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Caparaó, I love you

Na última reunião geral da FAO, em Roma, dias atrás, foi lançado o livro Compreendendo os Solos de Montanha, que chama a atenção da humanidade para as terras altas, geladas ou não, responsáveis pela coleta da água consumida por mais da metade da população mundial.
 
Livro bem pensado pois, até agora, a humanidade se preocupou principalmente com rios, vales, várzeas e manguezais, como se as montanhas e suas encostas tivessem menor importância agrícola e ecológica.
 
Editado em conjunto com a Universidade de Turim, o livro oferece uma perspectiva técnica de gestão sustentável desses solos geralmente mal usados e cujas populações costumam ficar isoladas pela distância e pela falta de infraestrutura viária. Segundo o livro, chega a 900 milhões o número de habitantes de áreas de montanha. Pouco menos de 15% da população da Terra. São guardiões de um patrimônio fundamental.
 
Os habitantes das montanhas pouco se comunicam com as massas concentradas em regiões planas e nos litorais. Pense, por exemplo, no Caparaó, a maior montanha do Espírito Santo, na divisa com Minas e o Rio de Janeiro. Bom lugar para se esconder ou iniciar um foco guerrilheiro, como pensaram alguns dissidentes dos militares em 1965. Claro que não deu certo. Até hoje mora pouca gente por lá. Por isso permanece um lugar preservado. E valorizado ecologicamente nesse momento de mudanças climáticas.
 
Há outros pontos de montanha, como Afonso Claudio, que tiveram suas matas devastadas para a retirada de madeira e o plantio de café. Em outros lugares boa parte da floresta deu lugar a plantações de pinus e eucalipto, mas não se conhecem senão estudos pontuais sobre o impacto do desmatamento (ou do chamado reflorestamento, um termo inapropriado para monoculturas arbóreas) no regime das águas da mata atlântica.
 
É verdade que o Espírito Santo foi um dos últimos trechos desmatados da mata atlântica mas, quando o machado começou a cantar do norte fluminense ao sul da Bahia, os tabuleiros e as encostas capixabas perderam em poucas décadas um tesouro madeireiro. Boa parte foi usada na construção de Belo Horizonte, na expansão de Copacabana e na loucura de Brasília. O melhor foi exportado para a Europa. E o resto foi queimado nas locomotivas dos primeiros anos do século XX. É uma história que só foi contada superficialmente. Veja-se, a propósito, o clássico O Desbravamento das Selvas do Rio Doce (1959), do engenheiro Ceciliano Abel de Almeida, que comandou a implantação da Estrada de Ferro Vitória a Minas.
 
Voltando às montanhas: segundo os cientistas e as autoridades agrícolas, as terras de altitude constituem “as frágeis fundações dos ecossistemas”. Na apresentação do livro, fala-se do cultivo de quinoa nos Andes, das estações de esqui européias e do cultivo de plantas medicinais no “teto do mundo”, a cordilheira de Pamir no Paquistão. Uma folheada no volume de 160 páginas revela que os autores se preocuparam com a Africa, os países andinos, Asia e Europa.
 
Natural que tenham esquecido o Caparaó, a Mantiqueira e outras áreas montanhosas do Brasil. Afinal, para os europeus, o Brasil é só praia e Amazônia. E olhem que o diretor geral da FAO é o agrônomo brasileiro José Graziano da Silva, que se destacou, desde jovem, pela preocupação com os pobres do campo, particularmente os trabalhadores rurais volantes, os chamados bóias-frias.
 
LEMBRETE DE OCASIÃO
 
“Os solos de montanha são particularmente susceptíveis às mudanças climáticas, à deflorestação, às práticas agrícolas não sustentáveis e aos métodos de extração de recursos que afetam a fertilidade, provocam a degradação da terra, a desertificação e os desastres como inundações e deslizamentos de terra, o que leva à pobreza”.
 
José Graziano da Silva, diretor geral da FAO, no prefácio do livro Compreender os Solos de Montanha

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