Ativista Layza Lima alerta para baixa participação e falta de comprometimento

Apesar dos avanços institucionais, a construção das políticas públicas LGBTQIA+ no Espírito Santo ainda enfrenta obstáculos importantes, especialmente nos municípios. É o que aponta Layza Lima, vice-presidenta do Fórum LGBTQIA+ da Serra e integrante do Conselho Estadual LGBT+, ao avaliar o processo de organização da Conferência Estadual LGBT, marcada para acontecer entre 1º e 3 de agosto.
As conferências municipais e estaduais fazem parte da etapa preparatória para a 4ª Conferência Nacional LGBTQIA+, que será realizada em Brasília entre 5 e 7 de setembro, após mais de dez anos de intervalo desde a última edição. O tema central da conferência nacional é “Construindo a Política Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+: por um Brasil sem LGBTI+fobia”.
No Espírito Santo, o processo já mobilizou parte da sociedade civil e continua ao longo de maio. A cidade da Serra sediará sua conferência no dia 17, no Centro Municipal da Juventude, em Jardim Carapina. No dia 24, será a vez de uma grande conferência regional reunindo representantes de 13 municípios do norte capixaba, como São Mateus, Pinheiros e Nova Venécia.
Layza destaca que o processo é descentralizado e democrático, exigindo a participação ativa da sociedade civil. “As políticas públicas não podem ser construídas dentro das gavetas das prefeituras ou do Congresso Nacional. Elas devem nascer da participação popular, efetivada por meio das conferências locais, estaduais e nacional. Esse é o papel do poder público: garantir esses espaços”, afirmou.
O objetivo é nortear as políticas públicas a partir das demandas identificadas pela população nos seus territórios, explica. As propostas aprovadas são a base para essa construção do novo Plano Nacional e para a atualização do Plano Estadual (vigente até 2026), no entanto, ela relata que esses espaços ainda registram baixa adesão em várias cidades capixabas. Apenas 70% dos municípios capixabas confirmaram participação até o momento – o que representa 56 das 78 cidades.
“Há uma baixa participação por parte dos municípios. Muitas prefeituras não estão se responsabilizando pela convocação e organização das conferências locais. Isso significa que os movimentos sociais precisaram assumir esse papel. Mas, sem o apoio institucional, a mobilização fica limitada”, afirma.
Em alguns casos, o cenário é de resistência política aberta. Ela cita o exemplo do município de Cariacica, onde um projeto de lei visa extinguir o Conselho Municipal LGBT, primeiro colegiado do tipo no Espírito Santo, criado em 2013. Diante do potencial impacto negativo da proposta, de autoria de Sérgio Camilo (União), entidades como o Conselho Estadual LGBT (CELGBT) e o Fórum Estadual LGBT se mobilizam para reverter o processo, considerado um retrocesso institucional, que vai na contramão dos direitos humanos e da própria realidade de violência enfrentada por esses grupos no município.
A dificuldade em articular as conferências locais está diretamente ligada à estrutura de gestão das políticas LGBTQIA+ nos municípios. Layza observa que, atualmente, poucos deles contam com coordenadorias, conselhos ativos ou servidores públicos com dedicação exclusiva à pauta. Em muitas cidades, sobretudo do interior, ainda não há previsão para a realização dos encontros.
“Quando um município não participa, há um apagamento das demandas daquela população LGBTQIA+. E isso enfraquece toda a política pública em nível estadual e nacional”, reforça. Ainda assim, a ativista celebra os avanços. “Temos conferências acontecendo em todas as regiões capixabas. O Espírito Santo, enquanto Estado, avançou na construção de um plano e no fortalecimento do Conselho Estadual, mas ainda falta capilarizar essas ações para os municípios. O plano estadual existe, mas não chegou na ponta”, lamenta.
A cidade da Serra é apontada por ela como um exemplo de comprometimento. “A Serra foi o primeiro município a convocar sua conferência por decreto. Desde 2021, temos avançado mesmo diante dos desafios. É o município com a maior adesão de população LGBT+ e expectativa de público de até 100 pessoas. Nossa conferência local tem como foco garantir o tripé da cidadania LGBT: conselho, fundo e coordenação municipal”, explica.
Para Layza, a conferência nacional será também um momento simbólico de reconstrução após os desmontes promovidos durante a gestão federal anterior, de Jair Bolsonaro (PL), marcada pela extinção e desarticulação de políticas públicas voltadas à população LGBT.
Apesar dos desafios enfrentados durante o o governo anterior, o Espírito Santo conseguiu se destacar como um dos poucos estados brasileiros com um Plano Estadual, consolidado em 2021, acompanhado por aproximadamente 40 comissões municipais e estaduais, em parceria com o Ministério Público (MPES). “Brasília grita por nós. Precisamos reconstruir o que foi destruído no governo de Jair Bolsonaro. A política nacional de direitos LGBTQIA+ precisa ser refeita, com base na diversidade dos nossos territórios”, ressalta.