Segunda, 13 Mai 2024

Obesos x famintos

Quando foi denunciado pelo mensalão e teve de deixar a Casa Civil, Zé Dirceu percebeu-se obeso e começou a fazer exercícios físicos para perder peso. Bom sinal da vontade de regenerar-se. A maioria das pessoas precisa entrar em psicoterapia para compreender o processo que leva ao excesso, ao exagero, à transgressão das regras.
 
Algumas pessoas não podem passar sem cometer o ilícito. Para elas a transgressão é uma necessidade vital. Começam comendo além da conta e, quando veem, estão no banco dos réus por excesso de confiança e abuso de poder.
 
Comer demais é como furtar: uma espécie de crime. Um crime explícito pois ninguém consegue esconder a própria barriga, as dobras, os pneus. Um crime lamentável quando se sabe que um terço da humanidade come menos do que precisa para sobreviver.  
 
Há quem opere o estômago para comer menos, mas a compulsão para o excesso permanece. Questão de caráter. A deformação do corpo do obeso é um sinal concreto da prática do excesso. Excesso oral que se manifesta também na verborragia. Os obesos no poder são terríveis. Lembremo-nos de alguns políticos brasileiros: Getulio, Ademar, Delfim, Jefferson, Demóstenes.
 
Dentro de mil anos, se a humanidade chegar lá, é possível que seja proibido comer além de um certo limite. Claro, as pessoas compulsivamente comilonas terão desenvolvido estratégias para atender às próprias necessidades, mas é lícito pensar também que a evolução psicomoral da sociedade humana terá criado mecanismos para coibir os abusos. Por exemplo, depois de passar de 25% de índice de gordura corporal, o sujeito ficaria obrigado a fazer exercícios, adotar uma dieta regrada e assim por diante.
 
Tudo isso vem a propósito da entrevista do arquiteto Paulo Mendes da Rocha ao programa Roda Viva da TV Cultura de São Paulo. Foi ao ar ao vivo na noite de 10 de junho de 2013. Paulo Mendes da Rocha é um capixaba que se tornou grande em São Paulo. Com a morte de Niemeyer, é a maior figura viva da arquitetura brasileira. Não por acaso nos deu no Roda Viva uma aula de humanismo. Falou basicamente do caos promovido nas cidades pelo furor imobiliário.
 
Sim, as cidades ficaram obesas, deformadas pelos excessos da especulação.  São Paulo, Rio, Salvador, Fortaleza, Porto Alegre, Curitiba, Recife, Vitória são exemplos concretos de que há uma sucessiva e continuada destruição-e-reconstrução de espaços urbanos. “Todo nosso saber está anulado pelos excessos do mundo dos negócios”, disse ele.
 
Mendes da Rocha deu um exemplo: onde havia uma casa com quintal – moradia de uma família -- constrói-se um prédio com 40 apartamentos que multiplica por igual número o tráfego, a demanda por água, eletricidade, telefonia, transporte.
 
É natural que as cidades não resistam a tamanhas transformações.
 
O que fazer num mundo com excesso de gente, de carros, de asfalto, de prédios verticais, de desmedido consumo de energia?
 
Coibir a liberdade da iniciativa privada? Exercer um controle central do processo econômico?
 
Não, responde o professor Mendes da Rocha: não há outro caminho senão aperfeiçoar o exercício dos direitos republicanos por meio da evolução educacional.
 
LEMBRETE DE OCASIÃO
 
“O carro é um trambolho de 700 quilos que queima petróleo e polui o ar para levar um idiota de 70 quilos de cá para lá e de lá para cá”.  
 
PAULO MENDES DA ROCHA

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Terça, 14 Mai 2024

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