Sexta, 26 Abril 2024

'Sofremos duplo preconceito', diz ativista indígena LGBTI+

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Aos 20 anos, o estudante Danilo Tupinikim é um dos fundadores do Tibira, um coletivo de indígenas LGBTI+, incluindo integrantes de várias etnias. Há dois anos, o jovem deixou sua aldeia de origem, Caieiras Velha, em Aracruz, norte do Estado, para cursar Ciências Políticas na Universidade de Brasília (UnB), capital do País.
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"Quando a gente vem para a cidade, para o contexto urbano, tem a necessidade de se autoafirmar a todo momento, principalmente porque enfrenta o racismo estrutural e institucional, além do choque cultural de estar na cidade", aponta. "Para mim, ser Tupinikim, indígena, é ser sempre resistência. E enquanto indígena e gay, a gente precisa ser muito resistente, ter muita força e se apegar a algo que acredita para conseguir seguir em frente", desabafa.

A saída do local de origem provoca muitas reflexões identitárias aos jovens indígenas. "Quando estamos dentro da aldeia não precisa a todo momento ficar se autoafirmando, a gente simplesmente é", aponta Danilo Tupinikim. Porém, na questão da sexualidade, ele não tinha referências dentro da aldeia e sofria com o preconceito. "Até então, achava que eu era o único gay do mundo", lembra em publicação feita pelo Tibira.

A saída da aldeia, no entanto, não acaba com a discriminação, pelo contrário. "Sofremos duplo preconceito". Por serem indígenas e LGBTI+. "Nos espaços urbanos muitos pensam e falam: 'Ué, nunca vi índio gay", relata. Ele aponta que predomina a imagem construída do indígena hétero, viril e que vive na mata.

Criado em maio de 2019, o coletivo Tibira tem, assim, a dupla missão de combater a discriminação nas cidades e também dentro das aldeias. O nome do grupo faz referência a um indígena tupinambá executado em praça pública no Maranhão em 1614, por sodomia, sendo considerado assim o primeiro caso de homofobia documentado no Brasil.

A página no Instagram @indigenaslgbtq, administrada pelo coletivo, reúne imagens e depoimentos de representantes de vários povos originários do Brasil e de outros países da América Latina sobre as questões de gênero e sexualidade. Integrantes do coletivo, entre eles Danilo, são entrevistados no documentário Terra Sem Pecado, que ajuda a explorar o tema a partir de diversos pontos de vista de diferentes etnias.

Além de dar visibilidade ao tema, outro objetivo do Tibira é levar informação e acolhimento também para quem está dentro das aldeias. Danilo Tupinikim lembra que é preciso lembrar que a sigla LGBTI+ inclui diversas identidades de gênero e orientações sexuais. Além dos gays, foco do documentário, existem as lésbicas, bissexuais, não-binárias, travestis e transexuais, sendo que ele aponta que estas últimas são as mais invisibilizadas e marginalizadas.

Dentro do movimento indígena nacional, o tema vem ganhando espaço, sendo incluído nos debates este ano online que aconteceram dentro da proposta do Acampamento Terra Livre, mais importante reunião anual comandada pela Articulação de Povos Indígenas do Brasil (Apib), a mais representativa a nível nacional para os povos originários. Também vem sendo discutidas a partir das novas mídias construídas pelas novas gerações indígenas como a Rádio Yandê e o Mídia Índia.

"A gente aos poucos está levando esse debate para dentro das comunidades. A questão LGBT é tabu nas comunidades e na sociedade, mas aos poucos vamos levando ela adiante. Sempre vai ter quem não aceite, mas estamos tendo feedbacks bem legais, de pessoas indígenas LGBT que estão mandando mensagens, montando seus coletivos. Está sendo bem legal, mesmo", relata o jovem.

No Espírito Santo, ele diz desconhecer que haja esse debate ou organização LGBT dentro das comunidades Tupinikim e Guarani, mas mantém contato com outros indígenas capixabas sobre como incluir essa pauta e levar informação para os LGBTI+ que vivem nas aldeias de Aracruz.

Danilo Tupinikim também manifesta sua preocupação com a grande invisibilidade da questão indígena no Espírito Santo, o que dificulta a implementação de políticas que apoiem essas comunidades. Além do Estado historicamente racista, ele aponta o impacto sofrido pelos grandes projetos industriais no entorno das aldeias de Aracruz, ligados sobretudo à indústria de celulose e subsidiárias, com grandes extensões de monocultivo de eucalipto sobre as terras ocupadas por povos originários.

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