O Ministério Público Estadual (MPES) está investigando a legalidade na concessão de incentivos fiscais nos dois primeiros mandatos do governador Paulo Hartung. O caso está sendo examinado pelo procurador-geral de Justiça, Eder Pontes da Silva, que pediu mais informações sobre a ação popular sobre os benefícios ao setor atacadista. Na última sexta-feira (9), o juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual determinou a remessa da cópia integral dos autos do processo ao órgão ministerial.
De acordo com informações do MPES, a denúncia foi encaminhada à instituição em março de 2013. O caso, porém, só passou a ter movimentação no gabinete de Eder em agosto passado. Nos meios jurídicos, a expectativa é de que, a partir das informações contidas na ação judicial – que está em fase de prolação da sentença –, o procurador-geral se manifeste sobre a existência de eventuais atos de improbidade e ilícitos penais. Os benefícios ao setor atacadista são alvo de questionamento também no Supremo Tribunal Federal (STF).
Na ação popular (0004878-43.2013.8.08.0024), o bacharel em Direito, Sérgio Marinho de Medeiros Neto, lista uma série de irregularidades no contrato de competitividade entre o Estado do Espírito Santo e o Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor (Sincades). No processo, ele acusa o governador Paulo Hartung e o então secretário de Fazenda Bruno Negris (que hoje responde interinamente pelo mesmo cargo) de terem concedido o incentivo de forma ilegal e de que a suposta compensação – Fundo Sincades – não seria devidamente explicada pelo governo.
Esse caso ganhou repercussão nacional após o pacote de benefícios concedidos às empresas do setor atacadista ter sido chamado pelo jornalista Elio Gaspari de “mimo sindical”. Gaspari escreveu que a manobra idealizada por Hartung teria conferido, por decreto, um benefício ao setor atacadista que acarretaria em uma renúncia fiscal de R$ 620 milhões por ano. O jornalista também criticou o repasse de verbas para o fundo cultural privado, administrado pela entidade do setor, que distribuía recursos sem qualquer fiscalização do Tribunal de Contas.
Apesar de toda essa repercussão, a Justiça estadual acabou extinguindo o processo sem o exame sequer do mérito dos questionamentos levantados sobre a legalidade dos benefícios. Na decisão, a juíza da 3ª Vara da Fazenda Pública, Telmelita Guimarães Alves, entendeu que este tipo de ação não seria o adequado para contestar o decreto do peemedebista Segundo ela, a declaração da inconstitucionalidade do Decreto nº 2.082-R, assinado em junho de 2008, só poderia ser feita pelo STF, que analisa processo semelhante movido pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB).
Desde o início da tramitação da ação direta de inconstitucionalidade (ADI 4935), o advogado-geral da União, Luiz Inácio Adams, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, se manifestaram pela procedência da queixa. Já o ex-governador Renato Casagrande (PSB) defendeu a manutenção dos incentivos fiscais, postura que adotou nas ações na Justiça estadual. O caso aguarda há mais de três meses por providências do relator, ministro Gilmar Mendes, que decidiu pelo julgamento direto da questão.
Nos dois processos, a tese de acusação é semelhante: os autores das ações sustentam que a Constituição Federal veda a concessão de incentivos fiscais sem a aprovação de lei específica pela Assembleia Legislativa ou prévia autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), o que não ocorreu com o benefício aos atacadistas capixabas. A fórmula do benefício garante a redução na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas operações de 12% para o máximo de 1%, deste total, 10% do valor é revertido ao Instituto Sincades.
Na ação popular, Sérgio Marinho destaca ainda que os municípios capixabas estão sendo lesados pelo setor atacadista, uma vez que o governo teria suprimido tributos que pertenceriam ao caixa dos municípios. A legislação prevê que o bolo do ICMS estadual é dividido entre o Estado (que fica com 75%) e municípios (25%), porém, a lei atribui que cada entre é o titular de sua parte. Por este motivo, o Estado não poderia “transferir o dinheiro do município para particulares”. Ao todo, a renúncia fiscal causada pelo setor superaria a casa de R$ 3 bilhões nos últimos cinco anos.
O bacharel em Direito já interpôs o recurso de apelação contra a decisão de 1º grau. O caso deverá agora ser remetido para uma das câmaras cíveis do Tribunal de Justiça do Estado (TJES). Já as investigações do Ministério Público deverão correr à parte, independente do resultado das ações judiciais.