Ângelo Martins Denicoli e mais seis pessoas poderão responder por cinco crimes
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, marcou para a próxima quinta-feira (24) os interrogatórios dos sete réus do chamado Núcleo 4, acusados pela Procuradoria Geral da República (PGR) de serem responsáveis pelas operações estratégicas de desinformação e pela cooptação de autoridades militares para impedir a posse do presidente Lula. Um dos interrogados será o major da reserva do Exército, Ângelo Martins Denicoli, residente em Colatina, no noroeste do Espírito Santo.

Os demais são o capitão reformado do Exército, Ailton Gonçalves Moraes Barros; o engenheiro e presidente do Instituto Voto Legal, Carlos César Moretzsohn Rocha; o subtenente do Exército, Giancarlo Gomes Rodrigues; o tenente-coronel do Exército, Guilherme Marques de Almeida; e o policial federal e ex-membro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Marcelo Araújo Bormevet.
Os sete poderão responder por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. As penas máximas combinadas ultrapassam 43 anos de prisão.
As testemunhas de defesa do Núcleo 4 foram ouvidas nessa quarta-feira (16). Na ocasião, segundo o jornal Estadão, houve questionamento sobre uso software do FirstMile, sistema de monitoramento que teria sido usado por servidores da Abin para espionar autoridades brasileiras e favorecer o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A denúncia contra o Núcleo 4 foi recebida pelo STF em seis de maio. Ângelo foi notificado oficialmente no dia 22 de fevereiro e, como os demais, apresentou defesa prévia, alegando “ausência de justa causa e inépcia da denúncia”. No entanto, essas alegações foram refutadas pela PGR, que defendeu a continuidade da ação.
Segundo a Procuradoria, a organização criminosa da qual esses denunciados fariam parte era composta por 34 pessoas e liderada por Bolsonaro. O grupo teria atuado entre julho de 2021 e janeiro de 2023, com o objetivo de impedir a posse de Lula e manter Bolsonaro no poder por meios ilegais. Alexandre de Moraes afirmou que os denunciados devem ser julgados com base nos artigos 29 (concurso de pessoas) e 69 (concurso material) do Código Penal.
‘Figura-chave’
A Procuradoria descreve a organização como estruturada em ordem hierárquica, com divisão de tarefas preponderantes. Ângelo Denicoli é identificado como uma figura-chave na ligação entre o Instituto Voto Legal (IVL) e o influenciador argentino Fernando Cerimedo, responsáveis pela produção e divulgação de relatórios falsos contra o sistema eleitoral.
Mensagens recuperadas pela Polícia Federal (PF) indicam que Alexandre Ramagem Rodrigues, já denunciado no núcleo 1 da investigação, contava com Denicoli para elaborar conteúdos de desinformação. Carlos César Rocha, presidente do IVL, confirmou ter participado de reunião com Denicoli, na qual teria sido elaborado o relatório falso apresentado por Fernando Cerimedo em live.
A defesa de Ângelo Denicoli, representada pelo advogado Zoser Plata Bondim Hardman de Araújo, alegou tentativa de responsabilização indevida por atos de terceiros, sem a devida individualização de conduta. Segundo a defesa, a principal acusação contra ele – o fornecimento de conteúdo falso para a live de Cerimedo – se baseia apenas em um print de Twitter e um documento de 150 KB criado após a transmissão. O advogado classificou a acusação como “genérica e superficial” e denunciou “excesso acusatório”.
‘Ação progressiva e ordenada’
O relator Alexandre de Moraes afirmou que os autos indicam o envolvimento consciente dos denunciados em uma estrutura hierarquizada e coordenada. “A natureza estável e permanente da organização criminosa é evidente, em sua ação progressiva e coordenada de julho de 2021 a janeiro de 2023”, destacou.
Ele também relembrou a existência do chamado “gabinete do ódio”, responsável por disseminar notícias fraudulentas e atacar instituições como o STF, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a confiabilidade das urnas eletrônicas. Moraes aponta que a atuação do grupo denunciado nesta etapa envolveu a infiltração de uma célula paralela dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), composta por policiais federais cedidos e oficiais de inteligência, sob o comando de Alexandre Ramagem. Essa estrutura operava como uma central de contrainteligência da organização criminosa, utilizando recursos da Abin para produzir e espalhar desinformação contra adversários políticos.
Por unanimidade, os ministros rejeitaram a arguição de suspeição do relator, Alexandre de Moraes, e, por maioria, afastaram a preliminar de incompetência do STF para julgar a denúncia — ficando vencido apenas o ministro Luiz Fux. Também por unanimidade, foram rejeitadas as nulidades processuais levantadas pelas defesas, com o entendimento de que não houve prejuízos à legalidade ou ao direito de defesa.
Além disso, o acordo de colaboração premiada firmado entre Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e a Polícia Federal foi validado por unanimidade. A delação de Cid tem sido fundamental nas investigações conduzidas pela PGR e sustentou diversos trechos da denúncia.
Esta é a quarta fase do processo de responsabilização dos envolvidos na tentativa de golpe. O STF já aceitou denúncias contra outros três grupos. Em março e abril, 14 investigados, incluindo Jair Bolsonaro, se tornaram réus, com as ações penais em andamento. Com os sete denunciados agora, o número total de réus na investigação sobe para 21.