Sábado, 04 Mai 2024

Em audiência pública na Câmara de Vitória, especialistas apontam riscos da Reforma Trabalhista

Em audiência pública na Câmara de Vitória, especialistas apontam riscos da Reforma Trabalhista

O Plenário da Câmara de Vereadores de Vitória recebeu, na noite desta segunda-feira (19), uma audiência pública que discutiu o Projeto de Lei 38/2017, conhecido como Reforma Trabalhista, que representa riscos a direitos adquiridos pelos trabalhadores. A audiência, proposta pelo vereador Leonil Dias (PPS), teve a participação do juiz titular da 3ª Vara do Trabalho de Vitória, Marcelo Tolomei Teixeira; do procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), João Hilário Valentim; do presidente do Sindicato dos Auxiliares de Administração Escolar do Estado (SindEducação-ES), Edson Gomes Soares; e da professora Márcia Machado, secretária-geral da Central dos Trabalhadores do Brasil no Estado (CTB-ES).
 
O juiz Marcelo Tolomei fez uma contextualização do direito do trabalho no País para mostrar que a precarização trabalhista esteve e está presente atualmente na vida dos brasileiros. Ele usou quatro períodos históricos para demonstrar que a precarização sempre existiu.
 
Durante o governo de Getúlio Vargas, o primeiro momento das leis trabalhistas, não houve a concessão dos direitos, mas a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) em cima de direitos dos trabalhadores que já vinham sendo reivindicados. Apesar disso, houve um momento de precarização, já que o período do governo coincidiu com a II Guerra Mundial e, nesse momento havia os “soldados da borracha”, que saíam do Nordeste do País para o Norte para extrair látex das seringueiras. Era um momento econômico muito ruim e os trabalhadores viviam em condições extremamente precárias.
 
Do ponto de vista trabalhista, esse momento também teve as precarizações trabalhistas, porque o País vivia uma situação de Economia de Guerra, com uma série de perdas de direitos, com alguns trabalhadores que sequer poderiam deixar seus empregos sem pedir permissão para o governo; terrível extensão da jornada, sem pagamento de extra; impossibilidade de dissídio coletivo.
 
No período da ditadura militar, no governo do general Castelo Branco surgiu o instituto do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e, antes dele, o da Estabilidade Decenal – depois de dez anos de trabalho, o empregado só poderia ser mandado embora por justa causa. Quando a estabilidade começou a ser questionada – os empresários diziam que “engessava” o trabalhador – acabou-se com a estabilidade, sob a alegação que os trabalhadores poderiam optar por um desses dois institutos no momento da contratação, mas os empregadores tiravam a opção da estabilidade da equação, ou não contratariam.
 
O magistrado fez um contraponto com o que defendem hoje os neoliberais com a reforma, ou seja, que haverá livre negociação. “Nós temos um DNA histórico que demonstra o que é essa livre opção. O FGTS já mostra o que foi a livre opção nos nossos institutos trabalhistas. Não havia a livre opção coisa nenhuma”, disse ele, acrescentando que, na época também havia salários congelados e uma lei de greve que impossibilitava que elas fossem feitas.
 
Durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, nos anos 1990, houve também um ataque para flexibilizar as leis trabalhistas. “Vocês já devem ter ouvido falar que a CLT é um dinossauro e uma coisa antiga, mas já tivemos uma série de ‘modernizações’ em favor do capital”, lembrou o juiz, enumerando dentre essas supostas modernizações o contrato de trabalho por tempo determinado, suspensão do contrato de trabalho e a “pejotização” – termo usado para se referir à contratação de serviços pessoais, exercidos por pessoas físicas, de modo subordinado, não eventual e oneroso, realizada por meio de pessoa jurídica constituída especialmente para esse fim, na tentativa de disfarçar eventuais relações de emprego.
 
O banco de horas foi um dos exemplos dados para essa flexibilização de jornada. Sem a Reforma Trabalhista há um sindicato para fiscalizar a questão, mas, no texto da figura, o sindicato sai de cena, restando apenas a vontade do trabalhador. “Sem o sindicato, o banco de horas flexibiliza a jornada em favor da empresa”, concluiu Tolomei.
 
Atualmente, no governo do presidente Michel Temer surgiu a Reforma Trabalhista, de iniciativa do executivo, em que há varias possibilidades de redução nos direitos, relativizando essas garantias. Como caso do fim da jornada de percurso, o tempo que o trabalhador leva para chegar ao trabalho, que entra como jornada e deve ser paga. Com a reforma, o a jornada de percurso de locais não deverão ser pagas. Existem outros pontos que precarizam ainda mais as relações de trabalho, como o caso das trabalhadoras grávidas que trabalham em áreas insalubres. Atualmente, essas trabalhadoras são afastadas, já com a reforma, a não ser que seja insalubridade em grau máximo, será preciso um atestado médico.
 
