É longo o histórico do favoritismo no Brasil, para não fugir à regra planetária relatada a partir dos tempos bíblicos, ou seja, desde que o mundo é mundo, possibilitando a abertura de brechas para a prática de ilegalidades e de crimes mais graves na administração pública.
Para nós, espectadores neste exato momento de centenas de atos dessa natureza encarados com uma naturalidade de doer, vale uma reflexão sobre como começou em nosso território, hoje nem tanto, esse negócio de troca de favores, o popular “toma lá, dá cá” largamente praticado e com destacada maestria nos círculos de poder.
É a história que segue, a partir de fatos registrados desde o “achamento” pelos portugueses da faixa de terra hoje conhecida por Brasil, que eles divulgaram como descobrimento, nos idos de 1.500, certamente por entenderem que os moradores daqui não eram gente, como acontece ainda hoje, que o digam os invasores de aldeias indígenas e quilombolas para implantar projetos industriais erguidos com desassossego dos outros, milhões de outros.
Na carta do “descobrimento” do Brasil, Pero Vaz de Caminha, que passou à frente do escrivão oficial da frota, Gonçalo Gil Barbosa, relata ao então rei de Portugal, Dom Manuel, detalhes da viagem e as belezas da nova terra. Ao final do documento, ele pede, e foi atendido, que seu genro, Jorge de Osório, fosse libertado do exílio por ter roubado uma igreja e ferido um sacerdote. Está aí o exemplo inicial.
No Estado, a história é repleta desses casos, desde os tempos de Jerônimo Monteiro, considerado um grande gestor público, passando pelas gestões impostas na ditadura militar, até a ONG ES em Ação, abrigo da elite empresarial capixaba em décadas mais recentes. Bem recente, o “acordão” da Assembleia com o Ministério Público do Espírito Santo, nesse mês, é exemplo crasso de favoritismo casado, com ampla possibilidade de estender-se por meio dos cargos comissionados a serem criados.
No plano nacional, situação é vexatória e tende a piorar com a indicação do filho 03 para a Embaixada do Brasil nos Estados Unidos, entre centenas de casos de favoritismos com a marca da ilegalidade, vistos com uma naturalidade que os levam a ser aceitos perante a opinião pública.
Mais grave ainda, o ex-juiz Moro, ministro da Justiça por puro favoritismo, comandar a Polícia Federal que deveria investigar, mas não o faz, ilegalidades em que ele está envolvido até o pescoço. Muito já se falou sobre esse assunto, sem excluir este espaço, mas a revelação de novos fatos estampados em redes sociais e na imprensa descomprometida com o corporativismo familiar e empresarial não deixa margem para suprimi-lo.
Vale ressaltar que favoritismo, ilegalidades e criminalidade corporativa são temas de trabalhos científicos. Os pesquisadores se detêm, inicialmente, em uma abordagem individual, a fim de depurar a origem dos fatos e a forma como foram registrados na história. O resultado é decepcionante, pois a aceitação das ilegalidades é possibilitada por meio de estratégias de manipulação das massas.
Um quadro que sofre profundas alterações na modernidade: por meio de sites e blogs, as redes sociais põem a descoberto o que a imprensa corporativa pretende esconder e revela a verdadeira face dos falsos heróis. Sergio Moro personifica a comprovação maior dessa afirmativa.