
“As filmagens sobre as dunas, acompanhando os personagens e ouvindo os depoimentos nos remeteu para aqueles dias, nos instaurou a presença da vila antiga, que jazia sob os nossos pés, soterrada há quarenta anos”. Assim conta Marcos Valério, diretor de Pedras Pretas – Itaúnas de São Benedito e São Sebastião. O vídeo-documentário é um retrato das manifestações populares da Vila de Itaúnas, mas também uma denúncia ao avanço das plantações de eucalipto e as consequências desse desastre ecológico.
Cineasta e cineclubista, Marcos Valério se prepara para o lançamento de Pedras Pretas nesta sexta-feira (31), no Cine Metrópolis, envolvido com o projeto desde 2007, ele conta que sua relação com o folclore é bem mais antiga. Para o diretor a tradição cultural é um exercício político. “Os elementos e questões relacionadas às manifestações culturais e artísticas são essenciais à formulação de um bem simbólico que proporcione um sentido à história do Espírito Santo”, diz.
Marcos vê a Festa de São Benedito e São Sebastião, em Itaúnas, como um dos maiores momentos da expressão popular capixaba. A princípio, a ideia para o filme seria apenas mostrar o cotidiano dos moradores da Vila, os preparativos, os ensaios para a festa que homenageia os dois santos todo o mês de janeiro. No entanto, o processo de filmagens, entrevistas e pesquisas ampliaram o campo de informações textuais e iconográficas.
“Filmamos desde a Comunidade de Santana, antigo quilombo do Negro Rugério, até o sertão de Itaúnas, para além das dunas. Uma história que vai desde a escravidão, os barões e as baronesas da farinha até as muralhas de eucalipto”, conta Marcos, que também disse ter material para um longa-metragem, que não pode montar devido aos limites do edital. “Mas ainda o farei”, revela.
Um dos assuntos tratado no vídeo-documentário são os efeitos dos avanços das plantações de eucalipto, que forçam o deslocamento das pessoas do sertão, das matas para os núcleos urbanos. Na tradição cultural isso trouxe uma série de mudanças: a festa de São Benedito e São Sebastião adaptou-se à economia do turismo, fonte principal de vivência da Vila de Itaúnas.

“Me chamou atenção nas entrevistas a diferenciação da manifestação originária para o que eles chamam de ‘folclore’, ou seja o reconhecimento da manifestação em um circuito de arte e de mercado”, explica Marcos. Mesmo adaptando-se ao contexto contemporâneo, a tradição continua viva “assim como a devoção ao santo negro São Benedito, um valor espiritual inalterável”, completa.
O documentário é guiado pelos personagens Seu Caboclinho, mestre do Ticumbi de Santa Clara, e seu Paulo Jacó, artesão da madeira. Eles mapeiam os acontecimentos do cotidiano da vila antiga sobre cada ponto da vila soterrada. “São duas figuras extraordinárias e a quem o filme deve muito”, declara Marcos.
Serviço
Pedras Pretas – Itaúnas de São Benedito e São Sebastião será lançado nesta sexta-feira (31), às 21h, no Cine Metropolis, Ufes. Av. Fernando Ferrari, campus de Goiabeiras, Vitória. Entrada franca.