Sábado, 20 Abril 2024

O valor da instrução

 

No último final de semana, a exemplo do lenhador da fábula canadense (nunca soube se é verdadeira, mas a fábula é boa para a vida), parei tudo e voei para Florianópolis,  a bela capital catarinense,  em busca de instrução. Tem gente que pensa que ser instruído é ter muitos títulos acadêmicos. Isso é importante, mas não é tudo e nem é essencial, perdoem-me os partidários desse tipo de vida.
 
Conheço muita gente bem formada que é, pessimamente, instruída. Por exemplo, no campo financeiro. O que nos ensinam desde cedo? A estudar, conseguir um diploma e um emprego. Isso é bom para os controladores do capital, nunca para quem almeja a prosperidade. E quando falo de prosperidade não falo somente, mas também do progresso econômico e financeiro. Porém, a ele se associam progressos intelectual, social-familiar, moral, físico, espiritual, emocional, dentre outras áreas da vida.
 
Dizem que um sábio oriental filosofou (outros atribuem isso a um líder indígena):  o homem ocidental passa a metade da vida gastando saúde para ganhar dinheiro e a outra metade gastando dinheiro para tentar recuperar a saúde. Evitar esse desequilíbrio na vida é o objetivo da boa instrução.
 
Quando nos ensinaram a estudar para conseguir um diploma e um bom emprego, a sociedade reproduzia apenas um modelo que interessava muito a setores econômicos da sociedade. Hoje é muito comum encontrarmos jovens, que não se envergonham de ser chamados de concurseiros. Vivem fazendo um concurso para um cargo menor visando a continuar em busca do cargo acima até atingir o que chamam “topo da carreira”.
 
Não se objetiva a função pública pelo que ela comporta: servir ao público. Não raro, visa-se a servir-se a si mesmo e se incluir no sistema de produção-consumo. Stephen Covey ensina que ganha mais dinheiro quem serve a mais pessoas. No serviço público, eu aviso, você não fica rico. Se ficar, com certeza foi por meios ilegais. No máximo, consegue uma situação confortável. E eu nunca ouvi falar que a zona de conforto seja o melhor lugar para se ficar.
 
Não descarto que existam os que buscam uma situação mais confortável de onde possam servir à humanidade. A esses, louvo, mas não são maioria e nem são valorizados. Pelo contrário, são até chamados de otários pelos espertinhos. Os professores, por exemplo, que abrem as janelas para o conhecimento, deveriam ser a classe mais valorizada da sociedade e, no entanto, o que se vê?
 
A propósito da fábula mencionada na abertura, conta-se que havia no Canadá um senhor já de avançada idade que era imbatível como lenhador. Um dia um jovem, desses marombados em academia, resolveu desafiá-lo. No dia da prova, ao ver o porte físico do velho lenhador, considerou que a competição estava no papo. Quando começou a disputa, o jovem “caiu matando”. Quando olhou, o lenhador estava sentado. Pensou: “já cansou”. Continuou batendo machado, olhou de novo... uma... duas... três... quatro vezes, e o velho lenhador estava sentado.
 
Quando o juiz apitou o final da prova e foram cubar a madeira cortada, o monte do velho lenhador era o dobro do amontoado do jovem marombado. Com a arrogância própria desse tipo de caráter, o jovem esbravejou e logo falou que havia sido roubado. Por que? “Todas as vezes que olhei, ele estava descansando”. Com a sabedoria que somente o tempo confere, o velho lenhador, calmamente, respondeu: “Meu jovem, quando você me viu sentado, eu não estava descansando. Estava afiando o machado”.
 
Devemos cuidar de nossas prioridades. Há tempo para tudo, como diz o Eclesiastes. Tempo de lenhar e tempo de afiar o machado. Em Florianópolis, fui afiar o machado. Ouvir a voz da sabedoria, aprender com a experiência dos outros e, sobretudo, descobrir um pouco mais de que existe sabedoria para além do que os nossos olhos físicos podem ver. Essa sabedoria, entretanto, somente pode ser alcançada com os olhos da mente.
 
E o melhor é quando se pode ir em busca dessa experiência guiando amigos que creem no que não viram, mas que enxergam com os nossos olhos, assim como vemos com os olhos dos que nos ensinam. E, na vida, há sempre alguém disposto a ensinar quando há alguém pronto a  aprender.
 


José Caldas da Costa é jornalista, escritor, licenciado em Geografia. Escreve, como colaborador, neste espaço nos finais de semana. Contatos:

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