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Professores da Ufes defendem preservação da história da Colônia de Itanhenga

Proposta é fazer exposição itinerante, livro e um catálogo com fontes históricas

Os professores do departamento de História da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Patrícia Merlo e Sebastião Pimentel apresentaram, na Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa, um projeto de resgate histórico do Leprosário de Itanhenga. A proposta, apresentada nessa terça-feira (1º), contempla uma exposição itinerante pelo Espírito Santo, um livro sobre a história do leprosário e um catálogo.

Ales/Ellen Campagnaro

A exposição seria de fontes históricas como fotos, prontuários, depoimentos, dados clínicos e informações de médicos que trabalharam no Hospital Pedro Fontes, para onde as pessoas com hanseníase eram levadas compulsoriamente. A proposta é que seja realizada em todos municípios do Espírito Santo, já que o local recebeu internos de praticamente todos eles, mas principalmente do interior.

Há, ainda, de acordo com Patrícia, uma outra motivação, a necessidade de “parar de negar o passado”. “A função da história é lembrar às pessoas daquilo que se quer esquecer, e é sempre a história dos mais vulneráveis que é apagada, invisibilizada, coloca embaixo do tapete”, diz. Além disso, a ideia é que os familiares dos internos em cada cidade recebam uma réplica da documentação.

Em relação ao catálogo, também com fontes históricas, de acordo com a professora, a proposta é que seja tanto físico quanto virtual, este último, com uma versão em inglês, já que há interesse no tema por parte de pesquisadores de várias partes do mundo. O projeto é proposto por meio do Laboratório Saberes e Sabores: História da Alimentação e das Práticas de Cura, coordenado por Patrícia e que tem Sebastião Pimentel como subcoordenador.

A docente recorda que a pesquisa sobre o antigo leprosário teve início em 2013, quando Sebastião, por meio de um projeto apresentado à Fundação de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo (Fapes), reuniu mais de 5 mil documentos, que não trazem somente histórias dolorosas. “As pessoas, apesar da prisão compulsória, refizeram suas vidas, descobriram amores, tiveram filhos”, ressalta.

O Hospital Pedro Fontes foi criado em 1937 para isolar pacientes com hanseníase, doença também conhecida como lepra, normalmente retirados de maneira violenta do convívio familiar e social. Os filhos dos internos, por sua vez, eram encaminhados para o Educandário Alzira Bley, também em Cariacica, criado em 1940. O leprosário nasceu no contexto da política de isolamento e internação compulsórios de pacientes com hanseníase no primeiro governo do presidente Getúlio Vargas. Com a descoberta da cura da enfermidade, o fim da internação compulsória aconteceu em 1962, mas há registros de que continuaram em todo o país, até a década de 80.

A documentação catalogada, informa Patrícia, já auxiliou, inclusive, na solicitação de pedido de pensão vitalícia por parte de filhos de ex-internos, que foram encaminhados para o Educandário Alzira Bley. De acordo com ela, Sebastião Pimentel chegou a ser acionado pelo Ministério dos Direitos Humanos para acessar as documentações com esse fim, já que algumas pessoas que pleiteavam o benefício não tinham documentos para comprovar sua situação. O benefício foi concedido por meio do Projeto de Lei (PL) 3023/2022, aprovado em 1º de novembro de 2023. A lei foi sancionada sem vetos e concede pensão vitalícia de um salário mínimo (R$ 1.518,00) aos filhos de pessoas com hanseníase que foram separados dos pais. No Espírito Santo, são cerca de 600 pessoas.

Patrimônio histórico

Em 2021, a Prefeitura de Cariacica instituiu o tombamento do Sítio Arqueológico Pedro Fontes, compreendendo a área do cemitério São Francisco, capela e entorno, processo iniciado na gestão do então prefeito Geraldo Luiza Junior, o Juninho, e finalizado no primeiro mandato de Euclério. Para que isso acontecesse, o Governo do Estado enviou para a Assembleia Legislativa um projeto de lei de doação da área onde se situam o cemitério e a capela, aprovado em 2020.

pedro-fontes_leonardo_sa-1935.jpg
Leonardo Sá

Uma delas estabelece que o município restaure a capela até dois anos após a sanção da lei. A outra, que seja asfaltada a estrada que dá acesso ao local. A última, que seja feita exumação dos cadáveres na entrada do cemitério, em diálogo com as famílias dos mortos, para ajustes estéticos no local. Contudo, os moradores afirmam que nada disso foi feito. Além disso, o município de Cariacica tem uma legislação própria de tombamento, elaborada com base nos critérios do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Assim, os tombamentos seguem as legislações municipal e nacional.

Em dezembro de 2023, a área do Hospital Pedro Fontes, que pertencia ao Governo do Estado, foi municipalizada por meio da aprovação do Projeto de Lei nº 1021/2023. Agora, a Prefeitura de Cariacica quer criar no local um polo industrial. Para isso, notificou moradores da região no dia 5 de junho para que deixem suas casas.

A Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES), no entanto, recomendou a não remoção, levando em consideração o fato de a região ter moradias existentes, sendo a maioria delas consolidadas há décadas; núcleos urbanos consolidados, reconhecidos pelo poder público e dotados de equipamentos de infraestrutura, parcialmente; centenas de moradores em situação de vulnerabilidade social; ordem de desocupação desacompanhada de informações específicas quanto ao devido processo administrativo; ausência de devido processo legal administrativo prévio, com contraditório e ampla defesa; ausência de demonstração de excepcionalidade, urgência, subsidiariedade, proporcionalidade; e de encaminhamentos habitacionais e assistenciais aos moradores removidos.

Muitas pessoas têm reclamado, ainda, da deterioração do hospital. Filha de ex-internos do Hospital Pedro Fontes, Aureni de Souza Castro relata que o equipamento está abandonado, sem garantia de segurança por parte da prefeitura. Por isso, está sendo depredado. De acordo com ela, portas foram arrancadas, bem como janelas, assim como nos pavilhões que abrigavam os hansenianos. A situação faz com que os moradores temam que ladrões possam se abrigar no imóvel.

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