“Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes / Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas / Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu”. Os versos de Fernando Pessoa traduzem um pouco da temática da exposição Deserto Gráfico, dos artistas Gabriel Albuquerque (ilustração capa) e Luciano Feijão (abaixo) e curadoria de Julio Tigre.
A mostra, que reúne vinte desenhos e mais dois que serão produzidos em conjunto, será aberta nesta quarta-feira (21), a partir das 19h, na Galeria Homero Massena.
Em meio à aridez e o vazio que a palavra deserto transmite, os desenhistas encontraram o ponto de partida para suas obras. Impulsionados pela relação entre palavra e imagem, os dois trabalharam as diversas subjetivações do conceito deserto.
“Nossa afinidade com as palavras vem do nosso ofício como ilustrador e por trabalhamos com quadrinhos e animação. Mas nas nossas obras não há nada tipográfico, apenas usamos uma palavra em comum para nortear a produção”, explica Gabriel.
O projeto foi pensado junto com um amigo dos artistas, Adolfo Oleari, que discutiu as referências teóricas com a dupla. As pesquisas revelaram a palavra deserto sendo usada muitas vezes na literatura, na filosofia e na religião como metáfora de transição ou metamorfose.
“Diversas figuras como Jesus Cristo, Buda, o Zaratustra descrito por Nietzsche se refugiaram em algum tipo de deserto para refletir e repensar a vida”, diz Luciano.
“Percebemos isso também na obra de Fernando Pessoa e de Guimarães Rosa, principalmente quando o escritor mineiro escreve ‘O Sertão está em todo lugar’. Para mim o deserto também está na folha em branco, que é árida, vazia e precisa ser preenchida”, completa Gabriel. O trabalho dos dois desenhistas expõe os desdobramentos dessas pesquisas por meio da imagem, fazendo a junção entre o visual e o verbal.
Gabriel Albuquerque é graduado em Belas Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com habilitação em Cinema de Animação, e Luciano Feijão é graduado em Artes Plásticas pela Ufes.
Os dois se conheceram quando deram aulas no curso de artes da Ufes. Com referências distintas, as obras dos dois artistas se mostram muito diferentes plasticamente, mesmo tendo como plano de fundo a temática do deserto.
Os desenhos foram feitos especialmente para a exposição, mas Gabriel e Luciano trabalharam separadamente, cada um em seu espaço. Para Luciano, a sua criação sempre envolve algum elemento de desconforto, “tento criar algo confuso, que não é compreensível logo a primeira vista”, diz. Já as obras de Gabriel reportam a um universo fantástico, “tenho como fortes referências os quadrinhos e a animação, Moebius e Hokusai, sobretudo”.
Para completar a exposição, na parede do fundo da Homero Massena estarão duas folhas em branco em que os artistas irão produzir um desenho em conjunto. Cada um receberá um tema do curador Julio Tigre e os ilustradores irão desenhar sem saber qual o tema do outro. A obra será desenvolvida até o dia 31 de dezembro, quando termina a exposição.
Serviço
A exposição Deserto Gráfico, de Luciano Feijão e Gabriel Albuquerque, será aberta nesta quarta-feira (21), a partir das 19h, na Galeria Homero Massena. R. Pedro Palácios, 89, Cidade Alta, Vitória. Entrada franca. Até 31 de dezembro.