A gestão do Hospital Infantil de Vila Velha (Heimaba) se tornou, praticamente, uma caixa-preta. Desde que o Instituto de Gestão e Humanização (IGH), Organização Social baiana que assumiu a administração da unidade em outubro do ano passado, obter informações, por exemplo, sobre o número de óbitos registrados na unidade, tornou-se missão impossível. Mesmo que tais dados, de interesse público, devessem estar disponibilizados até em portais de transparência do Estado.
Logo apos a transição de gestão pública para privada, denúncias de pais, acompanhantes, profissionais de saúde e até mesmo de fornecedores do Heimaba começaram a pipocar. Os relatos dão conta de que as mortes, com a entrada do IGH, aumentaram cerca de três vezes, comparadas ao tempo em que o hospital era gerido pelo Estado. Incluindo aí óbitos de prematuros internados na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (Utin). Na virada do ano e nas primeiras semanas de janeiro de 2018, informações circularam de que nove recém-nascidos haviam morrido.
Entre os motivos para isso somam-se vários fatores, que o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde no Estado (Sindsaúde-ES) elenca. O IGH, que atua na lógica do lucro, apesar de se dizer uma organização sem fins lucrativos, contrata trabalhadores com salários abaixo da média de mercado. Técnicos em enfermagem, por exemplo, recebem pelo regime de escala 12 x 36 horas, o salário de R$ 1.155,00. Por esse valor, habilitam-se recém-formados, leia-se, sem experiência. Na Utin, apesar de haver proibição para tal, profissionais sem qualquer prática foram escalados pela OS para lidar com um atendimento superespecializado.
No Heimaba, outros problemas. Consequência da lógica de baixos salários, a rotatividade dos profissionais é alta. Além disso, os servidores de carreira, concursados e com vasta bagagem em saúde pública, estão deixando o hospital. Relatos dão conta que não se sujeitam ao assédio moral imposto pela IGH, além de não concordarem com a queda da qualidade do serviço. O resultado: pedem transferência e até mesmo demissão. Assim tem ocorrido até com médicos.
Diante das denúncias do aumento de mortes, órgãos fiscalizadores, como o Conselho Gestor do Heimaba, Sindsaúde-ES e até a Comissão de Direitos Humanos do Conselho Estadual de saúde fizeram o óbvio: solicitaram à Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) acesso a tais dados a fim de tomar as providências cabíveis, incluindo a interdição na gestão do hospital, caso necessária. Mas, apesar de vários pedidos terem sido formalizados à Sesa, a resposta tem sido o silêncio absoluto. E não foram poucas tentativas, que estão sendo feitas desde janeiro deste ano.
A solução encontrada pelo Sindsaúde-ES mostra-se mais contundente. A entidade pretende acionar a Justiça por meio da Lei de Acesso à Informação, para obter os números de óbitos que foram registrados no Heimaba, de outubro de 2018 até o momento.
Quem sabe, assim, a Secretaria de Estado da Saúde não atenda o pedido?
Com tantos problemas e denúncias de irregularidades associadas à gestão das OSs nos hospitais do Estado (a mais recente é de calote da IGH em fornecedores, além de atrasos de salários), é necessário ressaltar a fala do diretor do Sindsaúde, Valdecir Nascimento: “A gente se pergunta por que o governo do Estado não faz a gestão de seus próprios hospitais. A gente se pergunta por que é necessário colocar empresas privada para fazer isso? A gente se pergunta será que é porque eles querem algo de volta? Será que existem interesses eleitorais? São perguntas que ficam sem resposta…”.
Se esse é, como o governo tanto afirma, o melhor modelo para a saúde pública capixaba, vale a máxima: quem não deve não teme!