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As bruxas estão soltas

Mara batalhou para chegar onde chegou. E para se manter no topo, tem que se esforçar mais que os seis homens que participam com ela das reuniões da diretoria. E só dois são filhos do dono. Tivesse ele 7 filhos, a empresa já teria falido. Mara faz as contas: tem mais diplomas, mais tempo de empresa, e sempre apresentou melhores resultados que os seis juntos. Chamam a isso de igualdade dos sexos. 
 
Quando, há dois anos, seu nome foi anunciado como o novo membro da diretoria, foi imediatamente cognominada de Bruxa. Não abertamente, claro. Mas sabe que em sua  ausência, ninguém se refere a ela como a diretora de marketing, ou a colega Mara. Até as mulheres, que deviam se orgulhar quando uma delas consegue superar os obstáculos e chegar na frente. Minha pista sempre teve mais obstáculos que a dos outros, lamenta Mara.
 
Na vida real, homem mandando nos outros é chamado de doutor, mulher é chamada de bruxa, megera, caninana. Não é de hoje e não vai mudar amanhã.  Remonta às histórias infantis transmitidas oralmente desde tempos antigos. A donzela devia ser dócil e frágil, precisando de  um homem – príncipe ou mocinho – para se livrar das situações complicadas. As independentes eram bruxas.
 
 Se conseguiam se virar sozinhas era porque tinham parte com o demo. Cleópatra, Maria Antonieta, Ana Bolena, Marquesa de Santos e outras mais foram odiadas e injustiçadas, e entraram para a História como bruxas. Erraram, pecaram, usaram influências para subir ou sobreviver na vida, tal e qual os homens com quem conviveram. No entanto, esses levaram as coroas de louros, enquanto elas – as bruxas – acabaram mal. Ou talvez por isso mesmo.
 
A Marquesa de Santos foi desprezada, humilhada e condenada ao  ostracismo. E ainda deu sorte. Das outras três, duas foram decapitadas, uma se suicidou. Cleópatra lutou pelo trono que lhe cabia, e se os romanos dominavam, juntou-se a eles com as armas que tinha. Se o grande César, um dos quatro maiores guerreiros da história, foi “induzido’ a se posicionar contra os interesses romanos, é porque Cleópatra era bruxa. Ele, o herói indefeso.
 
O mesmo para Ana Bolena, que a história registra como a malvada que levou Henrique VIII a praticar atos nefandos, mesmo se ele casou oito vezes, mandou decapitar duas e talvez envenenado duas mais. Mesmo odiada, o povo entendeu que a morte de Ana, o irmão e dois amigos, não teve bases concretas. Também odiada pelos franceses, Maria Antonieta foi mais vítima que algoz, e nunca mandou o povo comer brioches.
 
Embora os tempos sejam outros, e já não existam monarcas absolutos (sic), Mara vive sempre no temor de ser também decapitada. Não literalmente, claro. Vive na berlinda, e mesmo se esforçando mais que os outros seis, qualquer deslize será, Vupt – Cortem-lhe a cabeça! Se tal acontecer, mesmo nesses tempos de igual-para-todos, a chance de outra mulher tomar seu lugar é de apenas 30%. 

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