É impressionante a capacidade de abstração do senador Ricardo Ferraço (PSDB) em relação à decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que na última sexta-feira (9) absolveu a chapa Dilma-Temer e livrou o presidente da República de um processo de cassação do mandato.
No Twitter, o senador replicou a frase do ministro Herman Benjamin (“Eu , como juiz , recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar do velório, mas não carrego o caixão!”) para manifestar toda a sua indignação com a decisão. Em seguida, tuitou: “Essa frase do min não me sai da cabeça ao ver essa decisão inacreditável do TSE”.
É preciso alertar o senador que depois das delações da Odebrecht e das listas de beneficiados no esquema de “caixa 2”da empreiteira um número cada vez mais seleto de políticos pode sair apontando o dedo livremente para supostos envolvidos em esquemas ilegais.
É dificil de entender toda essa indignação do senador. Parece até que seu nome nunca foi mencionado no âmbito da Lava Jato. Os fatos põem o discurso de Ricardo Ferraço em contradição. O ex-executivo da Odebrecht, Sérgio Neves, disse que fez quatro pagamentos de R$ 100 mil à campanha vitoriosa de Ricardo ao Senado em 2010. No vídeo que embasa o inquérito aberto contra o senador, o delator afirma que se reuniu pelo menos duas vezes com o “Duro”, codinome que identificava Ricardo na lista de “caixa 2” da empresa.
Indignação à parte, porque o senador não está numa posição tão confortável para fazer ataques, Ricardo tenta mesmo desvincular a Reforma Trabalhista do presidente Temer. Relator da reforma na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, Ricardo Ferraço vem trabalhando com afinco para promover a reforma e dissociá-la de Temer.
O senador tenta convencer a sociedade que a reforma é do Brasil e não do presidente. Ele se esforça para transformar em refrão a narrativa de que só a reforma é capaz de devolver a esperança aos mais de 14 milhões de desempregados espalhados pelo país.
O discurso do senador — que já ganha ressonância na classe empresarial capixaba e tem o apoio do governador Paulo Hartung (PMDB) — procura agora conquistar a sociedade. Ricardo Ferraço sabe, porém, que essa aposta só poderá dar resultado se estiver completamente desvinculada de Temer. Por isso ele defende de maneira tão eloquente que o PSDB desembarque imediatamente do governo e lamenta com tanta indignação a decisão do TSE que absolveu Temer.