Compraram carro novo, o que deveria ser um evento alvissareiro e positivo em qualquer família. Mas no lar dos Deluses foi uma desilusão, porque o Sonata agora estacionado na porta não é a Mercedes branca conversível que o filho queria. Idade do menino? Sete anos. De acordo com a fabricante, o Sonata ‘quebra a monotonia com um estilo arrojado’, mas o menino acha uma Mercedes muito mais arrojada.
Acaba acostumando, diz Vivina, a mãe realista. O pai, no entanto, fica preocupado, Será que o garoto vai ficar traumatizado? Vivina conta a história da boneca que um dia enfeitou a única vitrine da única loja de sua cidade natal. De porcelana, olhos azuis que abriam e fechavam, longos cabelos cacheados. E um vestido de veludo vermelho só usado pelas princesas dos contos de fada.
A loja ficava no trajeto casa-escola, e Vivina perdia horas na frente da vitrine todos os dias, esquecida do almoço, namorando aquela maravilha tão distante de sua realidade. E toda noite rezava fervorosamente, pedindo a Deus, aos santos, ao Papai Noel… No Natal ganhou uma feia boneca de celuloide, com braços e pernas estáticos. Feito do mesmo material, o cabelo era parte do todo, e os olhos imóveis eram pintados. O vestido era de papel crepom.
Na primeira noite esqueceu do lado de fora e a boneca derreteu na chuva. A princesa de porcelana também desapareceu da vitrine, provavelmente a única menina rica da cidade sabia uma reza mais forte. Não ficou traumatizada por isso, e hoje vive feliz com o que tem. É só olhar as estatísticas, tem muito mais gente atrás do que na frente, e olha que a fila é longa.
As bonecas existem desde tempos remotos, no princípio feitas de barro ou de madeira. Bonecas foram encontradas em túmulos de crianças no Egito, em Roma e na Grécia antigas. E todas as culturas tiveram bonecas de pano, cabelos de fios de lã, olhos de botão ou apenas um X feito com linha preta. Como nossa Emília. Que menina não teve uma avó ou duas tias que lhe confeccionaram uma delas? Aí veio a Barbie, e tudo mudou.
Também o celuloide tem sua história. No final do século XIX a procura por marfim estava – e infelizmente ainda está – acabando com os elefantes. Um fabricante americano de bolas de bilhar de marfim ofereceu um prêmio de 10.000 dólares a quem criasse um produto que substituísse o marfim. Um certo John Hyatt criou o celuloide e abocanhou o prêmio.
O produto acabou não dando certo para fazer bolas de bilhar, por ser muito quebradiço, mas fazia muitas outras coisas, como bolas de ping-pong e bonecas que derretiam na chuva. Mas sua maior aplicação foi nas indústrias fotográfica e cinematográfica. O menino de sete anos não se consola com tais histórias, e diz que quando crescer vai ter sete carros de luxo na garagem, como o LeBron James.