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‘Uma coisa que não quero, de coração, é que tirem minha perna’

Viviane Rangel luta desde dezembro por uma internação hospitalar para tratar osteomielite e evitar amputação

Arquivo pessoal

A luta de uma jovem cadeirante para evitar a amputação de suas pernas pode estar próxima de um desfecho feliz. Nesta quarta-feira (17), está agendada uma consulta com infectologista do Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes (Hucam), em Maruípe, Vitória, de onde ela espera conseguir um leito no Sistema Único de Saúde (SUS) e ser internada para tratar uma infecção óssea (osteomielite crônica de fêmur bilateralmente) e evitar a medida extrema. 

A orientação de internação hospitalar foi feita em dezembro passado por um infectologista particular, depois de dois anos aguardando uma consulta via Sistema Único de Saúde (SUS). “Eu tinha iniciado o tratamento no Jayme [Hospital Dr. Jayme Santos Neves, em Laranjeiras/Serra, principal referência em Covid no Estado]. Eles me disseram que iriam me ligar para retornar depois que acabasse a pandemia, mas até hoje não me retornaram”, conta Viviane, que integra a Associação de Pais e Amigos dos Surdos e Outras Deficiências (Apasod), onde há anos atua na defesa dos direitos das pessoas com deficiência (PCD), entidade que se prepara para representar na Comissão de Cadeirantes do Espírito Santo, colegiado com o qual já colabora informalmente por meio da Apasod

A experiência com o ativismo social, no entanto, não a livra das agruras produzidas pela má gestão do SUS, que tanto fragiliza a vida e o bem-estar das populações mais vulneráveis. Viviane diz sentir como se as seguidas negativas para seu tratamento fossem uma estratégia cruel para lhe impor a amputação, o seu maior temor. “Eles poderiam tentar me cuidar primeiro. Eu já tenho quadro de depressão e eles vêm direto falando isso, eu tenho até medo de ir para o hospital. No Meridional me falaram isso a primeira vez, em dezembro. Parece que estão me fazendo sofrer tanto para chegar no dia e dizer que é só isso que vai me fazer parar de sofrer. Mas uma coisa que eu não quero, de coração, é que eles tirem minha perna. Porque mesmo eu sendo cadeirante, eu não vou querer que ninguém me veja assim”, roga.

Judicialização

Passados oito meses desde a indicação de internação e o alerta para o risco de amputação, ela já tentou atendimento na Santa Casa de Misericórdia, onde foi encaminhada para o Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE – antigo São Lucas). Em ambos, a negativa permaneceu. Foi somente com uma sentença judicial que ela conseguiu agendar uma consulta com o especialista do Hucam. “A doutora Mônica [advogada Monica Receputi Duarte] está me ajudando muito. Era para ela tratar só do meu divórcio, mas ela decidiu me ajudar com a internação também”. 

A sentença emitida no dia 8 de agosto pela juíza Ilaceia Novaes, 1º Juizado Especial Criminal e Fazenda Pública da Comarca da Capital em Vila Velha, determinou ao Estado e ao município de Vila Velha que realizem a internação hospitalar “no prazo máximo e improrrogável de cinco dias (…) para tratamento cirúrgico – osteomielite crônica, em unidade da rede pública hospitalar de saúde ou, na impossibilidade de fazê-lo, que providencie a internação na rede particular de saúde, custeando os procedimentos necessários”. 

A informação obtida no Hospital Metropolitano, onde ela recebeu o documento para fazer a consulta no Hucam, no entanto, é que a infectologista, se concordar com o diagnóstico de dezembro e lhe der o pedido de internação, o mesmo deve ser levado a uma unidade de pronto-socorro ou Pronto Atendimento (PA), onde será definido onde e quando ela poderá ocupar um leito hospitalar. “Olha como eles ficam me jogando de um lado para o outro. Era para eu ter sido internada no dia 13, mas ainda vou fazer uma consulta e não tenho certeza se vou conseguir. Estou tomando antibiótico via oral há mais de dois meses e não melhora a infecção. Como é que não desiste de viver desse jeito?”, suplica. 

Em Vila Velha

“Eu ficaria feliz sendo tratada, tomando antibiótico na veia e não oral. Eu quero ter minha saúde de volta, ter dignidade, porque isso é muito sofrimento. É dor, eu não consigo dormir por causa das dores. Estou tomando codeína, dipirona, paracetamol, tudo que é remédio forte”, diz, ressaltando que, durante todo esse tempo sem atendimento adequado, ela adquiriu outros problemas de saúde: pedra na vesícula, nódulos no seio e na garganta e anemia, todos igualmente tratados de forma incompleta.

“Ortopedista ainda não saiu, pedra da vesícula ainda não saiu. Para o nódulo, a médica pediu outra ultrassom no dia 18. No posto que eu consulto aqui em Vila Batista [Vila Velha], nem ginecologista para acompanhar nódulo no seio tem. Fui na clínica-geral. Também não tem agente de saúde”, reclama. 

Sua esperança é que a internação aconteça rapidamente e em um hospital em Vila Velha. “O Hospital Evangélico é aqui perto de casa e é referência! Fez o primeiro transplante de osso no Estado, para tratar osteomielite, em 2015! O Hucam é muito longe, o Jayme também. Eu tenho dificuldade para pagar a passagem. Meu pai que sempre me ajudou, está desempregado, a minha mãe tem câncer e ela que acaba ficando comigo. Eu só tenho o BPC [Benefício de Prestação Continuada, concedido pelo Instituto Nacional do Seguro Social]. Gasto muito com remédio, muito mesmo. Vai no supermercado, não sai com muita coisa. Tem gás, tem luz. É muito difícil”, relata.

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