“Infelizmente, essa Reforma Trabalhista não vem atender a uma realidade, não garante que vai ter emprego”. Tolemei apontou que uma pesquisa que a própria Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) fez não garantiu que haveria empregos com a reforma. “O próprio empresariado não garante que com a reforma vai haver emprego. A situação é mais complexa do que realmente pensamos”, disse o juiz.
 
O procurador do MPT, João Hilário Valentim, ressaltou que a sociedade está diante de uma reforma que começou há seis meses e que nem ao menos foi discutida com os movimentos sociais.
 
Valentim também afirmou que o grande risco que há em deixar aprovar a reforma é a dificuldade que o País terá em rever o marco normativo. Como exemplo ele lembrou que na Assembleia Constituinte de 1988, a reivindicação dos trabalhadores, à época, era de jornada de trabalho de 40 horas semanais, ante a jornada de 48 horas. O marco normativo naquele momento ficou em 44 horas e, desde então, não é modificado, apesar das tentativas.
 
Segundo ele, a situação é tão delicada que o Senado atuou em uma de suas comissões ao contrário dos interesses da própria instituição, que é de propor legislação. “O Senado está abrindo mão de fazer modificação no texto, embora se reconheça nas suas comissões que esse texto contém problemas graves, e transferindo isso para um dos autores da proposta [o executivo] sob o argumento de que esse autor vai fazer a modificação para depois encaminhar medida provisória”.
 
Visão dos trabalhadores
 
O presidente do SindEducação, Edson Gomes Soares, afirmou que o debate é importantíssimo e reflete sobre o prejuízo para milhões de trabalhadores. “Como se quer passar com um rolo compressor um governo ilegítimo. Nós temos, também, uma bancada de covardes, que não atentam para a vontade da sociedade”.
 
Ele acrescentou que esse grupo pequeno quer passar por cima do desejo daqueles que os elegeram e que, na verdade, não representam a sociedade. “O interesse do capital está sendo muito bem representado por esses senhores, que têm passado por cima de tudo aquilo que nós levamos anos para ter”.
 
Já a professora Márcia Machado ressaltou que a reforma é um ataque aos direitos dos trabalhadores. Ela lembrou que o processo de negociação se baseia em achar o limite daquilo do que se pode aceitar e o limite que o empregador consegue dar. “Nós sabemos que o processo negocial está sempre no patamar mínimo e a lei é um organismo vivo”.
 
Ela também disse que a bancada capixaba do Senado não representa a sociedade, lembrando que 95% da população rejeita a Reforma Trabalhista.



Rejeição



O relatório do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) da Reforma Trabalhista foi rejeitado na sessão da Comissão de Assuntos Sociais (CAS) por 10 votos contrários e nove votos a favor da matéria. O parecer aprovado pela comissão, nesta terça-feira (20), foi o voto em separado do senador Paulo Paim (PT-RS) e que pede a rejeição integral do texto. A matéria agora segue para Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), e já na quarta-feira (21), deverá ser lido o relatório de Romero Jucá (PMDB-RR) e os prováveis votos em separado da oposição.



Com críticas ao projeto, Paulo Paim afirmou que o texto é uma “traição ao povo brasileiro”, pois o governo tenta “vender o céu” com uma proposta que não vai gerar emprego nem aumentar as contratações formais e só vai beneficiar o grande empregador. “Essa reforma é um cavalo de troia sim, bonito por fora e por dentro tem uma bomba que vai explodir com a vida do povo brasileiro. Faço um apelo aos senadores e senadoras, com todo o carinho que tenho por cada um deles, vamos rejeitar esse projeto aqui, é a única forma de conseguir um acordo. Rejeita aqui, ele vai para a CCJ e lá poderemos construir um acordo que evite tudo que dissemos aqui”, disse Paim.



A base governista perdeu três votos favoráveis à matéria, o senador Otto Alencar (PSD-BA), contrário à reforma, votou como suplente de Sérgio Petecão (PSD-AC), que estava ausente; Helio José (PMDB-DF) e Eduardo Amorim (PSDB-SE) foram os outros dois votantes que garantiram a rejeição do texto.

Veja mais notícias sobre Sindicato.

 

Comentários:

Nenhum comentário feito ainda. Seja o primeiro a enviar um comentário
Visitante
Sábado, 04 Mai 2024

Ao aceitar, você acessará um serviço fornecido por terceiros externos a https://www.seculodiario.com.br/