Desde que assumiu o governo pela primeira vez, em 2003, Paulo Hartung manteve distância dos últimos três presidentes da República, seja por divergência política (no caso de Lula e Dilma), seja por receio de contaminar sua imagem (caso de Temer) com as denúncias de corrupção que não param de eclodir em Brasília.
Se Hartung sempre manteve uma aliança sólida com o Partido dos Trabalhadores no Estado, a relação com os governos petistas não ultrapassou o limite da burocracia. Se Lula e Dilma nunca fizeram muito esforço para conquistar o apoio de Hartung, o peemedebista, de outro lado, também se mostrou indiferente aos petistas. Nas eleições presidenciais, Hartung não escondeu sua preferência pelos candidatos tucanos. Na última, apoio Aécio Neves, hoje afastado do Senado por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção investigado pela Lava Jato.
Neste terceiro mandato, Hartung apoiou o impeachment da presidente Dilma, mas se enganou quem pensou que ele entraria de cabeça no governo Temer. Longe disso. Hartung talvez tenha sido muito mais cauteloso com o correligionário do que com os próprios petistas.
A propósito, Hartung nunca mediu palavras na hora de criticar o governo Temer. Ele construiu uma narrativa que valorizou sua política de austeridade como modelo a ser seguido pelos colegas governadores e pelo próprio presidente. E culpou a morosidade do governo federal em empreender as esperadas reformas. Essa transferência de culpa para o governo Temer era, ao mesmo tempo, uma maneira de justificar que se as coisas só não deram mais certo para o Espírito Santo até agora foi por causa da inépcia do governo central.
O encontro desta sexta-feira (16) do governador Paulo Hartung com o presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (DEM), porém, é repleto de sinais. Supõe uma aproximação do governo capixaba com o federal. É óbvio que Hartung não toparia fazer uma selfie com Temer nesta altura do campeonato. Aliás, poucos governadores estariam hoje dispostos a encarar sair nessa foto.
Mas Hartung parece ter se convencido, como muitos especialistas do mercado, que Temer chega até o fim do mandato. E, a partir de agora, também pensa que é melhor seguir com Temer mesmo. Essa conclusão foi baseada na recente vitória de Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Se Temer sobreviveu à megabomba de Joesley Batista da JBS e do processo no TSE , teria imunidade suficiente para superar novos ataques.
Quando Hartung encampa as reformas, está, veladamente, apoiando o governo Temer. Falando em apoio, essa parece ter sido a missão que Temer delegou a Rodrigo Maia na sua visita ao Espírito Santo. A Câmara está prestes a analisar a denúncia que a Procuradoria-Geral da República deve apresentar contra Temer nos próximos dias.
Os conselheiros de Temer acham que o momento é propício para derrubar a denúncia na Casa. No entanto, para assegurar os votos de dois terços da Câmara Temer vai precisar contar com a ascendência de cada um dos governadores sobre suas bancadas. Nas entrelinhas da conversa entre Maia e Hartung as contrapartidas oferecidas por Temer devem ter sido discutidas.
Caso essa tenha sido mesmo a pauta do encontro, é óbvio que Hartung guardará o segredo a sete chaves, como fez no único encontro tete-a-tete que teve com Temer, quando o impeachment de Dilma estava sendo costurado pelo então vice, que estava desesperado atrás de apoio para seu projeto de ser presidente.
Na ocasião, nunca ninguém soube qual foi o tempero da moqueca que Hartung saboreou com Temer na Residência Oficial na Praia da Costa. No encontro com Maia, Hartung diz que falou sobre as reformas como solução para o Espírito Santo voltar a gerar “emprego e renda”: duas palavras mágicas que passaram a se encaixar em quase todas as narrativas que defendem as reformas como única saída para o Brasil.