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Entidades acionam STF contra lei que autoriza veto a aulas sobre gênero

ADI aponta “grave violação à Constituição” e requer suspensão da medida

Fabio Rodrigues-Pozzebom/ABr

A Aliança Nacional LGBTI+, a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH) e o Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (Fonatrans) protocolaram, nesta terça-feira (22), uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a lei capixaba que permite que pais ou responsáveis vetem a participação de seus filhos em atividades pedagógicas que envolvam identidade de gênero, orientação sexual, diversidade e temas relacionados. O processo foi autuado com o número ADI 7847 e está sob relatoria da ministra Cármen Lúcia.

A proposta originária do Projeto de Lei 482/2023, de autoria do deputado Alcântaro Filho (Republicanos), foi aprovada em plenário no mês passado e promulgada pela Assembleia Legislativa, após o governador Renato Casagrande (PSB) se omitir e perder o prazo para sanção ou veto. Na petição, as entidades sustentam que a lei representa uma grave violação à Constituição Federal. “O que se perde com a censura não tem equivalente, já que nada há a ponderar contra os direitos fundamentais à liberdade de expressão, de ensino e de aprender, que sofrem restrição intensa pela lei em razão de preconceitos de pais ou responsáveis”.

Presidente da Fonatrans, Jovanna Baby também aponta os impactos diretos da medida: “Vetar a discussão de gênero e identidade de gênero nas escolas é contribuir de forma perversa e cruel para o Brasil seguir na dianteira do feminicídio e transfeminicídio. Há um genocídio da população trans no Brasil. Afinal, somos o país mais transfóbico do mundo. A falta de educação e conhecimento assassina, ano após ano, mais de 200 pessoas por sua identidade de gênero”, pontuou.

Fonatrans

Na ação, as entidades afirmam que a lei viola dispositivos centrais da Constituição, como os artigos 22, 206 e 220. Segundo a petição, a lei “representa censura legislativa”, pois interfere diretamente na liberdade de cátedra e nas concepções pedagógicas de professoras e professores, “proibindo até mesmo que jovens LGBTI+ tenham acesso a aulas que abordem sua própria existência”.

As entidades argumentam que o texto capixaba também “viola o dever constitucional do Estado de agir positivamente para a promoção da igualdade de gênero e de orientação sexual”, conforme reconhecido pelo STF na ADI 5668.

Para os autores da ação, a medida abre ainda brechas perigosas: “Se for permitido que pais proíbam seus filhos de assistir a conteúdos obrigatórios, logo teremos leis que permitem verdadeiros cardápios ideológicos, em que pais antivacina removerão filhos de aulas de biologia ou pais terraplanistas os afastarão de aulas sobre o formato da Terra”.

Além da inconstitucionalidade formal – por usurpar a competência exclusiva da União para legislar sobre diretrizes da educação -, a ação também denuncia a inconstitucionalidade material da lei. “Fere o direito de ensinar e ser ensinado da criança e do adolescente ao proibir o acesso dos jovens à educação por preconceito de seus pais ou responsáveis. O poder familiar deve sempre zelar pelo melhor interesse da criança”, destacam.

A petição lembra ainda que o STF já declarou inconstitucionais outras normas estaduais com teor semelhante, como as leis “Escola Sem Partido” ou que proibiam o uso de linguagem neutra. “Leis que tentam censurar discursos nas escolas foram invalidadas justamente por violarem o princípio da dignidade humana, da liberdade de expressão e do pluralismo pedagógico”, pontuam as entidades.

Em outro trecho, afirmam que a norma capixaba “subverte a ideia de lei para torná-la palatável a uma sociedade amedrontada pelo pânico moral que os próprios grupos reacionários instigam”. Elas rejeitam a tese de que o ensino de gênero seria uma forma de “doutrinação”: “Ninguém se torna LGBTI+ por influência. Se essa lógica fosse verdadeira, não existiriam mais pessoas LGBTI+ no Brasil após a criminalização por morte na fogueira que vigorou até 1830”.

A ação pede que o STF suspenda imediatamente os efeitos da lei por meio de medida cautelar e, no mérito, declare sua total inconstitucionalidade. “Não se pode tolerar que, por temores subjetivos e preconceitos, se impeça o acesso de crianças e adolescentes a uma educação inclusiva, plural e baseada em direitos humanos”, afirmam.

Para as organizações, trata-se de “uma lei fundada na ideologia cisheteronormativa e machista, que afirma a superioridade do homem sobre a mulher, da heterossexualidade sobre outras orientações, e da cisgeneridade sobre outras identidades de gênero”.

“Infelizmente, esses projetos flagrantemente inconstitucionais continuam nas câmaras municipais e assembleias legislativas, um gasto de dinheiro público de maneira irresponsável para fins eleitoreiros, mesmo sabendo que as leis serão declaradas inconstitucionais. Isso precisa acabar”, critica Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBTI+ e da ABRAFH. A advogada e coordenadora jurídica das entidades, Amanda Souto Baliza, afirmou que a cada nova tentativa de retrocesso haverá reação: “Para cada lei inconstitucional, ingressaremos com uma nova ação”, reforçou.

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