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Análise: ???Ferrugem e Osso???

Num mundo hedonista e com recursos intermináveis o consumo é a maior causa de felicidade do cidadão. Entretanto a permanência num estado constante de excitação é causa das maiores taxas de depressão de toda história, nunca se tomou tanto antidepressivo (mais consumo) e nunca se gastou tanto com médicos e terapias de autoajuda. 

 
Da célebre “há males que vem para o bem”, o sacrifício volta aos poucos ao centro da discussão, sendo proposto novamente como um caminho. Da austeridade europeia à humildade papal espetacularizada nas grandes mídias este caminho é fendido no meio do sistema de consumo, esperando sua adesão pelos consumidores céticos.
 
Ferrugem e Osso vai tocar justamente na ferida da dor e do sofrimento como elemento justificante da vida. Ali (Matthias Schoenaerts) sobrevive com seu filho Sam até que conseguem abrigo na casa de sua irmã. Consegue um emprego de segurança e conhece a Stephanie (Marion Cotillard) que é treinadoras de baleias num show aquático. 
 
Depois do primeiro encontro decepcionante não há motivos para o reencontro. Ela porém sofre um acidente com as baleias e tem as pernas amputadas. Desapegando-se de qualquer pretensão de viver (impedida do prazer de andar e do prazer estético) liga para Ali. Uma relação de sacrifício se forma e isso pode salvar-lhes a vida.
 
A temática sofrida e crua da história é desenvolvida de forma tão poética e singela, que não vemos outro modo do destino manifestar-se. Somente por este acaso podem restaurar suas vidas. 
 
As imagens desfocadas, subaquáticas (que fazem a ligação do sofrer dela e do dele) acompanhadas de tons instrumentais criam uma plasticidade na dor, instaurando o último recurso estético. A partir daí tudo é corte, dilapidado na vida dela. Ele ainda terá que enfrentar outra provação, dessa vez ele tem o poder de mudar a fatalidade.
 
A água que lava e purifica é o eixo central, sempre aparecendo para a redenção dos protagonistas tão sujos do cotidiano. O sangue, a ferrugem, a sujeira, tudo é acúmulo, a ruína decorrente deles é inevitável. Um caminho suave, sem atritos, sem registros é a chave do porvir, mesmo tendo-se que abrir mão de diversos padrões sociais.
 
O diretor Jacques Audiard (De Tanto Bater Meu Coração Parou, 2005) novamente discute a redenção, os encontros furtivos e o sacrifício como forma de amor. Assim como Calvino propôs, a leveza passa ser uma forma sublime de expressão.
 
Serviço
Ferrugem e Osso (De rouille et d’os, França/Bélgica, 2012, 120 minutos, 16 anos) 
 
Cine Jardins – Shopping Jardins: Sala 1. 19h.

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