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Deus e o governo tudo podem

Era uma estrada muito movimentada, indo de algum lugar para qualquer outro, seus motoristas na pressa de vencer a distância sem prestar atenção nos lugarejos que passavam por eles, onde os  moradores viviam reclamando da poeira no verão e da lama no inverno. Em um desses pequenos pontos que nem aparecem nos mapas, morava um velho que um dia se cansou de reclamar também. Deus e o governo têm mais o que fazer, pensou, e pacientemente começou a calçar, com pedras que ele mesmo cortava, o trecho de estrada na frente de sua casa. O lento e exaustivo trabalho durou anos.
 
Os vizinhos vinham assistir, debochando da labuta inútil de um velho já no final da vida. “O que adianta calçar apenas um pequeno trecho de uma estrada tão longa? Perguntavam com aparente desdém. “Se todos fizessem sua parte…” respondia o velho, sem se preocupar em  interromper seu trabalho e com a paciência comum aos velhos que já não esperam muito da vida,. “Temos mais o que fazer,” rebatia um, mal humorado. “Não é nossa obrigação; para quê, afinal,  pagamos impostos?” respondia outro. 
 
“As estradas são de responsabilidade do governo”, completava um terceiro. O velho não lhes dava atenção, e continuava seu trabalho. Governo para ele era algo tão intangível quanto o próprio Deus. Mas se o governo esqueceu dele, Deus, ao contrário,  lhe permitiu viver uma longa vida, para que conseguisse completar seu trabalho. A frente da casa foi toda pavimentada, e os vizinhos vinham se sentar à sua porta, porque nas noites quentes de verão ali não tinha poeira, e na época das chuvas  os carros que passavam não jogavam lama em cima deles. 
 
O velho morreu de velho, o tempo passou. Os vizinhos se mudaram ou morreram também, outros ocuparam suas casas. Todos esqueceram quem havia se dado ao trabalho de pavimentar aquele pequeno trecho de estrada, único no lugarejo. E os novos vizinhos reclamavam, “Por que essa casa ganhou mais benefícios que as nossas? Também pagamos impostos.” Ao que algum outro respondia, “Com certeza algum afilhado de algum figurão morava ali!” 
 
Também os viajantes que passavam apressados, cansados da lama e da poeira da estrada, reclamavam: “Por que não terminam o serviço? Nesse país é assim, tudo fica pela metade.” Moral da história: a)  O velho ia morrer de qualquer jeito; b) Deus e o governo têm mais o que fazer; c) Quem espera não alcança, mas também não cansa.

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