Sexta, 29 Março 2024

Na terra dos anjos

 


 

Minha TV entrou em greve, só passa filme preto & branco, com seus muitos tons de cinza. Não que esteja com defeito, ou que ainda existam por aí os antigos aparelhos avessos a cores, extintos nesses tempos de Blu Rays. Apenas cheguei à conclusão de que os melhores filmes foram feitos antes do Technicolor, do Vistavision, do Panavision.
 
Aderi a um canal que só passa filmes sem efeitos especiais e sem Angelina Jolie, filmes alugados por um dólar na máquinas automáticas dos supermercados, mas que em casa se vê de graça. Sem comerciais. Tempos idos, dos galãs esbanjando charme com um cigarro e um copo nas mãos, Quer um drink? Eles sempre queriam. Das divas temperamentais, da mulher fatal, da namoradinha de infância, dos olhos de Bette Davis.
 
Mal a fama lhes bafejava a face, astros e estrelas iam imprimir mãos e pés na calçada da fama do Teatro Chinês em Los Angeles, diante da multidão que se acotovelava para vê-los. Alguns imprimiam a sola dos sapatos. Um ritual ridículo, não fosse pela aura de divindade que lhes pairava sobre os cabelos bem tratados. O máximo da glória para o artista; o máximo da tietagem para os fãs.
 
Muitos desses grandes nomes dos filmes P & B hoje são poeira, mas mãos, pés ou solas ainda estão lá, para gáudio ou execração da leva de turistas que polui a paisagem californiana, generosa em atrações. Turistas vêm e vão, mas as imagens das extremidades desses artistas extintos lá estarão para sempre, ou até que o Big One, o esperado e temido grande terremoto que será o último, os nivele ao cidadão comum.
 
Ver essa fauna hollywoodiana nas telas dos cinemas tupiniquins era um grande avanço tecnológico, mas televisão era um sonho inalcançável. Nos filmes, porém, todas as casas tinham uma, e a gente achava que era truque de filmagem. Nossa única conexão com a vida real desses anjos irreais era através da revista A Cena Muda, que mesmo calada, contava tudo.
 
Hoje os fanzines sabem da vida e dos segredos dos mitos da moda, e vão lá conferir. Fazem parte da paisagem da cidade dos anjos, facilmente reconhecíveis pelas máquinas fotográficas e pelo mapa das mansões dos famosos, vendidos em toda esquina. Aqui morou Mickey Rooney, a mãe localiza no mapa. Quem é Mickey Rooney? pergunta o filho que só quer saber onde moram Dora e Diego.
 
A pé ou de bonde, lá vão eles clicando tudo que veem, na esperança de captar por acaso algum rosto conhecido que distraidamente se revele na janela de uma Ferrari ou de um Rolls Royce parado no sinal. Mesmo com vidros fumê. Se em todo lugar os turistas viraram a esperança de recuperação de glórias extintas, Los Angeles tem cartazes afixados pra todo lado gritando, Turista, vai pra casa!

 

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