A juíza Telmelita Guimarães Alves, da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual, concluiu a análise das preliminares apresentadas pelos réus na ação de improbidade administrativa sobre o esquema de fraudes e irregularidades que desvio cerca de R$ 38 milhões dos cofres públicos estaduais. A operação, batizada com o nome de Pixote, investigou fraudes nos contratos entre o Instituto de Atendimento Socioeducativo (Iases) e a Associação Capixaba de Desenvolvimento e Inclusão Social (Acadis). Depois de analisar os pedidos dos réus, o juízo da 3ª Vara vai decidir pelo recebimento ou não de ação contra os envolvidos nas fraudes.
A operação, deflagrada em 17 de agosto de 2012, resultou na prisão de 13 pessoas da cúpula do Iases e da Acadis, o que incluiu a então diretora-presidente da autarquia, Silvana Gallina, e o diretor-executivo da Acadis, Gerardo Bohórquez Mondragón. O escândalo culminou com a exoneração do então secretário de Estado de Justiça, Ângelo Roncalli, que ocupava o cargo desde a gestão do governo Paulo Hartung (PMDB). Ele também responde à ação de improbidade administrativa pelas fraudes nos contratos.
Na ocasião da prisão de Silvana Gallina, assumiu a direção da autarquia Leonardo Grobbério, que ficou no cargo até abril de 2013, quando foi sacado do posto para dar lugar a Lindomar José Gomes, que por sua vez seria substituído pelo delegado de Polícia Civil, Leandro Piquet em janeiro deste ano. Em 11 de abril deste ano, um dia após a morte por espancamento do adolescente Leonardo de Jesus das Virgens na Unidade de Atendimento Socioeducativo da Região Norte, em Linhares, o delegado deixou o comando do Iases, que passou a ser dirigido pela assistente social Ana Petronetto.
Na decisão, a magistrada a magistrada, de acordo com a Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), recebeu a inicial em face de todos os réus da ação, sendo que alguns deles questionaram pontos da ação civil movida pelo Ministério Público Estadual (MPES).
A ex-diretora financeira do Iases, Danielle Merisio Fernandes Alexandre questionou a legitimidade do MPES para perseguir indenização por dano moral. A alegação de Danielle foi refutada pelo juízo, que argumentou que dentre as funções institucionais do Ministério Público está incluída a de promover a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.
As defesas do ex-secretário de Justiça, Ângelo Roncalli; Gerardo Mongragón; Edna Lúcia Gomes de Souza, ex- assessora técnica da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República; , Euller Magno de Souza, ex-diretor do Centro Socioeducativo (CSE) de Cariacica ; e Fabrício Lopes da Silva pretendiam o reconhecimento da ilegitimidade passiva de seus clientes. A juíza considerou que o pleito da defesa diz respeito ao mérito da ação, o que não estava sendo analisado no momento.
Além disso, a juíza reforça que, independentemente da efetiva ocorrência do dano, que deverá ser apurado no curso do processo, a partir da instrução probatória, as partes são legítimas quando as situações jurídicas das mesmas, consideradas in status assertionis (à luz da afirmação).
Na decisão, a magistrada considerou que a prova documental revelou elementos de qualidade que apontam, em tese, para a ocorrência dos atos de improbidade administrativa que importaram prejuízo ao erário e violação aos princípios da administração pública. “É preciso, portanto, analisar com mais cuidado, o que é possível com a instrução probatória, se realmente houve a prática de ato de improbidade, ainda mais considerando o valor vultoso dos contratos entabulados baseados em inexigibilidade de licitação”, diz a decisão.
A magistrada considerou que os elementos probatórios levados pelo MPES são suficientes para admitir os termos da ação para que se possa, no futuro, aferir com exatidão a conduta e a responsabilidade dos envolvidos.
