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‘Todos os dias alguém me pede ajuda para entender o que está acontecendo’

Jovem subiu à Tribuna Popular da Câmara de Santa Maria de Jetibá em busca de informações sobre TAG do Tribunal de Contas

Reprodução

O último adiamento da assinatura do Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) proposto pelo Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCE-ES), inicialmente previsto para essa terça-feira (31), não arrefeceu a mobilização popular dentro do município de Santa Maria de Jetibá, na região serrana, contra o acordo. 

Exemplo foi a participação do jovem Johnwilas Berger de Freitas na tribuna livre da Câmara Municipal, na segunda-feira (30), levando aos vereadores questionamentos que ele tem recebido por parte de centenas de ex-colegas do ensino médio e seus familiares. “Todos dias alguém me pede ajuda pra entender o que está acontecendo. Mas é complicado você explicar algo que nem você consegue entender, porque não tem informação suficiente sobre isso”, disse, durante sua fala de quase dez minutos ao final da sessão.

Ex-estudante da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (EEEFM) Graça Aranha, próxima ao centro da cidade e uma das mais ameaçadas pelo TAG, Johnwilas citou o Barão de Montesquieu para chamar atenção sobre a tentativa de ludibriar a população embutida no acordo da Corte de Contas. 

“Falaram muito [os secretários de educação do Estado e do município], mas não falaram nada. Falaram que o TAG não existe, que não foi assinado… Mas se não existe, porque tem tantas reuniões acontecendo sobre isso? ‘A pior injustiça é aquela que se exerce à sombra das leis e com as cores da justiça’. É muito fácil ludibriar todo um povo quando você faz com que ele acredite que está usando a lei a seu favor, que você está certo. E é complicado que as pessoas entendam a complexidade de tudo o que está acontecendo”, ponderou. 

Johnwilas atualmente é estudante universitário, cursando uma graduação em Jogos Digitais em formato de Educação à Distância (EAD). Sua saída da Graça Aranha se deu muito recentemente, em dezembro passado, por isso continua sendo uma referência importante para a comunidade escolar do colégio, um dos maiores do município. 

“Durante meu tempo de escola, sempre fui muito ativo. Eu e minha namorada [Tamiles Gomes Pereira] demos início à formação do grêmio estudantil, nos últimos dois anos. Eu saí e ela continua trabalhando nisso. Por conta desse trabalho, a gente teve acesso a figuras políticas importantes, como o governador e o secretário de Educação, que paravam para ouvir nossas opiniões, em eventos do governo em Vitória. A gente foi então estruturando uma rede de comunicação mais aberta dentro da Graça Aranha, entre a diretoria e os alunos. Isso a partir de um novo diretor, que permitiu essa abertura e começou a solucionar problemas antigos, como decisões que os professores tomavam sem consultar os alunos e que afetavam nosso desempenho, ou mesmo a forma muito autoritária de falar com a gente. Daí surgiram líderes de turma e a coisa foi crescendo”, relata.

Democracia 

Essa experiência estudantil de representar um coletivo e lutar pelos direitos de várias pessoas lhe permitiu ter uma percepção bastante prática e próxima da democracia representativa. “O povo tem a necessidade de que alguém faça algo por eles. Porque para toda uma nação se unir e fazer alguma coisa, precisa de alguém falar por eles. Não dá, por exemplo, para juntar 40 mil pessoas [a população de Santa Maria de Jetibá é estimada em 41 mil pessoas em 2020] para falar aqui na Câmara, não cabe! Por isso estamos aqui, por isso as pessoas cobram da gente”, explicou.

O TAG do TCE-ES, por sua, vez, “vai contra a democracia”, sublinhou. Por impor medidas que não respeitam as necessidades das pessoas mais diretamente atingidas, que são os estudantes e suas famílias e os professores, além do próprio orçamento da prefeitura. Vai também “contra o Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, que afirma que crianças e adolescentes têm direito ao ensino público mais perto da sua casa. Então por que isso [o TAG]?”, finalizou, sob aplausos dos presentes. 

O líder estudantil conta que o convite para falar foi da vereadora Ivone Schliwe (PDT), quem iniciou o debate sobre o assunto no legislativo municipal. “Fomos eu e minha namorada atrás da Ivone em busca de informações, para ajudar as pessoas que estavam me perguntando”. 

A vereadora admite que ficou surpresa com a potência do discurso dos jovens. “São jovens muito inteligentes, sabem o que estão falando. Vieram com uma pauta pronta, como se fossem meus assessores voluntários. Sugeri que eles mesmo falassem aos vereadores”. 

Johnwilas diz que a experiência foi válida, apesar de não ter conseguido levantar mais informações sobre o assunto com a Câmara, tendo mais é compartilhado dúvidas. “É imprescindível esse espaço para que a população possa ser ouvida. Continuo correndo atrás disso, para mudar o curso dessa história. Transferir o fundamental 1 para o município, sim, pode acontecer, mas desde que seja bem planejado, não de forma repentina como está”. 

Desde a tribuna livre, ele continua recendo pedidos de ajuda, com um pouco menos de intensidade, e tem descoberto aspectos importantes do caso, como por exemplo, os questionamentos sobre a legitimidade do Tribunal de Contas propor mudanças na gestão da Educação, conforme estabelece o TAG. 

Uma das entidades a questionar a legalidade dessa ação é a União Nacional dos Conselheiros Municipais de Educação no Espírito Santo (Uncme/ES), cujo presidente, Júlio César dos Santos, foi convidada a falar aos vereadores, a pedido de Ivone Schliwe. “Essa ameaça do Tribunal de Contas não acabou ainda, eles só adiaram mais uma vez. E esse adiamento para mim é só um ‘cala a boca’ momentâneo. Vamos continuar mobilizados”, declarou. 

Centro de Educação da Ufes

Na última sexta-feira (27), o Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (CE/Ufes) também se manifestou dessa forma em uma nota pública, citando nota de repúdio publicada anteriormente pelo Comitê Estadual de Educação do Campo (Comeces).

O posicionamento, expõe o diretor do centro, Reginaldo Célio Sobrinho, que assina o documento, se baseia em cinco argumentos: “a não competência do TCE-ES, como órgão técnico auxiliar do poder legislativo, para decidir sobre políticas públicas”; “o alijamento dos poderes executivo e legislativo nas decisões estabelecidas no TAG; a repercussão negativa do Termo sobre os recursos disponíveis nos municípios para Educação “e na capacidade de municípios cuidarem da manutenção de suas escolas, especialmente as localizadas em comunidades campesinas”; “a não competência do TCE-ES para impor aos mandatários eleitos por voto popular quaisquer ações, em especial as que não violam leis referentes à aplicação de recursos públicos”; e “a extrapolação do TCE-ES em sua finalidade, quando se propõe a alterar a organização escolar, seus fluxos internos, objetivos, abrangência e finalidades, com importantes impactos na oferta educacional, nos currículos praticados, no trabalho docente e na própria organização das famílias para garantir a permanência das crianças, adolescentes, jovens e adultos na escola”.

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