Dina anda sozinha pelas ruas lotadas, ouvindo músicas suaves falando em confraternização, tropeçando nas pessoas sorridentes sobrecarregadas de embrulhos e sacolas coloridas. É dando que se recebe, grita um alto falante ali perto, e todos se apressam, aproveitando os últimos momentos de lojas ainda abertas para mais compras. O mundo se enche de alegrias e esperanças, pois o Natal é sempre cheio de surpresas.
Dina não tem a quem presentear ou quem a presenteie. Tanta coisa bonita, tantas promoções tentadoras, e caminha de mãos vazias – não tem um amor, um amigo, nenhum parente próximo ou distante, nem mesmo uma vizinha também solitária… Nem festa de confraternização no trabalho, com direito a Amigo X ou Y, o que seria uma forma de se envolver no clima natalino…
A empresa em que trabalha é de muçulmanos, onde todos ignoram o Natal. A cada dezembro promete a si mesma que no ano seguinte muda de emprego, vai trabalhar em algum lugar onde todas as escrivaninhas se enfeitam com árvores de papel reciclado, guirlandas de plástico, gordos papai-noels de feltro. Mas com festas e presentes de verdade, mesmo que inúteis.
Volta janeiro e a vida volta ao normal; Dina esquece. Talvez nos doze meses seguintes algum milagre aconteça – um amor, uma amiga, outra alma também solitária que se mude para o mesmo prédio ou venha trabalhar na mesma empresa. Ou alguém com quem esbarre por acaso no supermercado ou no estacionamento de um shopping…
A grande loja superlotada anuncia promoções imperdíveis – tudo com 75% de desconto! Precisa encher o tempo para não ver o tempo passar… entra, olha, escolhe. Compra um perfume e manda embrulhar para presente, mesmo que para si mesma. Compra uma gravata que não vai usar, claro, mas vem em uma bonita caixa colorida, que vai ficar linda em baixo da pequena árvore armada na sala.
Chegando no edifício acorda o vigia que ronca na portaria. Ele trabalha ali há vinte anos e Dina raramente lhe dirigiu a palavra. Mas é Natal e está sozinha no mundo, não custa lhe desejar boas festas… Ele agradece risonho e diz que vai ter um bom Natal, sim, com toda a família reunida. Dina lhe dá a gravata de presente. Ele sorri, agradecido, A senhora não quer vir passar conosco? Somos gente simples, mas a turma é animada e a comida é boa.
Dina recusa, agradece, mas enquanto o elevador demora a chegar, pensa, Por que não? Volta, aceita o convite, agradece e pega o endereço… Sobe para seu apartamento solitário pensando no que vestir… não quer parecer exibida, não quer parecer desinteressada… Levo uma garrafa de vinho? O porteiro encerra o turno, pensando no primo que ficou viúvo esse ano… Bom rapaz, bem de vida… Nunca se sabe que surpresas Papai Noel pode nos dar neste Natal.