Segunda, 17 Junho 2024

​Imunidade parlamentar e desinformação

A recente proposta de estender a imunidade parlamentar ao ambiente digital, conforme o Projeto de Lei 2630, conhecido como PL das Fake News, levanta sérias questões sobre os limites da liberdade de expressão e a responsabilidade dos políticos no combate à desinformação. A Constituição Federal do Brasil, em seu artigo 53, protege deputados e senadores de ações civis e penais por suas opiniões, palavras e votos. Essa proteção, essencial para o exercício livre das funções legislativas, agora enfrenta um novo teste no contexto das redes sociais.

A inclusão da imunidade parlamentar no projeto de regulação das plataformas digitais tem gerado indignação entre organizações da sociedade civil. A preocupação central é que essa medida possa incentivar as plataformas a abandonar qualquer tentativa de moderação dos conteúdos postados por políticos, temendo repercussões jurídicas e econômicas. Esse cenário poderia criar um ambiente propício para a disseminação de desinformação, especialmente quando os políticos usam suas redes para influenciar a opinião pública.

Lideranças políticas frequentemente desempenham um papel central na amplificação de narrativas distorcidas e informações falsas. A extensão da imunidade para o ambiente digital pode exacerbar esse problema, ao fornecer uma espécie de escudo protetor para a disseminação de conteúdos prejudiciais. A desinformação não é apenas um problema de integridade política, mas também uma ameaça ao processo democrático e ao debate público informado.

O Supremo Tribunal Federal (STF) já se manifestou sobre os limites da imunidade parlamentar. O ministro Alexandre de Moraes destacou que essa proteção só se aplica a manifestações diretamente relacionadas ao desempenho da função legislativa. Atividades ilícitas, como a propagação de desinformação, não estão cobertas por essa imunidade. No entanto, a aplicação prática dessa distinção no ambiente digital permanece incerta e complexa.

A regulação proposta também impede que políticos eleitos restrinjam a visualização de suas publicações nas redes sociais. Essa medida visa garantir a transparência, mas pode ter o efeito contrário de permitir que informações falsas se espalhem sem controle. A transparência é vital, mas deve ser equilibrada com mecanismos eficazes para combater a desinformação.

A questão de fundo é se a imunidade parlamentar deve ser estendida ao ambiente digital sem restrições. A proteção das funções legislativas é decisiva, mas não pode ser um salvo-conduto para a irresponsabilidade informativa. A responsabilidade deve ser uma via de mão dupla, onde a liberdade de expressão é acompanhada de um compromisso com a veracidade e a integridade da informação.

As plataformas digitais, por sua vez, enfrentam um dilema. Ao moderar o conteúdo postado por políticos, correm o risco de serem acusadas de censura e de enfrentar sanções legais. Porém, ao não moderar, tornam-se cúmplices na disseminação de desinformação. O equilíbrio entre liberdade de expressão e responsabilidade digital é delicado e exige uma abordagem cuidadosa e criteriosa.

A discussão sobre a imunidade parlamentar no ambiente digital reflete um desafio maior: como garantir um debate público saudável em uma era de informação desenfreada? A imunidade parlamentar não pode ser uma carta branca para a propagação de mentiras. É necessário encontrar um ponto de equilíbrio, em que a proteção constitucional conviva com a responsabilidade de manter um espaço informativo saudável e verídico.


Flávia Fernandes é jornalista, professora e autêntica "navegadora do conhecimento IA"
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