Jovens do Território do Bem divulgaram nota em “solidariedade, indignação e repúdio”

Não é somente o Centro de Referência da Juventude (CRJ) localizado em Castelo Branco, Cariacica, que está fechado. A juventude de Novo Horizonte, na Serra, também não pode usufruir do equipamento. O motivo é o mesmo: o fim do contrato com a Organização não Governamental (ONG) Cieds, que fazia a gestão dos espaços.
O CRJ de Novo Horizonte está fechado desde abril, assim como o de Castelo Branco, informa a estudante Thaisa Pereira. Ela era uma das frequentadoras desde 2022, quando participou de atividades como oficinas de trança e dança. Nos últimos tempos, estava focada na oficina de pintura Pincelando Fatos, iniciativa que possibilitou a ela e a outros jovens a participação em uma exposição em um museu do Rio de Janeiro.
“O CRJ é um ambiente que tira o jovem da rua. Promove eventos, traz coisas que a maioria das pessoas do bairro não têm acesso. Democratiza o acesso à cultura, ao lazer, ao esporte. Eu via no CRJ algo que dizia ao jovem que ele pode ficar ali dentro vivendo, existindo, ou ficar lá. Os jovens escolhiam ficar lá dentro”, diz.
A juventude do Território do Bem, em Vitória, em solidariedade aos jovens de Castelo Branco e Novo Horizonte, divulgaram uma nota de “indignação e repúdio” diante da paralisação das atividades dos CRJs dos dois bairros. “Estamos juntos com os jovens de Cariacica e de Novo Horizonte. A juventude não está desmobilizada”, garantem.
Os jovens apontam “descaso, negligência e irresponsabilidade” por parte da gestão de Renato Casagrande (PSB) e da Secretaria Estadual de Direitos Humanos, chefiada por Nara Borgo. “Não podemos mais aceitar que espaços construídos com tanto esforço coletivo da juventude capixaba sejam tratados como se fossem serviços secundários, como se nossos corpos e nossas histórias fossem descartáveis”, diz a nota.
Em entrevista a Século Diário, o produtor cultural André Vieira, de Castelo Branco, relatou que o fechamento foi devido ao fim do contrato com a ONG Cieds e que foi feita uma seleção para escolha de outra Organização da Sociedade Civil (OSC) para gerir o CRJ. A escolhida, informa, foi a Avante Social. De acordo com André, a Secretaria Estadual de Direitos Humanos (SEDH) chegou a anunciar que o CRJ reabriria no dia 14 de junho, mas isso não aconteceu.
Na nota, a juventude do Território do Bem recorda que nos dias 15 e 16 de junho, jovens de Castelo Branco enviaram e-mails para a SEDH “cobrando explicações e exigindo o cumprimento da palavra empenhada”. “A resposta veio na forma mais burocrática possível: ‘o processo é complexo’, ‘estamos resolvendo’, ‘não há prazo definido”, aponta a nota.
Também é destacado que “desde abril, o CRJ de Novo Horizonte está fechado, e não há previsão nem ações concretas para sua reabertura. Quando uma jovem tentou contato com a secretaria, foi informada que o CRJ reabriria ‘no próximo mês’, sendo que já se passaram dois meses e seguimos sem qualquer resposta concreta”.
A juventude do Território do Bem destaca que “a juventude está desamparada. O CRJ era a âncora de muitos jovens. E diante do abandono, alguns acabaram migrando para lugares e situações das quais o CRJ os protegia. A responsabilidade por isso é integralmente do Governo do Estado, de suas secretarias e de quem ocupa os cargos públicos, sobretudo os que deveriam zelar pelos direitos humanos e pelas Juventudes. O projeto CRJ é uma conquista da juventude negra, periférica, trabalhadora, LGBTQIAPN+, e não será tratado como moeda política”.
Na última quinta-feira (24), jovens de Novo Horizonte e Castelo Branco participaram de uma reunião com representantes da Subsecretaria de Juventude do Governo do Estado. De acordo com o articulador de juventude de Cariacica, Cristiano Lopes, ficou acordado que, enquanto os CRJs não voltam a funcionar, os coletivos de juventude podem pegar equipamentos emprestado para suas atividades, como caixa de som e computador. Além disso, foi criado um comitê com representação dos jovens e da subsecretaria.
‘Divisor de águas’
André Vieira, de Castelo Branco, diz que no CRJ de Cariacica eram realizadas atividades como curso de barbearia e de informática, aulas de dança, além de ter a disponibilização de um estúdio de gravação, inaugurado seis meses antes do fechamento do CRJ, após um abaixo-assinado da comunidade. “O CRJ é um divisor de águas dentro de Castelo Branco, é o brilho que tem dentro da comunidade, a esperança do jovem dentro de um lugar marcado pelo tráfico. Se faz presente na comunidade, coisa que o governo nunca fez. Acolhe quem está no tráfico e impulsiona”, ressalta.

André afirma que ele é um exemplo disso. O jovem relata que saiu do tráfico após descobrir, por meio do CRJ, que poderia realizar o sonho de “levar a vida” como MC e produtor cultural. Isso aconteceu quando foi convidado para ministrar oficina de Letra e Rima no equipamento. Na ocasião, ele deu entrevista para a TVE sobre a atividade.
“Isso me deu um brilho. Eu não precisava disso para validação, mas foi o que me aconteceu. Eu pensei: ‘estou dando aula de letra e rima e estou ganhando para isso”, recorda. André salienta que, a partir daí, passou a prestar outros serviços no CRJ e hoje está com oito projetos em andamento, aprovados em editais de cultura.
‘Fase de análise’
Em resposta a Século Diário, a Sedh informou que “estão em fase final os processos de chamamento público para seleção das Organizações da Sociedade Civil (OSC) que vão administrar os Centros de Referência das Juventudes (CRJ) de Cariacica e Novo Horizonte (Serra)”. Disse, ainda, que “a definição da OSC que administrará o CRJ Novo Horizonte foi publicada na edição do Diário Oficial do dia 25 de julho, conforme previsto no edital nº002/2025, sendo selecionado o Instituto Ellos de Inclusão Social”. “Seguindo o que determina o edital, estamos na fase de análise do Plano de Trabalho para que o Termo de Colaboração entre a SEDH e a OSC selecionada seja assinado”, finaliza.