Observações Gerais sobre a Execução Penal no Espírito Santo" revelam também que ampliar o aprisionamento nunca será a solução para reduzir a criminalidade. 


“Acreditar que a solução para a questão prisional é a construção de mais presídios é um raciocínio que tem se mostrado falho. Sustentar essa tese implica na inobservância da garantia de direitos, do bom uso da verba pública e, mais pragmaticamente, sequer se mostra como uma real solução. Vultosas cifras foram, são e serão gastas para manutenção de um sistema comprovadamente falido e que não mais se sustenta em outros países”, disse os defensores no relatório. 


“Por esse motivo, diversos países estão criando políticas para reduzir as taxas de superencarceramento. “EUA, China e Rússia, os três únicos países que encarceravam mais pessoas que o Brasil, reduziram suas taxas entre 2008 e 2014. Todavia, nesse mesmo período, a taxa de aprisionamento brasileira cresceu 33%7 , fazendo com que hoje o Brasil se situe no pódio dos países que mais encarceram, tendo ultrapassado a Rússia. Nesse contexto, o estado capixaba, mesmo com a construção de novas unidades prisionais, vem enfrentando – novamente – problemas estruturais e um quadro de superlotação dos presídios”, aponta o relatório da Defensoria, que ressalta a necessidade de mudança de mentalidade da Justiça e do Ministério Público, ainda centrada na prisão”, disse à época o defensor Daniel Cardoso dos Reis ressaltou. 


O Espírito Santo é o segundo estado onde a população carcerária mais cresce. Apenas neste ano, o número de presos cresceu uma média de 5%, passando de 20,8 mil para 21,8 mil presos; desse total, cerca de 60% são condenados, alvo do relatório. Atualmente, a taxa de encarceramento do Espírito Santo atinge 543 presos a cada 100 mil habitantes, alçando-o a um dos Estados que mais encarcera no Brasil.

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