Quinta, 18 Abril 2024

Poluidor indireto

 

Nos  últimos dias,  ganhou destaque  no país a campanha liderada por organizações e movimentos sociais contra a venda da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), no distrito de Santa Cruz, Rio de Janeiro. A questão, além de absurda, pois trata-se de uma empresa que não tem licença de operação, é objeto de ações penais por crimes ambientais e financiada com dinheiro público, levanta um outro ponto que muito tem a ver com o Espírito Santo: o papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). 
 
No caso da CSA, que conseguiu fazer os piores estragos na região onde está instalada em tempo recorde, o BNDES entrou com R$ 2,36 bilhões. Mas a participação da instituição financeira em projetos poluidores já vem de outros carnavais. Também são parceiras de longa data do banco as empresas que atuam no nosso quintal, leia-se Aracruz Celulose (Fibria), Vale, ArcelorMittal, Samarco...
 
O que muitas entidades tentam mostrar, há anos, é que o BNDES, muito mais do que vultoso financiador de projetos que provocam violações aos direitos, é incentivador do modelo econômico propagado no Brasil, voltado para o crescimento a qualquer custo. Enquanto financia a concentração econômica e viabiliza os grandes conglomerados empresariais e financeiros, deixa de criar políticas que promovam a diversificação produtiva. 
 
A Plataforma BNDES, que trata o problema desde 2007, já cansou de dizer: o discurso é verde, mas a prática cinza. Ao se associar a empreendimentos que resultam em graves e irreversíveis impactos sociais, ambientais, culturais e econômicos nas regiões onde estão instalados, o  passivo também cai na conta do banco. É corresponsável, não tem como lavar as mãos. 
 
Há dois anos, o Ministério Público no Estado (MPF-ES)  recomendou ao BNDES que exija o prévio licenciamento ambiental de atividades poluidoras, antes da concessão de financiamentos. A intenção era exatamente evitar que os recursos públicos repassados pela instituição fossem utilizados para financiar empreendimentos que promovam a destruição ambiental. De lá pra cá, porém, nada mudou. Pelo contrário, os bilhões cada vez aumentam mais. 
 
A venda da CSA é um momento mais do que oportuno para cobrar da instituição, pela milésima vez, que reveja sua política de financiamento. O que inclui a elaboração de um modelo de estudo de impacto prévio, de caráter decisório, a ser considerado em todos os processos de análise de novos pedidos de financiamento. 
 
O presidente do BNDES,  Luciano Coutinho, recebeu um dossiê relatando as irregularidades e violações geradas pela siderúrgica no Rio de Janeiro. Outras muitas denúncias já chegaram até ele, que continua a ignorá-las. 
 
Mas até que o banco se disponha a mudar a condição de ser quase que exclusivo das transnacionais, muito barulho ainda há de ser feito. 
 
O BNDES é poluidor indireto. E ponto. 
 
 
Manaira Medeiros é jornalista e especialista em Educação e Gestão Ambiental

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