Réus
Entre os acusados de participação nas fraudes estão o ex-secretário de Justiça Ângelo Roncalli, a ex-diretora presidente do instituto Silvana Gallina, e o diretor da Acadis, o colombiano Gerardo Bohórguez Mondragón. Foram denunciados ainda: Antônio Haddad Tápias (ex-diretor técnico do Iases), Danielle Merísio Fernandes Alexandre (ex-diretora administrativa e financeira do Iases – ela pediu exoneração do cargo em 2010 para assumir outros compromissos profissionais), André Luiz da Silva Lima (assessor da Acadis e sócio no Inbradese, juntamente com Mondragón), Liliane Carlesso Miranda (assessora jurídica da Acadis), Edna Lúcia Gomes de Souza (assessora técnica Acadis) e Marcos Juny Ferreira Lima (funcionário da Acadis).
Constam ainda os denunciados Ricardo Rocha Soares (conselheiro fiscal da Inbradese, diretor da Acadis e diretor da unidade em Linhares), Euller Magno de Souza (procurador da Acadis), Ana Rúbia Mendes de Oliveira (diretora administrativa e financeira da Acadis), Tatiane Alves de Mello (diretor de projetos da Acadis), Douglas Fernandes Rosa (presidente do Conselho de Administrativa da Acadis), além dos sócios da Buffet e Restaurante Paladar Ltda ME (Alexandre da Rocha Soares, Frederico Teixeira da Silva, Fabiana Teixeira da Silva e Maria Fernandes de Abreu e Silva); Fabrício Lopes da Silva; e Keila Zucatelli.
Laudo
O laudo pericial contábil, elaborado pelo Departamento de Criminalística, da Superintendência de Polícia Técnico-Cientifica (SPTC) da Polícia Civil por solicitação da força tarefa que apura violação de direitos humanos e ilegalidades no Iases constatou que as empresas contratadas para prestar serviços à Acadis foram contratadas ao valor muito além do referencial de mercado.
O rombo nos cofres públicos por conta dos desvios pode passar dos R$ 50 milhões.
Uma dessas empresas era o Buffet e Restaurante Paladar, que na época das investigações a polícia descobriu que estava em nome de laranjas. A empresa recebeu pelo contrato com a Acadis para fornecimento de alimentação aos internos da unidade de Cariacica, num período de sete meses, R$ 588 mil. No entanto, o valor referencial para este tipo de contato, adotado pela Secretaria de Estado de Gestão e Recursos Humanos (Seger), era de R$ 258.257,74, ou seja, a empresa fora contratada por 329.742,26 acima do valor referencial.
A mesma empresa foi contratada para o fornecimento de alimentação nas unidades de Linhares pelo astronômico valor de R$ 1 milhão, também no intervalo de sete meses. Mais que o dobro do valor referencial, que era de R$ 442.079,67.
Para se ter uma ideia da majoração, o valor pago a atual empresa pelo mesmo serviço é quase metade do pago à Paladar. Sem contar que a atual empresa fornece um número maior de refeições. Se a Paladar fosse contratada pelos valores de hoje, o montande pago em sete meses (R$ 588 mil) cairia para menos de R$ 200 mil, ou seja, um terço do valor pago.
A empresa da família do deputado estadual Josias Da Vitória (PDT) – Capixaba Assessoria Empresarial, para os serviços de manutenção e limpeza e locação de motorista – também foi contratada por valor acima do de mercado. Para prestar serviço de manutenção e limpeza nas unidades de Cariacica, a empresa recebeu R$ 199.476,83, sendo que o valor referencial é R$ 174.179,88.
Para o serviço de locação de motorista, o contrato foi de R$ 305.503,81, R$ 64.522,94 a mais do que o valor referencial, que é de R$ R$ 240.980,87.
Intervenção
A intervenção nos contratos entre Iases, Acadis e o Instituto Capixaba de Integração Socioeconômica dos Cidadãos (Icisec) foi prorrogada até 15 de setembro deste ano.
A expectativa era que a intervenção terminasse no dia 18 de março último, prazo estipulado pela juíza Marianne Júdice de Mattos para que o Iases finalizasse o processo de licitação para a escolha da entidade que vai realizar a gestão do Centro Socioeducativo de Atendimento ao Adolescente em Conflito com a Lei (CSE), em Cariacica, e das Unidades de Atendimento Socioeducativo da Região Norte, em Linhares, geridas pela Acadis; e Unidades de Atendimento Socioeducativo da Região Sul, em Cachoeiro de Itapemirim, geridas pelo Icisec.