Afirmação é do vice-prefeito, Júnior Corrêa, que falou sobre processo contra BRK

Em coletiva de imprensa realizada nesta sexta-feira (5), o vice-prefeito de Cachoeiro de Itapemirim (sul do Estado), Júnior Corrêa (Novo), e o diretor-presidente da Agência Municipal de Regulação de Serviços Públicos Delegados (Agersa), Vilson Coelho, falaram sobre a ação judicial contra o 14º termo aditivo contratual firmado com BRK Ambiental, concessionária dos serviços de água e esgoto da cidade. Na ocasião, Corrêa afirmou que o aumento da tarifa do serviço no município se baseou em um “laudo forjado”, e que “muitas regras não estavam sendo cumpridas” pela empresa.
Nessa terça-feira (2), a desembargadora Janete Vargas Simões, do Tribunal de Justiça do Estado (TJES), determinou a suspensão dos efeitos do 14º termo aditivo, incluindo aumento da tarifa. A decisão atende parcialmente a um agravo de instrumento do Ministério Público do Estado (MPES). A gestão do prefeito Theodorico Ferraço (PP) estima que a redução da tarifa pode chegar a mais de 10%.
Também estavam presentes na entrevista, realizada no Palácio Bernardino Monteiro, no Centro de Cachoeiro, os vereadores Vitor Azevedo (Podemos), Thiago Neves (PSB), Sandro Irmão (PDT) e Delandi Macedo (PSDB) – este último, líder do governo na Câmara. Existe a possibilidade de abertura de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) na Câmara para apurar as supostas irregularidades envolvendo a BRK Ambiental. Além disso, Vitor Azevedo protocolou um requerimento no Procon para que o aumento abusivo seja revertido em descontos para a população.
Corrêa destacou que, em 2023, quando ele ainda era vereador, a proposta de contrato aditivo com a BRK Ambiental chegou para avaliação na Câmara com um parecer que apontava que o 14º aditivo era positivo para o poder público. Esse estudo, na verdade, era uma nota técnica da própria Agersa. Entretanto, logo que a nova gestão assumiu a administração municipal, foi identificado que havia um estudo feito por uma empresa de consultoria, a Houer Concessões, que apontava o exato oposto – ou seja, que, na verdade, seria necessário abaixar o valor da tarifa em 7,6%.
Vilson Coelho afirmou que a Agersa não poderia fazer um estudo paralelo sobre a tarifa, pelo fato de a sua atribuição ser direcionada à fiscalização do contrato de concessão, tendo o dever, portanto, de manter distância em relação às partes envolvidas. Ele afirmou ainda que, logo que assumiu o comando da Agersa, no início do ano, percebeu que havia um desconto mensal de R$ 150 mil da agência, bastante prejudicial aos cofres públicos.
Esse valor se refere ao acordo feito com a gestão do então prefeito Victor Coelho (PSB). Em troca da antecipação do valor de outorga pela exploração do serviço, de R$ 15 milhões, a prefeitura permitiu que a concessionária descontasse R$ 150 mil mensais por 100 meses do valor ordinariamente devido. O MPES apontou que a operação foi uma forma de escamotear um “empréstimo”.
“Nós entramos em contato com a empresa que fez o estudo, a Houer, pedindo para atualizar, porque o que colocaram de reequilíbrio financeiro da concessão foi em relação a 2022. Estamos pedindo para que atualize para 2024. E a partir daí a gente vai avaliar o que efetivamente está impactando na tarifa, quanto tem que ter de redução, e fazer uma avaliação do que foi arrecado de adicional e o que não foi realizado em termos de investimento”, afirmou Vilson.
Júnior Corrêa contemporizou, em parte, dizendo que a BRK, junto a outras empresas que operaram a concessão dos serviços de água e esgoto em Cachoeiro, “conseguiram muitos avanços”, e o município não tem os mesmos problemas que outras cidades capixabas, como períodos de desabastecimento de água e ocorrência de água suja nas torneiras.
Mesmo assim, argumentou que a empresa deixou de fazer investimentos importantes, o que se reverbera em críticas da população à qualidade dos serviços. Ele disse ainda que é de conhecimento público que a Brookfield, multinacional canadense que controla a BRK Ambiental, tem estimulado a redução de investimentos no Brasil.
Vilson acrescentou a informação de que a BRK quase dobrou seu lucro líquido anual de 2023 para 2024, subindo de R$ 18 milhões para R$ 30 milhões, conforme balanços da própria concessionária. Em sua visão, esse aumento revela que a empresa não está investindo o suficiente nos serviços públicos. O vereador Vitor Azevedo destacou também que o recente despejo irregular de esgoto no rio Itapemirim se deve à falta de manutenção do encanamento do município.
