Depois de dois séculos de amor irrestrito, quando imigrar para a América era o sonho de nove entre dez brasileiros e brasileiras, os ventos agora sopram em sentido contrário – os imigrantes só reclamam, e nove entre dez querem voltar pra boa terra de Cabral e Caminha. Mas tudo na vida tem seus senões, e a turma gostaria de ir embora, se não fosse…
Primeiro lugar nas pesquisas de opinião, a falta de segurança. Não adianta ignorar, a violência existe e só aumenta. As estatísticas mostram que nove entre dez brasileiros e brasileiras já passaram por alguma situação no mínimo desagradável em seu dia a dia, com assaltos e coisas piores. Quem vive no fogo não sente a quentura, disse Confúcio, e quem mora no Brasil já está tão acostumado que acha normal viver no sobressalto.
Quem está de longe, porém, perdeu o costume e tem medo. Uma brasileirinha de oito anos foi comigo buscar minha neta no colégio. O espanto da menina foi sincero, Tia, cadê os seguranças? Que seguranças? Ela explica que seu rico colégio particular no melhor bairro da cidade tem portão de entrada, onde ficam postados dois seguranças.
Bom se tivessem isso aqui, talvez evitassem que estudantes armados saiam atirando a esmo em professores e colegas. Mas esses fatos, por mais trágicos que sejam, são excessões, e todas as escolas são abertas. Ninguém anda pela rua agarrado ao bolso ou à bolsa, vigiando se tem alguém suspeito por perto. Embora a segurança por aqui já não seja a mesma, a insegurança não se compara com a nossa.
Segundo lugar na lista, a economia. Daqui ou daí? O eldorado pulou o equador e desceu para os trópicos? Não exatamente. A economia aqui continua ruim, mas nem todos confiam no novo milagre econômico alardeado pela imprensa. Muitos brasileiros e brasileiras vão bem, obrigada, o que não significa que a maioria vai bem. Nove entre dez dos que já foram não conseguiram engrenar, e voltar é impossível. Além disto, os preços da vida andam pela hora da morte…
Terceiro lugar, laços de família. Pode parecer estranho, pois como ninguém é uma ilha, todo migrante rompeu laços de família ao partir. No começo as cartas e telefonemas são constantes, fotos vêm e vão, mantendo as famílias atualizadas. E viagens pelo menos uma vez por ano… Com o tempo, porém, outros laços vão se formando na nova terra – os filhos nascem, se enturmam, preferem falar inglês que português, jogam beisebol em vez de futebol, veem Netflix em vez da TV Globo.
Depois adentram o mercado de trabalho, se casam e têm seus filhos, não necessariamente nessa ordem. O neto do imigrante não fala português. Minhas tentativas de dar aulas de português para a nova geração, provoca risadas. Pra quê? Porque um dia vocês podem querer ou precisar morar no Brasil. Eu? Que ideia! Já não há como arrebanhar a turma toda e simplesmente voltar, e a idade não permite mudanças drásticas, sejam físicas ou emocionais.