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Fome aumenta, mas Restaurante Popular de Vitória segue fechado

Conselho de Segurança Alimentar vem cobrando reabertura do espaço, porém, prefeitura só sinaliza para 2022

O clima da última reunião do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional de Vitória (Comsea), nessa quarta-feira (14), foi de muita cobrança, como tem sido há muito tempo. Uma delas é pela reabertura do Restaurante Popular, fechado desde o fim de 2016, durante a gestão de Luciano Rezende (Cidadania). A demanda vinha sendo cobrada há anos e, desde janeiro, foi repassada pelo conselho para a equipe do atual prefeito, Lorenzo Pazolini (Republicanos).

O resultado tem sido o mesmo de antes: respostas evasivas e nenhuma data prevista para retorno do equipamento, um instrumento previsto na política nacional de segurança alimentar e nutricional para municípios de maior porte. No caso de Vitória, durante seu funcionamento, o espaço chegou a servir mais de mil refeições diárias pelo valor de R$ 1.

O antigo Resrautante Popular em funcionamento na Ilha de Santa Maria. Foto: PMV

A prefeitura de Vitória, porém, alega não ter recursos para que o Restaurante Popular possa voltar a funcionar. A proposta é inseri-lo no plano plurianual, que deve ser aprovado este ano. Isso implicaria que o equipamento voltasse a funcionar, se não ocorressem percalços, em 2022, sendo que ainda precisa de reparos em sua estrutura. A gestão de Pazolini, por meio da Secretaria Municipal de Assistência Social, ao menos se comprometeu a manter o espaço na Ilha de Santa Maria.

O local, com toda sua estrutura, só não foi desfeito por conta de uma ação dos conselhos municipal e estadual de segurança alimentar junto com o Ministério Público Estadual (MPES) e Defensoria Pública Estadual (DPES), que embargou as obras para transformá-lo em um Banco de Alimentos.

Para Jaqueline Moreira de Araújo, presidente do Comsea, os reparos necessários deveriam ser feitos com urgência para que o equipamento começasse a atender de forma emergencial diante da situação da pandemia, podendo servir inicialmente como ponto para distribuição de marmitas para população em situação de rua, já que as Tendas do Bem, que faziam esse serviço, não foram renovadas na gestão Pazolini.

No entendimento da conselheira, gradualmente, com a recomposição da estrutura, equipamentos e funcionários, o Restaurante Popular poderia voltar a produzir refeições de forma emergencial para serem distribuídas, até que se possa retornar ao funcionamento normal.

O fato é que o desmonte das políticas de segurança alimentar e nutricional em todas esferas deixou o poder público sem recursos físicos e financeiros para responder à situação crítica do combate à fome agravada pela pandemia, ficando assim muitas pessoas desamparadas, contando apenas com apoio de doações de entidades sociais, comunitárias e religiosas.

O mais comum é a distribuição de cestas básicas, que não são o ideal a nível nutricional e nem sempre atendem plenamente pessoas que têm restrições alimentares por questões de saúde.

Ato realizado em 2020, quando os conselhos de segurança alimentar entraram com ação para embargar as obras de desmonte do restaurante de Vitória

O Restaurante Popular foi criado em 2005, durante o governo de João Coser (PT), no bojo da implementação de políticas federais para segurança alimentar. O fechamento se deu em dezembro de 2016, quando o então supersecretário Fabricio Gandini (Cidadania), hoje deputado estadual, anunciou que o plano era converter o espaço num banco de alimentos, para distribuir para as famílias mais necessitadas cadastradas no CadÚnico.

Para Jaqueline Moreira de Araújo, a gestão Pazolini mostra a mesma falta de entendimento da anterior, de Luciano Rezende. “O poder público não pensa que o Restaurante Popular deva só para quem não tem nenhuma condição de se alimentar em casa. Não é só isso, é uma política universal, para quem buscar por ele”, comenta. No caso, banco de alimentos e restaurante popular tratam-se de políticas inclusive complementares, sendo que este, por exemplo, consegue atender pessoas em situação de rua, vendedores ambulantes e outros que não teriam condições de se alimentar com qualidade durante o dia.

O atual banco de alimentos da Capital fica localizado em um galpão na Serra. “Não há estrutura adequada, acaba servindo apenas como um depósito de cestas básicas para posterior distribuição para os CRAS [Centros de Referência em Assistência Social]”. Outro equipamento previsto, a cozinha comunitária, não existe no município.

Sem políticas massivas e eficientes, e com a situação social no país se agravando diante da pandemia de Covid-19, um dos efeitos é o aumento da fome no país, conforme apontam diversos estudos. Recém-publicado, um levantamento do grupo “Alimento para Justiça”, em parceria entre universidades brasileiras e alemãs, apontou que no final do ano passado quase 60% da população enfrentava algum grau de insegurança alimentar, sendo que 15% estavam em situação de grave insegurança alimentar. O resultado coloca o país a níveis próximos de 2004, quando começava a ser implantado o Bolsa Família.

O desmonte das políticas a nível federal que contribuíam com os investimentos nos equipamentos de segurança alimentar acabaram gerando um efeito em cadeia, e hoje não há em funcionamento mais nenhum restaurante popular, tendo sido fechado não apenas o de Vitória, mas também de Cariacica, Cachoeiro de Itapemirim, Colatina e Nova Venécia. Por isso, também existe uma cobrança ao governo estadual, com quem já houve diálogos, mas ainda não se concretizaram as políticas para efetivar o retorno e criação de novos restaurantes populares.

O Maranhão, por exemplo, expandiu a atuação dos restaurantes populares durante a pandemia, aumentando o número deles e passando a oferecer, além do almoço a R$ 3, a janta a R$ 1. O estado conta hoje com 55 restaurantes populares em funcionamento.

Enquanto o poder público capixaba vacila em suas políticas, os ativistas repetem o drama que tem virado a vida das pessoas vulneráveis: “Quem não morrer de Covid, corre o risco de morrer de fome”, lamenta Jaqueline.

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