O diretor-presidente da Agersa explicou ainda que os dados normalmente publicizados pela BRK Ambiental, dando conta de que mais de 98% do município contaria com rede de água e esgoto regular, se baseia em “imperfeições” na fórmula de cálculo. Algumas localidades do município nem sequer possuem fornecimento de água tratada, dependendo de caminhões-pipa para abastecimento.
“Se a gente calcular a partir de quilometragem de rede, que é o que a gente utiliza lá na Agersa, chegamos a algo em torno de 88% ou 89% do território do município atendido. Aí sim a gente tem um retrato da realidade. Por exemplo, 4,8 mil economias [imóveis] da cidade jogam esgoto no rio”, afirmou.
Além disso, apesar dos quase 30 anos de concessão dos serviços de água e esgoto em Cachoeiro, boa parte do encanamento implementado pela concessionária é composto por redes mistas, ou seja, há o compartilhamento de drenagem com esgoto. Com isso, nos períodos de chuva, o esgoto dessas redes é escoado diretamente para o rio Itapemirim.
‘Inconsistência’ e ‘desobediência’
Questionado sobre qual foi o destino dos R$ 15 milhões adiantados pela BRK Ambiental para a Prefeitura de Cachoeiro, Júnior Corrêa sorriu ironicamente, e disse que todos os dados foram compartilhados com o Ministério Público do Estado, que está tomando as devidas providências. Segundo ele, o contato assinado indicava uma conta específica onde os recursos, em tese, seriam depositados, e que agora cabe “investigar” o que houve.
Júnior e Vilson também foram perguntados sobre a possibilidade de haver irregularidades nas demais concessões públicas do município, relacionadas a transporte público e estacionamento rotativo, além da parceria público-privada no setor de iluminação. Os dois não entraram em detalhes, mas o vice-prefeito afirmou que “todas as concessões têm algum tipo de inconsistência”, e o diretor-presidente da Agersa se colocou à disposição para tratar dos assuntos com a imprensa em outras oportunidades.

Vilson também foi questionado sobre a situação envolvendo a construção de um aterro pela BRK Ambiental no rio Itapemirim. Segundo ele, a BRK Ambiental “desobedeceu” uma ordem expressa para não iniciar as obras antes da análise da Agersa.
Apesar de a competência para dar as licenças ser da Agência Estadual de Recursos Hídricos (Agerh) e do Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema), o diretor-presidente da Agersa argumentou que qualquer intervenção envolvendo a concessionária deve passar pelo crivo da autarquia.
Os problemas relacionados à BRK Ambiental geram desgaste direto para o prefeito anterior de Cachoeiro. Atualmente, Victor Coelho é secretário estadual de Turismo, sendo cotado como candidato a deputado estadual no ano que vem.
‘Empréstimo’
O 14º aditivo ao contrato de concessão, que teve início em 1998 durante gestão anterior de Theodorico Ferraço, permitiu o reajuste na tarifa para o consumidor em 4%, e também previu R$ 122,7 milhões de investimentos no serviço e pagamento de R$ 15 milhões por antecipação de outorga – ou seja, valor pago antecipadamente pela BRK Ambiental à Prefeitura de Cachoeiro em decorrência da exploração do serviço. Entretanto, o MPES considera que o aumento foi ilegal, e resultou em faturamento estimado de cerca de R$ 30 milhões para BRK Ambiental.
De acordo com o MPES, em 2022, a empresa Houer Concessões, consultoria contratada pela própria prefeitura, elaborou parecer indicando que a Taxa Interna de Retorno (TIR) efetivamente obtida pela concessionária era de 19,34%, valor superior à TIR original contratual de 18,82%. Segundo a Houer, seria necessário aplicar um desconto linear de 7,6% nas tarifas até o final da concessão para restabelecer o equilíbrio financeiro do contrato.
Mesmo assim, sem justificativa formal, o acordo para reequilíbrio do contrato foi arquivado em 27 de fevereiro de 2024 pela Agersa, “sob a justificativa de que o 14º Termo Aditivo havia sido pactuado por meio de acordo firmado entre o Município e a Concessionária”, segundo o MPES.
Paralelamente aos trâmites do acordo, o então secretário interino de Governo, Thiago Bringer, também procurador-geral do município, requereu a inclusão da antecipação de outorga devida no valor de R$ 15 milhões no procedimento de revisão e reequilíbrio contratual. O MPES classificou a medida como uma forma de escamotear um “empréstimo” para a administração municipal.
No processo, a BRK Ambiental alegou que os estudos da Houer “padecem de defeitos graves”, e que o aumento da tarifa baseou-se em estudos técnicos válidos e internos da própria Agersa, conforme nota técnica de 2023. Além disso, segundo a concessionária, o aditivo possui uma cláusula de quitação mútua, no qual desistiu de todos os seus pleitos à Prefeitura de Cachoeiro. O cancelamento do acordo obrigaria as partes a renegociarem, uma vez que existe, na verdade, um desequilíbrio em seu favor de R$ 10 milhões.